Paciente procurou hospital alegando que estava em trabalho de parto.
Polícia Civil e CRM investigam o caso ocorrido em Monte Carmelo.
A Polícia Civil e o Conselho Regional de Medicina (CRM) de Minas Gerais apuram o caso de uma mulher de 30 anos que passou por cesariana e após cirurgia foi informada que a gravidez dela era psicológica e que não havia nenhum bebê. Ela deu entrada no Hospital Santa Terezinha, em Monte Carmelo, no Alto Paranaíba, onde fez o procedimento e permanece internada. Este seria o terceiro filho da mulher.
A família de Cláudia Aparecida Lopes afirmou que ela passou pelo pré-natal e fez todos os exames solicitados. O G1 entrou em contato com o hospital e o médico que realizou a cirurgia, José Tomaz de Oliveira, se pronunciou através de um e-mail, dizendo que a paciente esteve no consultório dele duas vezes e que não tinha aparelho de ultrassonografia. Já a respeito da cesariana e dos possíveis exames realizados pela paciente, nenhum dado foi repassado pelo médico.
O G1 conversou com o marido da mulher, Alexandro Donizete Oliveira Alves, de 23 anos, que informou não estar entendendo o que está ocorrendo e que procura por respostas. “Há nove meses minha mulher suspeitou que estivesse grávida, fez um exame de farmácia e deu positivo. Marcamos uma consulta e o médico confirmou a gravidez, dizendo até que era um menino. Pagamos pelo pré-natal e ela chegou a fazer a ultrassonografia. Em um dos exames o médico disse que ela não poderia ter parto normal, pois a criança estava sentada e teria que optar pela cesariana”, relembrou.
Alexandro Donizete disse que o parto foi marcado para segunda-feira (6) e que a mãe dele iria acompanhar a cirurgia. “Minha mãe ficou do lado de fora aguardando ser chamada quando veio a notícia que se tratava de uma gravidez psicológica. Minha mulher estava com um corte enorme na barriga e disseram para nós que simplesmente não tinha bebê. Foi aí que chamei a polícia e registrei um Boletim de Ocorrência (BO)”, ressaltou.
O homem contou ainda à reportagem que a última consulta da mulher ocorreu no fim de dezembro e que antes da cirurgia o médico receitou para ela algumas vitaminas usadas por gestantes. “Eu não quero e nem posso acusar ninguém, mas eu preciso saber se existiu mesmo um filho. Eu era o pai e tenho esse direito. Cesariana é coisa séria e não se pode abrir uma pessoa sem saber o que acontece”, desabafou.
Outro lado
No e-mail enviado ao G1, o médico disse que há 45 anos atua na área e que ao longo da carreira realizou inúmeros procedimentos, dentre eles em torno de nove mil partos e cesarianas. Ele informou que não conta com aparelho de ultrassonografia e quando há a necessidade na realização desse exame ele encaminha as pacientes para os serviços existentes na cidade. Disse também que a investigação está a cargo da polícia e que os órgãos pode contar com a colaboração dele, pois quer transparência na apuração dos fatos.
O médico salientou que Cláudia Aparecida Lopes esteve apenas duas vezes no consultório dele. Sobre a operação, ele foi informado por funcionários do hospital que o prontuário e demais documentos já estão com a polícia e que o médico não se pronunciaria sobre o fato e nem entraria em detalhes para não comprometer as averiguações.
Investigações
A delegada de Polícia Civil Cláudia Coelho Franchi é quem investiga o caso. Segundo ela, foi instaurado um inquérito e foi solicitado exames para identificar se havia ou não um feto no útero da mulher. O inquérito deve ser finalizado em 30 dias. “Vamos ouvir testemunhas e avaliar os documentos apresentados. O inquérito será finalizado em até 30 dias, mas ainda é cedo para afirmar algo”, relatou.
Cláudia Coelho disse que também está sendo apurada uma possível falsificação da caderneta de acompanhamento pré-natal e ressaltou que o médico se dispôs a prestar todos os esclarecimentos possíveis.
O corregedor do CRM-MG, Alexandre de Menezes Rodrigues, também falou com o G1 e disse que foi instaurada uma sindicância interna para saber onde ocorreu o erro. “Não sei até que ponto quem falsificou o que. Não sabemos ainda o que motivou a realização da cesárea e tudo tem que ser investigado”, afirmou.
Alexandre de Menezes contou que o Conselho tem até 90 dias para apurar o caso. “Nós podemos estar tratando com uma paciente com distúrbio psiquiátrico. A investigação é justamente para apurar onde e em que momento o erro ocorreu. Vamos avaliar as duas ultrassonografias apresentadas pela paciente e saber se o médico fez o procedimento da cesariana apenas com a apresentação do exame. Nós temos os relatos de duas partes e eles serão apurados", garantiu.
O corregedor ainda confrontou uma informação dada pela família da mulher dizendo que não houve agendamento da cesárea e que ela pode ter chegado ao hospital dizendo que estava passando mal. “Ninguém em sã consciência deixa um médico cortar sua barriga sabendo que não existe nada lá dentro”, argumentou.
Gravidez Psicológica
A reportagem procurou a psicóloga Kátia Regina Beal Rodrigues para falar sobre a questão da gravidez psicológica, que pode ter afetado a paciente Cláudia Aparecida Lopes. Para a profissional, a gravidez psicológica (pseudociese) é um transtorno que pode se desenvolver em mulheres que desejam muito ser mães e não conseguem, ou então, por aquelas que não querem de forma alguma ficar grávidas ou que têm medo de engravidar. “Na gravidez psicológica, a mulher acredita de fato estar grávida e toda e qualquer comprovação por meio de exames não são válidos para ela. Ela não consegue ver a gravidez como uma fantasia e o corpo vai se desenvolvendo, havendo até o crescimento da barriga”, explicou.
Segundo Kátia Beal, o abdômen da paciente aumenta até mesmo por aquela fantasia de que se tem de alimentar por dois. “Algumas mulheres chegam até a produzir leite. O emocional comanda tanto o nosso corpo, que a mulher pode até sentir todos os sintomas de uma gravidez real como enjoos, dor de cabeça, sonolência e ausência da menstruação”, afirmou.
A gravidez psicológica pode ter possíveis causas desde baixa autoestima, dificuldade no relacionamento, medo de perder o companheiro, entre outras. “Não há estudos que comprovem, mas o que se percebe é que acontece mais com mulheres próximas à menopausa ou com problemas de fertilidade. O ideal a ser feito é que o companheiro vá às consultas do pré-natal, para tirar todas as dúvidas com o médico e acompanhar a realização de todos os exames necessários. Também é importante que a família esteja presente orientando essa mulher”, ponderou.
Quando a paciente é diagnosticada com gravidez psicológica, Kátia Beal recomenda que seja realizado tratamento e se necessário também atendimento com psiquiatra, que irá prescrever medicamentos. “Na psicoterapia a mulher encontrará ajuda para se conhecer melhor, entender as causas que a levaram a desenvolver o transtorno e elaborar suas questões emocionais de forma a resgatar a autoestima e a estar bem consigo mesma”, concluiu.
Fonte: Globo.com
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- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.