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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

terça-feira, 26 de abril de 2016

Laboratório: inexistência de má prestação do serviço (improcedência da ação)

Apelação Cível n. 2013.080688-0, de Lages
Relator: Des. Stanley Braga

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DIREITO DO CONSUMIDOR. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. ERRO DE EXAME DE PLAQUETAS QUE ACARRETOU DIAGNÓSTICO MÉDICO DE POSSÍVEL LEUCEMIA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA. AUSÊNCIA DE PROVA DO ERRO LABORATORIAL. DIAGNÓSTICO DA DOENÇA NÃO CONCLUSIVO. DISSABOR, NÃO INDENIZÁVEL NO CASO CONCRETO. DECISÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2013.080688-0, da comarca de Lages (4ª Vara Cível), em que é apelante Maiara Lemos Xavier, e apelado Laboratório Saldanha Ltda.:
A Quarta Câmara de Direito Civil decidiu, por votação unânime conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.
O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Eládio Torret Rocha, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Júlio César M. Ferreira de Melo.
Florianópolis, 14 de abril de 2016.
Stanley Braga
Relator

RELATÓRIO
Nos termos da decisão de Primeiro Grau (fls. 78-82):
"MAIARA LEMOS XAVIER, por intermédio de sua representante legal, propôs ação condenatória, pelo procedimento comum ordinário, em face de LABORATÓRIO SALDANHA LTDA. alegando, em suma, que no mês de julho de 2012, realizou exames médicos no laboratório, com resultado normal em relação ao número de plaquetas no sangue coletado. Disse que, em seguida, passou a perder cabelo em excesso, de modo que realizou novo exame, no mês de julho de mesmo ano, no qual foi constatado a existência de 22.600/ul plaquetas, sendo comunicada pelo seu médico sobre a possibilidade de estar acometida por leucemia, circunstância que implicou novo exame, que constatou número normal de plaquetas. Sustentou que em face da possibilidade ventilada pelo médico de uma grave doença, teve quadro depressivo com tendência suicida, sofrendo abalo moral. Em razão do mal serviço prestado pelo laboratório, com erro grave de diagnóstico, requereu a sua condenação ao ressarcimento dos danos morais
Citado, o réu ofereceu contestação aduzindo, preliminarmente, ilegitimidade passiva, na medida em que o diagnóstico compete ao médico e não ao laboratório. No mérito, disse que o exame foi realizado de forma correta, com o emprego de técnica e equipamentos regulares, não havendo falha na prestação dos serviços. Disse que vários fatores externos e internos podem influências no exame de plaquetas, cabendo ao médico a interpretação dos exames. Sustentou que as plaquetas são componentes do sangue e não marcador de câncer, de modo que sua diminuição não corresponde necessariamente à existência de doença, mormente porque os demais componentes do sangue encontram-se normais. Disse que se houve diagnóstico errado essa conduta somente pode ser imputada ao médico. Pugnou a improcedência e a condenação da autora por litigância de má-fé.
Houve réplica.
O Ministério Público manifestou-se pela designação de audiência preliminar".

Restando o litígio assim decidido na instância a quo:
"Pelo exposto, julgo improcedente o pedido, condenando a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, arbitrados em R$ 800,00, nos termos do art. 20, § 4°, do CPC, cuja exigibilidade fica suspensa [art. 12 da Lei 1.060/50]".
Foi interposto Recuso de Apelação Cível (fls. 86-90) por que teceu argumentação e concluiu requerendo que seja reconhecido o direito à indenização por dano moral em razão do erro no exame de laboratório.
As contrarrazões foram oferecidas às fls. 94-97.
Regularmente preparado, a tempo e modo, ascenderam os autos a esta Instância.
Lavrou parecer pela douta Procuradoria-Geral de Justiça o Exmo. Sr. Dr. Alexandre Herculano Abreu, que opinou no sentido de conhecer do recurso e negar-lhe provimento, mantendo hígida a sentença objurgada (fls.103-108).
À fl. 110, o procurador subscritor do recurso, foi intimado para apresentar procuração outorgando poderes para a autora que alcançou a maioridade, juntando o documento, conforme fl. 115.
Este é o relatório.

VOTO
Da admissibilidade: Presentes os pressupostos legais o recurso é conhecido.
Do julgamento:
Preliminares: Não foram suscitadas preliminares.

Mérito:
Trata-se de recurso de apelação cível interposto por Maiara Lemos Xavier, nos autos da ação de indenização por danos morais que move em desfavor do Laboratório Saldanha Ltda., que julgou improcedente o pleito exordial de indenização por danos morais.

A demanda discute a responsabilidade do laboratório em razão da alegação de erro no diagnóstico, o qual teria apontado que a recorrente se encontrava com número de plaquetas alterado, motivo pela qual seu médico teria anunciado a possibilidade de estar acometida por leucemia, resultando em quadro depressivo com tendência suicida por parte da apelante.

Entretanto, adianta-se, a sentença de improcedência, não merece reparos.

Conforme os documentos colacionados nos autos, verifica-se a inexistência de má prestação do serviço na realização do exame de sangue, não cabendo a responsabilização civil do laboratório.

Observa-se que o resultado do exame não afirma a existência de leucemia, mas tão somente constata alterações na quantidade de leucócitos presentes no plasma da demandante. Contudo, para a conclusão de que, de fato, a autora era portadora de moléstia grave, necessária maior investigação acerca do diagnóstico.

Desse modo, os fatos demonstrados nos autos, ainda que possam ter gerado dissabor e clara dose de incômodo, disso não ultrapassam. São acontecimentos que, embora acarretem verdadeiros aborrecimentos, não são suficientemente gravosos a ponto de poderem ser alçados à categoria de dano moral, o que ensejaria o dever do réu de indenizá-la.

Ademais, o desgosto experimentado pela autora não é suficientemente oneroso para que seja considerado dano moral, tendo em vista que esta espécie de prejuízo somente se configura em circunstâncias efetivamente danosas, o que não é o caso dos autos.

Logo, conclui-se que o pedido formulado na presente ação encontra-se fundado em mera insatisfação pessoal, incapaz de gerar condenação por abalo moral.

De acordo com Maria Helena Diniz:
O ato ilícito (CC, arts. 186 e 187) é o praticado em desacordo com a ordem jurídica, violando direito subjetivo individual. Causa dano a outrem, criando o dever de reparar tal prejuízo (CC, art. 927). Deveras, dispõe o Código Civil, no art. 927, que "Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo". Os bens do responsável pela ofensa do direito de outrem sujeitar-se-ão à reparação do prejuízo causado, e se aquela violação tiver mais de um autor, todos terão responsabilidade solidária pela reparação; logo, o lesado poderá exigir de qualquer dos coautores a indenização a que faz jus (CC, art. 942). E, além disso, o direito de o lesado exigir a reparação, bem como o dever de prestá-la são transmissíveis aos seus herdeiros , que por eles responderão até os limites das forças da herança (CC, art. 943 c/c art. 1.792).

São elementos indispensáveis à configuração do ato ilícito:
1°) fato lesivo voluntário, ou imputável, causado pelo agente por ação ou omissão voluntária (dolo), negligência, imprudência ou imperícia (culpa), que viole um direito subjetivo individual. É necessário, portanto, que o infrator tenha conhecimento da ilicitude de seu ato, agindo com dolo, se intencionalmente procura prejudicar outrem, ou culpa, se consciente dos prejuízos que advêm de seu ato, assume o risco de provocar o dano, sem qualquer deliberação de violar um dever;
2°) ocorrência de um dano, pois, para que haja pagamento da indenização pleiteada, além da prova ou do dolo do agente, é necessário comprovar a ocorrência de um dano patrimonial ou moral.
[...].
(DINIZ, Maria Helena. Cuso de Direito Civil Brasileiro: 3. Teoria das Obrigações Contratuais e Extracontratuais. 26. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 844-845).

Assim, não se verifica, no caso concreto, a prática de ato ilícito pelo demandado, o que impossibilita sua responsabilização civil.
Ainda que fosse aplicável ao caso a responsabilidade objetiva prevista no art. 14, do Código de Defesa do Consumidor, melhor sorte não assistiria à demandante.

Dispõe o parágrafo terceiro do mencionado artigo que "o fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que tendo prestado o serviço, o defeito inexiste".

No caso em comento, há comprovação nos autos de que o aparelho utilizado para realizar as medições apresentadas no laudo laboratorial encontrava-se em perfeitas condições de funcionamento.

Certo é que os exames laboratoriais apenas servem de indicativo para que o médico chegue à conclusão acerca do diagnóstico, cabendo somente a este analisar as informações contidas no laudo emitido e presentes nas demais evidências.

Sobre a matéria, extrai-se da jurisprudência deste Sodalício:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. EXAME SOROLÓGICO PARA DETECÇÃO DE AGENTES PATOLÓGICOS TRANSMISSÍVEIS POR TRANSFUSÃO. DOADOR DE SANGUE. REAGENTE PARA HIV. FALSO-POSITIVO. LESÃO A DIREITOS DA PERSONALIDADE POR FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. NÃO OCORRÊNCIA. EXCLUSÃO POR EXAMES CONFIRMATÓRIOS. TESTE DE ALTA SENSIBILIDADE E NÃO DE ALTA ESPECIFICIDADE. MECANISMO DE SEGURANÇA TRANSFUSIONAL. DEVER DE INFORMAÇÃO E ORIENTAÇÃO OBSERVADOS PELO LABORATÓRIO. ATUAÇÃO DENTRO DOS LIMITES TÉCNICOS DE ANÁLISES CLÍNICAS. SUBMISSÃO ÀS PORTARIAS NS. 488/98 E 59/2003 DO MINISTÉRIO DA SAÚDE. ATO ILÍCITO NÃO VERIFICADO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO NÃO PROVIDO. (Apelação Cível n. 2013.049873-1, de Brusque, rel. Des. Alexandre d'Ivanenko, j. 25-8-2015).

E:
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. EXAME DE URINA INDICANDO ALTERAÇÃO NO ORGANISMO DO AUTOR. DEMANDANTE QUE NÃO COLETOU URINA, MAS APENAS SANGUE. IMPOSSIBILIDADE, PORTANTO, DO DIAGNÓSTICO REFERIR-SE A ELE. CONTRAPROVA, ADEMAIS, POSSIBILITADA PELO LABORATÓRIO TÃO LOGO DIVULGADO O RESULTADO. ABALO ANÍMICO ARREDADO. VIVÊNCIA DE EXCEPCIONAL SITUAÇÃO ENSEJADORA DE REPARAÇÃO EXTRAPATRIMONIAL INEXISTENTE. DECISÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (Apelação Cível n. 2012.029517-0, de Lauro Müller, rel. Des. Ronei Danielli, j. 17-10-2013).

Colhe-se precedente desta Câmara:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. RESULTADO DE EXAME LABORATORIAL BETA H-CG. DOSAGEM DE HORMÔNIO GONADOTROFINA CORIÔNICA. EXAME COM RESULTADO INTERPRETATIVO E NÃO CONCLUSIVO SOBRE A POSSIBILIDADE DE GRAVIDEZ. POSTERIOR ULTRASSONOGRAFIA PÉLVICA CONSTATANDO "ÚTERO COM CONTORNOS LISOS E REGULARES". ERRO NO EXAME DE SANGUE NÃO COMPROVADO. CULPA E NEXO DE CAUSALIDADE NÃO DEMONSTRADOS. ÔNUS DA AUTORA. OBRIGAÇÃO DE MEIO. DANO MORAL NÃO CARACTERIZADO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Apelação Cível n. 2014.035365-0, de Lages, rel. Des. Joel Figueira Júnior, j. 17-7-2014).

Ante o exposto, diante da falta dos elementos hábeis a caracterizar a responsabilidade civil do demandado, a improcedência dos pedidos é medida que se impõe.

Ante o exposto, conhece-se do recurso e nega-se-lhe provimento.

Este é o voto.

Gabinete Des. Stanley Braga

Fonte: TJSC