Diversas empresas têm sido acionadas no Poder Judiciário por ex-empregados que pretendem permanecer no plano de saúde com mesmas condições
As pretensões estão, de forma geral, fundamentadas nos artigos 30 ou 31 da Lei nº 9.656, de 1998, ou nas Resoluções nº 20 e 21 do Conselho de Saúde Suplementar (Consu), conforme o ex-empregado seja aposentado ou não. Via de regra, trazem também pedidos de antecipação de tutela que têm sido acolhido pelos juízes e confirmados pelos tribunais.
Essa matéria tem ocasionado impacto negativo para as empresas/empregadoras, visto que são obrigadas a manter plano de saúde para ex-empregados, invariavelmente afetando a sinistralidade das carteiras, com óbvios reflexos nas negociações futuras com as operadoras dos planos.
Entretanto, existem algumas questões que exigem uma análise detida dos operadores do direito, especialmente em relação à pretensão de manutenção de plano de saúde por ex-funcionários que acionam judicialmente as empresas com a intenção de perpetuar a vinculação ao plano e que tem alcançado rotineira antecipação dos efeitos da tutela nas ações judiciais.
Nos termos da legislação citada, é possível a manutenção de ex-empregados no plano médico, desde que eles cumpram os requisitos previstos nos artigos 30 e 31 da Lei nº 9.656, de 1998. Esse é o mínimo que deve ser oferecido aos ex-empregados, nada impedindo que a empresa eventualmente ofereça condições mais favoráveis. Um desses requisitos refere-se à necessidade de tais ex-empregados, quando ativos, terem contribuído para o plano médico.
Ocorre que a Lei nº 9.656, de 1998 não definiu valor ou tempo mínimo de contribuição. Consequentemente, ex-empregados têm pleiteado o direito a serem mantidos em planos médicos mesmo tendo feito apenas uma contribuição, ainda que de valor insignificante.
Por outro lado, não havendo contribuição por parte do ex-empregado ao plano, é possível defender que ele, ao se desligar da empresa, não tem direito a ser mantido no plano médico. Isso nada obstante a possibilidade de a empresa, por mera liberalidade, permitir a sua permanência, de acordo com regras fixadas.
Dessa forma, aqueles que preencherem as condições legais poderão manter a sua condição de beneficiário - bem como a dos dependentes que já tinham essa condição na vigência do contrato de trabalho -, nas mesmas condições assistenciais que já gozavam, desde que assumam o pagamento de eventual parcela anteriormente de responsabilidade da empresa.
Os prazos para referida manutenção foram previstos no parágrafo 1º dos artigos 30 - não aposentado, 1/3 do tempo de permanência no plano, com mínimo de seis meses e máximo de 24 meses - e 31 (aposentado - se inferior à dez anos de contribuição, calculado à razão de um ano para cada ano de contribuição - se superior à dez anos - vitalício). Referida manutenção é extensiva, obrigatoriamente, a todo o grupo familiar inscrito quando da vigência do contrato de trabalho (Artigo. 30, parágrafo 2º e 3ºe 31, parágrafo 3º da Lei nº 9.656, de 1998).
Os prazos de manutenção também foram tratados pelas Resoluções de números 20 e 21 do Conselho de Saúde Suplementar, as quais prevêem a possibilidade de o empregado/aposentado permanecer no plano por tempo indeterminado, sendo importante destacar que, de acordo com as referidas resoluções, a opção pela manutenção no plano médico deve ser feita dentro de 30 dias após o desligamento, em resposta à comunicação da empresa empregadora, formalizada no ato da rescisão contratual.
Nesse ponto, pode-se dizer que tais disposições das Resoluções 20 e 21 colidem com os preceitos da Lei nº 9.656, pois os prazos de manutenção no plano devem ser aqueles previstos nos artigos 30 e 31 da Lei nº 9.656. Embora a preponderância da lei sobre as resoluções seja evidente e independente do aspecto estritamente temporal, não é demais notar que tais prazos foram inclusive objeto de reedições de medidas provisórias posteriores à data de referidas resoluções.
Vale dizer, o Consu é um órgão colegiado integrante da estrutura regimental do Ministério da Saúde, com competência para gerir o segmento de planos de saúde, cuidar das políticas correspondentes e fiscalizar o setor. O órgão não pode, e nem deve, criar regras que ultrapassem os limites da organização do setor de plano de saúde e alcance os particulares estranhos a tal setor impondo a estes obrigações não previstas em lei.
Nunca é demais lembrar dos direitos fundamentais garantidos pela Constituição dentre os quais há o que assegura que ``ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo, senão em virtude de lei``. A alegada obrigação de manutenção do plano de saúde aos ex-empregados, por prazo indeterminado, deriva da Resolução Consu nº 20, mas referida resolução não é lei para o propósito do inciso II, do artigo 5º da Constituição.
Portanto, a conclusão inevitável é que o Consu extrapolou seu limite de ação, editando norma com conteúdo de lei em sentido formal, razão pela qual entendemos que a Resolução nº 20, no que tange à determinação de manutenção indeterminada do plano de saúde, é ilegal.
Aliás, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que a norma inserta no artigo 30 da Lei nº 9.656 é autoaplicável, sendo que a pretensão de prorrogação compulsória de permanência por tempo superior ao prazo máximo de 24 meses não encontra amparo legal (Resp nº 1.078.991, Rel. Min. Massami Uyeda, j. 02.06.2009).
Em suma, a despeito das Resoluções 20 e 21 e considerando a prevalência dos prazos determinados na Lei nº 9656/98, para o ex-empregado (não aposentado) o prazo de manutenção no plano é de 1/3 do tempo em que permaneceu no plano, obedecidos os prazos mínimos e máximos de seis meses até 24 meses. Já para o aposentado, o prazo é calculado à razão de um ano para cada ano de contribuição - se inferior à dez anos de contribuição ou indeterminado, se superior a dez anos de contribuição.
Fonte: Nilton Marchi - Valor Online
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- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.