Minha foto
Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

Portugal: Menores vão poder realizar testes de VIH sem consentimento dos pais

Autoridades de saúde querem mudar legislação actual que criminaliza médicos que façam testes de VIH a menores de 16 anos sem autorização expressa dos pais.

Actualmente, um profissional de saúde que realize testes de VIH a menores de 16 anos sem autorização expressa dos pais corre o risco de ser alvo de uma queixa e responder pela prática de um crime. Porém, segundo confirmou ao PÚBLICO o director-geral da Saúde, Francisco George, serão em breve definidas novas normas para o consentimento informado que “salvaguardam a possibilidade dos testes de VIH a menores”. O coordenador do Programa Nacional para a Infecção VIH/sida também quer “uma solução de bom senso” para responder a estes casos.

Francisco George não adianta pormenores sobre os contornos das novas normas para o consentimento informado que estão ainda a ser discutidas e que, entre muitas outras situações, vão abordar a questão dos testes de VIH a menores. O director-geral confirma que o grupo de trabalho para este matéria já entregou a sua proposta e que esta “salvaguarda” estes casos. Também o coordenador do programa nacional confirma que a questão está a ser discutida e que o objectivo é “encontrar uma solução de bom senso até ao final deste ano”.

“Não é uma situação fácil de resolver linearmente. Queremos encontrar uma orientação que nos diga como proceder nestas situações, que podem ser muito díspares, e procurar o bom senso na abordagem de cada caso”, adianta António Diniz. “Para já, a nossa prioridade é avançar este semestre com a disponibilização de testes rápidos nos cuidados de saúde primários. E esta questão dos adolescentes e menores será devidamente enquadrada nesse contexto”, acrescenta.

Actualmente, não existe qualquer orientação legal ou normativa que trate especificamente destes casos. A lei diz que um menor de 16 anos é considerado incapaz e, por isso, exige-se um consentimento dos seus representantes legais para a realização de testes ou exames médicos. Porém, na prática e no caso específico dos testes de VIH, esta exigência legal nem sempre é cumprida. Até porque, muitas vezes, os menores não querem dizer aos pais que iniciaram a sua vida sexual e/ou que tiveram algum comportamento de risco.

Assim, a decisão de fazer ou não um teste de VIH a alguém com menos de 16 anos sem conhecimento dos pais é tomada pelo profissional de saúde, que avalia o caso e o grau de maturidade do jovem optando pelo que melhor serve os seus interesses. Nos centros de aconselhamento e detecção (CAD) precoce do VIH, por exemplo, é possível fazer um teste anónimo. Estes centros não têm autorização para pedir identificação e se, durante o aconselhamento, se verificar que o teste é pertinente, muito provavelmente não se recusarão a fazê-lo, mesmo que suspeitem ou que seja evidente que estão perante um menor. Fora do anonimato, as decisões vão no mesmo sentido.

“Faço consulta de adolescentes há mais de 20 anos. Nem me passa pela cabeça pedir autorização para pedir este teste se tiver alguém à minha frente que me está a pedir isso e que não queira dizer aos pais”, reage o médico Miguel Oliveira e Silva.

O obstetra e ginecologista do Hospital de Santa Maria, em Lisboa — que preside também ao Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida —, argumenta que se sente “obrigado como profissional a prestar os melhores cuidados” aos seus doentes. Da mesma forma que não pede autorização para receitar a pílula ou outro método contraceptivo solicitado por uma adolescente com 14 ou 15 anos, o médico refere que o pedido de um teste de VIH para um menor sem que os pais tenham conhecimento pode ser justificado do “ponto de vista científico e ético”.

Crime punível com prisão
Paulo Sancho, consultor jurídico da Ordem dos Médicos, também defende que “para determinado tipo de actos médicos como este — em que não estamos a falar de uma intervenção cirúrgica ou algo que o coloque em perigo —, se o médico tiver em conta a vontade do menor e o seu grau de maturidade, a autorização desse menor será o bastante para que não esteja a cometer um crime”. O jurista nota ainda que não conhece nenhum caso de uma queixa relacionada com esta matéria específica.

“No caso dos menores com idade inferior a 16 anos, os médicos que realizem os testes sem o consentimento dos representantes legais incorrem na prática do tipo legal de crime de ‘intervenções e tratamentos médico-cirúrgicos arbitrários’, previsto e punível pelo artigo 156.º do Código Penal (punido com pena de prisão até três anos ou pena de multa), uma vez que o consentimento do menor não é eficaz”, esclarece Neuza Freire Lopes, advogada da José Pedro Aguiar-Branco & Associados, salientado que “este tipo de crime depende sempre da apresentação de queixa”.

Em respostas por e-mail ao PÚBLICO, a advogada diz que em Portugal “já existem guidelines dirigidas aos profissionais de saúde sobre a prestação do consentimento informado dos menores”, mas conclui que seria desejável que fosse feita “uma ressalva específica quanto à realização dos testes de VIH” nestas idades. Em 2009, quando o Instituto Português da Juventude e o Alto Comissariado para a Saúde apresentaram o projecto Cuida-te — que consistia em colocar cinco carrinhas preparadas para realizar testes de sida aos jovens nas escolas, discotecas e festivais —, o assunto foi muito debatido e vários especialistas e juristas mostraram as suas divergências. No entanto, nessa altura, nada ficou decidido.

Fonte: www.publico.pt