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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico, Odontológico e da Saúde (FMRP-USP). Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado do curso de Bioética e Biodireito do HCor. Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

“A mamã queria ter um filho, foi ao médico e ele pôs a sementinha na barriga”

PORTUGAL

Cristina Nunes e Teresa Ramalho são mulheres solteiras que optaram por ter filhos recorrendo a inseminações artificiais feitas em clínicas espanholas, já que a prática é ilegal em Portugal.

Cristina Nunes lembra-se bem de como lhe responderam à pergunta “de onde é que vêm os filhos?: “os filhos nascem porque o pai põe uma ervilhinha na barriga da mãe”. Quando a filha Ana, que agora tem 4 anos, lhe fizer a mesma pergunta vai-se limitar a adaptar: “a mamã queria ter um filho, foi ao médico e ele pôs a sementinha na barriga”. Quando for grande só espera que ela nunca sinta a necessidade de lhe perguntar pelo pai. Porque para Cristina o homem de tipo sanguíneo RH positivo que doou o seu esperma a um banco da cidade espanhola de Valência não é pai de Ana, é apenas “um dador".

Programadora informática de 38 anos, Cristina Nunes descreve-se a si mesma como uma pessoa metódica. Quando decidiu que era altura de ser mãe, aos 33 anos, já sabia que não o podia fazer em Portugal, que era ilegal por ser uma mulher solteira. A lei portuguesa apenas permite o acesso a técnicas de procriação medicamente assistida a casais heterossexuais com problemas de fertilidade. Fez todo o processo numa clínica espanhola em Vigo e teve a sorte de conseguir Ana logo à primeira, “bastou uma inseminação”.

Também sabia que em Portugal não é possível haver filhos de pai incógnito e que, por ser a filha de um dador anónimo, o Ministério Público iria automaticamente abrir um processo de averiguação da paternidade. Cristina Nunes foi chamada ao Tribunal de Menores de Cascais para dizer que não sabe quem é o pai da sua filha nem pode saber, uma vez que é um dador anónimo e que a lei espanhola não permite a sua identificação. “O processo foi arquivado”. Tinha Ana três meses. No cartão do cidadão da filha está o seu nome e um “X”.

Cristina, que é lésbica mas quis ter a filha mesmo não tendo parceira, sabe que esta sua decisão era um assunto delicado para os pais, por isso esperou pelo fim do primeiro trimestre de gravidez para lhes contar. Chamou pai e mãe lá a casa e disse-lhes que tinha um vídeo para lhes mostrar. Era a gravação da ecografia. O pai aceitou, diz que é o tipo de homem que aceitar aquilo que não pode mudar, “a mãe estrebucha, mesmo em relação àquilo que não pode mudar porque não depende dela”. De tal forma, que se afastou e nunca viu Cristina grávida, só aceitou a neta quando a viu, com 4 meses, na festa de aniversário das primas. Cristina sabia que quando a mãe visse Ana ia mudar de ideias. Assim foi. “Era impossível resistir. Foi amor à primeira vista”.

Para Teresa Ramalho, consultora imobiliária de 36 anos, os seus pais não foram um problema, foram a solução. Sem o seu apoio nunca poderia ter avançado. Sem eles não me podia ter metido nisto”. Vivem numa moradia em Vila do Conde, os pais no andar de cima, ela no andar de baixo. “Para eles foi tão natural como para mim. Eles queriam ser avós, eu queria ser mãe”.

Os pais sempre a ouviram dizer que queria ter filhos e sempre foram assistindo às relações que iam falhando, tinha um namorado e acabava, tinha um namorado e acabava, “por culpa minha”, admite, “eu não tinha paciência, só queria era ficar sozinha”. Mas isto de ir a Espanha fazer uma inseminação artificial para ter um filho parecia-lhe, aqui há uns seis anos, uma coisa demasiado estranha. Por isso, já com a certeza de “não queria uma relação, queria um filho” decidiu avançar sozinha, mas pelo método natural. Escolheu um homem, “pensei que podia ser um bom pai. Infelizmente escolhi mal. As coisas com o pai do meu primeiro filho deram tantos problemas que no segundo decidi que não queria ter um pai”.

Pagou 1500 euros por cada inseminação artificial, engravidou à segunda tentativa. O grande choque foi perceber que eram gémeos. Uma mãe solteira tem de ser muito organizada e Teresa tinha feito “todas as continhas para ter um filho de seis anos e um bebé”, não dois. “Chorei durante duas semanas”. Tempos que já lá vão. “Nem um milésimo de segundo de arrependimento”. Nos primeiros tempos teve de se mudar para o andar de baixo para os pais a ajudarem.

As histórias de quem é o pai do primeiro filho e o dos gémeos são diferentes mas Teresa já está a preparar os mais novos, que agora têm dois anos, como fez com o mais velho. Vai na rua a convida-os a reparar, “já viste aquele pai com aquele menino, se calhar não tem mãe; já viste aquele menino com os avós, se calhar vive com eles. Ando na rua e mostro-lhes várias formas diferentes de famílias que existem”. Como a deles.

Fonte: www.publico.pt