Não há bis in idem quando a caracterização da culpa está lastreada na negligência, e a aplicação da causa de aumento da pena por inobservância de regra técnica toma como base outros fatos. Assim entendeu a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao manter a condenação de um médico por erro que resultou na morte de uma criança de três anos.
O caso aconteceu em 1999, em um hospital do interior de Minas Gerais. Horas depois de passar por uma cirurgia de adenoide, a criança morreu com sangramento intenso na garganta. A família acusou o médico de não ter prestado assistência adequada. O Ministério Público de MG denunciou o médico por homicídio culposo.
Em primeira instância, o médico foi condenado a 1 ano e 4 meses de prisão, mas a pena foi substituída pelo pagamento de 50 salários mínimos à família da criança. O MP recorreu, e o TJ-MG aumentou a condenação para 2 anos e 2 meses de detenção, mantendo o regime aberto e a substituição da pena por medidas restritivas de diretos.
O médico então recorreu ao STJ alegando que houve bis in idem na incidência da causa de aumento do artigo 121, parágrafo 4º, do Código Penal. Segundo ele, a inobservância de regra técnica teria sido usada para caracterizar a conduta culposa. Também questionou o cálculo da pena-base, pois ela teria sido fixada acima do mínimo legal sem fundamentação concreta.
Os argumentos não foram aceitos pela turma. Para o relator do caso, ministro Sebastião Reis Júnior, a pena foi aumentada pelo TJ-MG por causa do intenso sofrimento da vítima. “Cuida-se de elemento concreto não inerente ao tipo penal de homicídio culposo, mostrando-se idôneo o fundamento para justificar a majoração da pena-base”, disse.
O relator afastou, ainda, a alegação de bis in idem, afirmando em seu voto que “a caracterização da culpa está lastreada na negligência (omissão no dever de cuidado) e a aplicação da causa de aumento da inobservância de regra técnica assenta-se em outros fatos (prescrição de medicamento inadequado)”.
Apesar de Sebastião Reis Júnior destacar que o caso julgado não deve ser enquadrado no novo entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre a prisão antes do trânsito em julgado, a turma entendeu que a possibilidade deve ser aplicada. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
REsp 1.385.814
Fonte: Revista Consultor Jurídico
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- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.