*Por Eudes Quintino de Oliveira Júnior
O Conselho Federal de Medicina editou a Resolução nº 2013/2013 (16.4.2013), que adota novas normas técnicas e éticas para serem utilizadas na reprodução assistida. Dentre elas, com evidência, traz a possibilidade da doação compartilhada de óvulos.
Funciona da seguinte forma: a doadora e receptora carregam problemas para alcançar a gravidez. Assim, uma delas doa parte de seus óvulos para a outra que não os produz, em troca do custeio parcial do tratamento, observando a idade de 35 anos como limite da doadora. Na realidade, trata-se de uma doação com contraprestação, porém traz benefícios e vantagens para ambas as partes.
A doação de óvulos é um assunto interessante e que vem ganhando corpo na medida em que a Medicina, pelo seu caráter eminentemente pesquisador, atinge cada vez mais novas técnicas na área da reprodução assistida. Estima-se em 10% a chance de engravidar no caso de doação a paciente acima de 40 anos e se for menor de 35 a chance aumenta para 40%.
A legislação, por sua vez, pela sua própria natureza regulamentar, não acompanha 'pari passu' a evolução e só posteriormente se encarrega de definir as regras permissivas. Daí que, diante da lacuna legislativa, o Conselho Federal de Medicina estabelece as regras necessárias para cada procedimento.
Na prática, muitas mulheres doavam óvulos em troca de tratamento, como 'check-ups' ginecológicos, métodos contraceptivos, exames e até mesmo dinheiro. Tal liberalidade vinha sendo denominada como doação compartilhada em que uma mulher, sem qualquer dificuldade para engravidar, após se submeter a uma série de exames, inclusive com injeções de hormônio para estimular o ovário, doava parte de seus óvulos a outra com dificuldades para alcançar a gravidez.
Pela nossa legislação, o fato não era considerado crime porque não descrito na lei penal, mas não era ético. Agora, com a resolução do CFM a divergência foi aclarada.
A própria solidariedade que une o ser humano recomenda a ovodoação e qualquer pessoa de bom senso não irá recriminar tal conduta. O que causa repúdio do ponto de vista ético e jurídico é justamente o caráter mercantil que pode contaminar a doação. Um filho não pode ser resultado de negociação entre as mulheres que participaram da ovodoação. Agora, pela resolução, uma delas submete-se ao tratamento para engravidar, mas é despojada de recursos financeiros para tanto, porém conta com o financiamento de outra que também ambiciona a maternidade, em troca da doação dos óvulos remanescentes. Já que a gravidez não está sendo atingida pelos meios naturais, devem ser apontadas regras claras para dirimir a questão, conforme intenção do Conselho Federal de Medicina.
Não se pode banalizar a ovodoação. Muitas mulheres se sujeitam a tratamentos infindáveis para conseguir a gravidez e não atingem o resultado desejado. Às vezes até o casamento entra em rota de colisão em razão do problema. Não só os casais desejam a reprodução, mas também mulheres solteiras que buscam a chamada produção independente , sem falar ainda dos casais heterossexuais, que pela nova regulamentação, foram beneficiados pelo uso das técnicas de reprodução humana, desde que respeitado o direito da objeção de consciência do médico.
Assim como o sangue, o leite materno, a doação de óvulos deve ser regida pela espontaneidade e altruísmo, levando-se em consideração a grandeza do ato.
Fonte: Espaço Vital
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- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.