Médico revela que Dagoberto Filho, 68 anos, tinha transtorno bipolar.
Ele recebeu alta de clínica psiquiátrica, mas precisava de acompanhamento.
A filha do carpinteiro Dagoberto Rodrigues Filho, de 68 anos, que foi encontrado morto dentro de um poste em Goiânia, disse que não conseguiu tratamento para o idoso, que tinha transtorno bipolar. A auxiliar de contabilidade Adriane Rodrigues, de 36 anos, afirmou ao G1 que o pai foi internado duas vezes, mas depois de receber a última alta, em agosto deste ano, não recebeu o acompanhamento médico adequado.
Adriane acredita que o pai deveria ter ficado mais tempo internado. O diretor da Pax Clínica Psiquiátrica, local onde o idoso fez o tratamento, contou que o paciente apresentava um bom quadro clínico quando teve alta. O médico psiquiatra Salomão Rodrigues Filho disse ao G1 que o carpinteiro recebeu o atendimento necessário, saiu medicado, mas que precisava de um acompanhamento ambulatorial constante.
A primeira internação dele na clínica ocorreu de março a abril de 2012. Este ano, ele voltou a ser internado, no dia 27 de julho, e teve alta no dia 19 de agosto.
A filha lembra que, depois da alta, procurou atendimento para o pai na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Brasicon, em Aparecida de Goiânia, tentando continuar o acompanhamento, mas não conseguiu.
“Ele não estava estabilizado para receber alta. Quando ele fazia o tratamento adequado, ele ficava mais calmo. Desta vez, ele estava super agitado, não conseguia ficar quieto. Eu fui ao médico, tentei uma guia para internação, mas negaram dizendo que ele estava bem. Disseram que se passassem remédio injetável ele ia ficar prostrado. Eu preferia ele prostrado em casa do que morrer assim na rua”, desabafou a filha.
O carpinteiro foi achado morto no último domingo (20), no canteiro central da Avenida Viena, no Jardim Europa, região sudoeste de Goiânia. O poste seria usado na expansão da rede de alta tensão, e estava deitado no canteiro central da via com uma abertura na parte de baixo. Como estava em avançado estado de decomposição, o corpo foi identificado por meio de análise de digital. O enterro aconteceu nesta manhã no Cemitério Vale da Paz, em Goiânia.
Em nota enviada ao G1 , a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Aparecida de Goiânia informou que "a Política Nacional de Saúde Mental, preconizada pelo Ministério da Saúde, e realizada pela Rede de Saúde Mental de Aparecida, não trabalha com internação compulsória, nem com internação por períodos prolongados. Os Centros de Atenção Psicossocial [CAPs] de Aparecida realizam acompanhamento regular de pacientes fazendo um trabalho social com a família, mas sempre respeitando a vontade de cada paciente".
Ainda segundo a nota, "os prontuários de Dagoberto Rodrigues, arquivados pela Coordenação de Saúde Mental de Aparecida de Goiânia, dizem o paciente fazia acompanhamento psiquiátrico e terapêutico desde 31/10/2015 no CAPs Bem Me Quer, que fica na região Central do município. Ele também fazia acompanhamento psiquiátrico ambulatorial [consultas] às segundas-feiras na mesma unidade e tinha acesso à medicação necessária. Entretanto, sempre chegava na unidade com higiene pessoal comprometida e indícios de não acompanhamento da medicação".
A SMS dissem ainda, que "dia 17/10/2016 o paciente foi colocado no acolhimento noturno porque chegou na unidade desorientado, sem saber onde estava e também com a higiene pessoal prejudicada. Ele dormiu na unidade por cinco dias. Durante esse período, a equipe do CAPS tentou, sem sucesso, vários contatos por telefone com a família, que só foi ver o paciente no 3° dia".
A secretaria esclareceu que, no "dia 21/10/2016 foi a última avaliação do paciente na unidade. Após esse dia, a equipe do Caps entrou em contato com a família para saber do paciente e informou que qualquer ocorrência poderiam levá-lo no CAPS, que é 24 horas. Contudo, o paciente não retornou mais à unidade. A família não comunicou o desaparecimento do paciente à equipe do CAPs, nem ligou na unidade para saber se, por ventura, o paciente pudesse ter comparecido lá durante o período em que ficou sumido".
Por fim, a SMS destacou que a "família e o paciente receberam todo suporte da Rede de Saúde Mental do município, que além dos CAPs, tem também à disposição o Pronto Socorro Psiquiátrico da Unidade de Pronto Atendimento [UPA 24 horas] do Setor Brasicon, na região Central".
Transtornos
Segundo o médico psiquiatra, Dagoberto sofria de uma doença denominada Transtorno Bipolar de Humor e tinha um quadro de demência começando a se desenvolver quando foi atendido pela última vez na clínica. Salomão afirma que após receber alta, o paciente recebeu encaminhamento para um neurologista e estava com prescrição médica adequada.
“Ele chegou grave pra gente aqui na clínica. Estava agitado, falando muito, com estado típico de euforia. Mas foi medicado, fez o tratamento, em 2012, por mais de um mês e, pela última vez, este ano, por 22 dias. Ele saiu muito bem da clínica, inclusive segundo consta no relato ele disse ‘Este remédio foi muito bom pra mim’. No entanto, segundo um próprio acompanhante dele disse quando ele foi internado, o paciente fazia o uso irregular do remédio, o que agravava estas crises dele”, afirmou o médico ao G1.
Durante o enterro, a filha disse que há 17 anos Dagoberto começou a apresentar problemas mentais. Ela afirma que mesmo assim o idoso tinha o hábito de sair de casa, mas que sempre voltava, pois andava sempre com o número do telefone da família anotado e pedia para alguém ligar para buscá-lo.
“Ele começou a desestabilizar mentalmente com uma depressão, logo depois já passou para uma demência, um transtorno psicológico. Ele fazia acompanhamento, participava de um projeto social em que ele tocava gaita, instrumentos musicais, ele era muito feliz até este projeto encerrar por falta de recursos”, disse.
Desaparecimento
A auxiliar de contabilidade conta que o pai morava com ela, a mulher e o neto no Setor Aeroporto Sul, em Aparecida de Goiânia, na Região Metropolitana da capital. Segundo ela, Dagoberto costumava passar vários dias fora de casa. “Às vezes, ele saía e ficava até cinco dias sumido, mas sempre voltava ou dava um jeito de ligar para a gente buscar", disse ao G1.
No último dia 7 de novembro, Dagoberto voltou a sumir, mas, diferente das outras vezes, não entrou em contato. A família começou a procurar e ir a clínicas e hospitais, mas não conseguiu nenhuma informação sobre ele.
Adriane resolveu pedir ajuda nas redes sociais. A família havia morado por 26 anos no Jardim Europa, bairro onde o corpo foi encontrado. Uma antiga vizinha viu as fotos na web e ligou para auxiliá-la informando do corpo achado dentro do poste.
Naquele momento, a filha se lembrou de algo que o pai uma vez lhe disse. "Das vezes em que ele saía, eu perguntava onde ele dormia, que não precisava daquilo. E uma vez ele confessou que já tinha dormindo dentro daquele mesmo poste. Na hora, me deu aquele estalo", revela.
Adriane então esteve no local e acompanhou parte do trabalho feito pelos bombeiros, que tiveram de serrar o poste. Na segunda-feira de manhã, ela esteve no IML com toda documentação do pai, mas, ainda assim, não foi possível a identificação. A Polícia Civil só confirmou a identidade durante a tarde, após análise de digitais.
Investigação
A família do carpinteiro acredita que Dagoberto possa ter morrido de causas naturais, mas não descarta a hipótese de ele ter sido vítima de um homicídio. Por isso, pede a investigação do caso.
“A polícia tem de averiguar para sabermos o que realmente aconteceu. O que me deixou em alerta foi um sinal de queimado no começo do poste. Pode ter sido que alguém colocou fogo e, apurado, meu pai correu para a parte mais fina e ficou engastalhado. Mas também ele pode ter passado mal lá dentro porque é muito abafado”, disse Adriane Rodrigues.
De acordo com a Polícia Civil, o delegado que foi ao local onde Dagoberto foi encontrado, Francisco Costa Júnior, já tomou as providências iniciais. A partir desta terça-feira, a Delegacia Estadual de Investigações de Homicídios deve dar continuidade na apuração do caso com o delegado Dannilo Proto. A corporação ainda não sabe dizer como o idoso entrou no poste.
Em relação ao exame de necropsia, ele foi concluído pelo Insituto Médico Legal (IML). No entanto, segundo o órgão, o laudo não aponta a causa da morte de Dagoberto. O supervisor administrativo do órgão, Daniel de Carvalho, disse ao G1 que o fato do corpo ter ficado dentro de uma estrutura metálica pode ter avançado o estado de decomposição, impossibilitando constatar, por exemplo, se foi perfurado.
Dias antes do corpo ser encontrado, moradores da região já tinham acionado os bombeiros diante do cheiro forte nas imediações onde a estrutura estava. Geralda Aparecida da Silva, dona de uma pamonharia que fica em frente ao local, conta que os fregueses do restaurante já estavam reclamando do odor. "Muito ruim. Um cheiro muito forte que incomodava bastante", disse.
Rede de alta tensão
O poste onde o corpo foi encontrado é um dos que estão deitados nos canteiros centrais de várias vias da região sudoeste de Goiânia. Eles foram deixados no local há quase 3 anos para serem instalados nas obras de expansão de uma rede elétrica de alta tensão, pela Companhia Energética de Goiás (Celg).
A estatal federal Eletrobras suspendeu a obra há 2 anos, depois que um relatório do Banco Internacional de Desenvolvimento (BID) apontou várias falhas no projeto de implantação da rede. Agora, os moradores do bairro lutam para que as estruturas sejam retiradas.
A Celg informou que ainda não tirou os postes do local porque espera a obtenção do alvará de construção e renovação da licença ambiental da Prefeitura de Goiânia para, então, continuar as obras de implantação da linha de alta tensão. De acordo com a companhia, o sistema é “imprescindível” para a melhoria do sistema e atendimento aos próprios moradores.
Fonte: Globo.com
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- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.