Médicos cearenses receitam hormônios para retardar o envelhecimento; prática é condenada pelo CFM
O Conselho Regional de Medicina do Ceará (Cremec) informou que abrirá sindicância com o objetivo de investigar se houve infração ética por parte dos médicos cearenses Wagner Gonzaga e Ítalo Rachid, denunciados, em reportagem do programa ``Fantástico``, da Rede Globo, por oferecer tratamentos hormonais rejuvenescedores que eles garantem ser revolucionários, mas que, na verdade, são condenados pelo Conselho Federal de Medicina (CFM).
De acordo com o vice-presidente da entidade, Lúcio Flávio Gonzaga Silva, se houver indícios de irregularidades, aí sim, será aberto processo, cabendo, em caso de condenação, punições que vão desde advertência confidencial até a cassação.
``O Cremec acompanha o CFM em seu posicionamento sobre o caso e está preocupada com a população que, muitas vezes, não tem informação sobre o uso inadequado de hormônios``, destaca, explicando que o problema é o desequilíbrio hormonal gerado e suas consequências, que vão de diabetes até câncer.
Silva reafirma que, de acordo com o Parecer do CFM nº 29/12, não se reconhece no Brasil a especialidade médica de antienvelhecimento, bem como não há registros na União Europeia e nos Estados Unidos.
O parece do Conselho, salienta o vice-presidente, conclui que a modulação hormonal bioidêntica ``vem a ser nada mais do que o uso de hormônio fabricado em laboratório, manipulado em farmácia magistral e prescrito com finalidade terapêutica não sustentável cientificamente e, desse modo, não aprovada pelas sociedades medicas acreditadas``. O parecer acrescenta que, no Brasil, pelo menos cinco médicos foram cassados nos últimos quatro anos por usar técnicas sem comprovação científica.
Reportagem
No último domingo (5), o ``Fantástico`` exibiu reportagem que mostrava os ``doutores do antienvelhecimento``, médicos que oferecem tratamentos hormonais que seriam rejuvenescedores.
O programa mostra consulta realizada por um dos médicos em questão. Um paciente de 51 anos e 90 quilos reclama de hipertensão e cansaço crônico. Sem qualquer exame de laboratório, o profissional receita o primeiro hormônio: ``testosterona, que protege o coração dele``.
A seguir, a reportagem destaca uma pesquisa com quase quatro mil homens idosos na Austrália, publicada na semana passada, que concluiu que pacientes com índices elevados de testosterona livre, a responsável pela atuação do hormônio no organismo, têm risco 9% maior de desenvolver câncer de próstata.
Também estão entre as substâncias indicadas pelos médicos a melatonina, o cortisol, o hormônio do crescimento, progesterona e testosterona.
Representantes da Sociedade Brasileira de Geriatria analisaram a conduta dos doutores antienvelhecimento. ``Não se pode prescrever nenhum hormônio sem ter o teste de dosagem deste``, explica a entidade. A Sociedade Brasileira de Endocrinologia no Ceará aguarda posicionamento da entidade nacional para se pronunciar.
Na segunda-feira (6), o CFM divulgou parecer condenado a prática. O Conselho concluiu que a falta de evidências científicas e os riscos e malefícios que trazem à saúde não permitem o uso de terapias hormonais contra o envelhecimento.
``Os trabalhos reunidos até o momento mostram que, em pessoas saudáveis, o uso dos hormônios aumenta o risco de uma série de doenças``, afirmou a geriatra Maria do Carmo Lencastro, integrante da Câmara Técnica do CFM.
Perigos
No caso do hormônio da tireoide, por exemplo, o uso em pessoas saudáveis pode levar ao hipertireoidismo. Já o hormônio de crescimento, quando em grandes quantidades no organismo, pode levar a problemas cardiovasculares. ``O uso desses hormônios provoca uma sobrecarga no organismo, e, em consequência, um desajuste hormonal``, ressaltou a geriatra.
Esta é a segunda recomendação feita pelo CFM relacionada a terapias que prometem retardar o envelhecimento. Em 2010, resolução do colegiado proibiu a indicação de terapia ortomolecular por não haver eficácia comprovada.
A equipe de reportagem tentou contatar os médicos Wagner Gonzaga e Ítalo Rachid, mas não foi atendida.
Fonte: Diário do Nordeste
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- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.