Mulher acusa equipe médica por esquecer pedaço de gaze de 70 centímetros dentro de sua barriga durante cesariana
A bacharel em direito Letícia Carvalho, de 30 anos, denunciou ao Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro (CRM-RJ) a equipe médica chefiada pela obstetra Maria Betânia de Lima Gil, que segundo ela fez o seu parto no dia 6 de maio, na Maternidade São Francisco, em Niterói, mas esqueceu em sua barriga um rolo de gaze cirúrgica de 70 centímetros. Um processo administrativo foi aberto pela entidade.
Letícia conta que só descobriu porque, dias após a cirurgia, começou a sofrer com sintomas como fortes dores na barriga, ânsias de vômito e muita febre. Segundo ela, no dia marcado para a cesariana, a médica que a acompanhou durante toda gestação, não compareceu e enviou a obstetra Maria Betânia de Lima Gil, para atender a paciente.
“Achei muito estranho a doutora Ana Paula não comparecer. Eu confiava tanto nela, que acreditei que a sua substituta fosse ter todo o cuidado comigo. Mas não aconteceu. Ela [Maria Betânia] simplesmente deixou dentro da minha barriga um rolo de gase cirúrgica de cerca de 70 cm”, acusa.
Letícia conta que dois dias após ter dado a luz, ela e o marido voltaram à Maternidade São Francisco, porque estava se sentindo muito mal. Segundo ela, exames como raios-X e tomografias foram realizados, mas “nada de anormal foi encontrado”.
“Fizemos todos os exames na Maternidade São Francisco e nada foi encontrado. Uma das médicas que fazia parte do corpo médico da maternidade disse, ainda, que eu estava com distúrbio eletrolítico, um distúrbio psicológico causado, possivelmente, por alguma disfunção psicológica. Eles me perguntaram, inclusive, se eu queria realmente ter tido o bebê e que eu deveria procurar um psicólogo”, diz Letícia.
Ela conta que fez todo o pré-natal e que não faltou a nenhuma consulta. “Me preocupei muito com a saúde do meu bebê e com a minha também. Afinal, essa era a realização do meu maior sonho. Me organizei: fiz minha faculdade, comprei meu carro, minha casa, enfim, tudo perfeitamente calculado e agora não estou podendo amamentar, mal posso pegar meu filho no colo, de tanta dor que sinto. Minha mãe parou de trabalhar para cuidar do meu filho. Eles tiraram toda a minha alegria de ser mãe, em poder estar grudada com meu filho. Só vivo tomando remédios, sinto dores e tenho que agradecer a Deus por não ter morrido”, comenta.
A mãe de Letícia, Tereza de Brito Silva, de 60 anos, critica a atitude da equipe médica. “Eles (equipe médica) foram irresponsáveis. Minha filha não pode segurar o filho no colo. Há dois meses que não sabe como é poder cuidar do próprio bebê. Além disso, quase perdi minha filha. Foram momentos de terror”, desabafa.
Com muitas dores e sem uma solução, depois de dois meses ela diz que resolveu procurar outro hospital particular em Icaraí, no dia 18 de julho. Novos exames - segundo ela - foram realizados e detectaram o material estranho dentro de seu corpo. Ela conta que precisou passar por nova cirurgia para a retirada.
Mais tranquila após a retirada do material cirúrgico que estava em seu abdômen, Letícia agora diz que a sua maior preocupação é cuidar do pequeno Raphael.
“Eu não quero nada além de cuidar do meu filho, pegá-lo no colo, amamentá-lo diariamente. Quero, também, que as autoridades médicas se preocupem mais com as mães e os bebês”.
Procurada, a médica Maria Betânia Gil informou, por telefone, que está à disposição de paciente para qualquer esclarecimento.
“Estou um pouco assustada com toda essa situação. Em oito anos de profissão nunca passei por nada parecido. Eu e a minha sócia estamos à disposição da Letícia Carvalho e de toda a família dela para qualquer tipo de esclarecimento. Lamentamos o ocorrido”.
Já a Maternidade São Francisco, através de sua assessoria de imprensa, informou que o hospital não se responsabiliza pelo parto realizado no dia 6. Segundo a maternidade, a responsabilidade é da equipe das doutoras citadas, que não fazem parte do quadro técnico da instituição, e utilizam de forma esporádica, através de aluguel, a infraestrutura da maternidade São Francisco.
A maternidade informou ainda que a paciente voltou à unidade uma única vez para atendimento e, na ocasião, foi feita uma ultrassonografia do abdome, que não evidenciou o material cirúrgico.
O CRM-RJ, por sua vez, informou que todas as medidas cabíveis serão tomadas.
“Iremos juntar todas fotos, laudos e informações.Tanto a maternidade, quanto a paciente e as médicas serão ouvidas dentro de um processo administrativo”, informou o coordenador do CRM-RJ em Niterói, Alkamir Issa.
Fonte: O Fluminense
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- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.