Motorista tinha 110 kg e manequim 56; fim de festas 'afastou' colegas.
Justiça acatou recurso para obrigar plano a operá-la depois de 2 anos.
O processo de redução de peso da motorista Janaíne Barcelos, de Brasília, acabou sendo mais difícil do que ela imaginava: além de só ter a cirurgia bariátrica autorizada pela Justiça quando ela já havia perdido 41 quilos, amigos a criticaram e então se afastaram depois que ela cortou os hábitos que a fizeram chegar aos 110 kg.
O "estalo" para buscar a mudança veio em 2013, quando ela viajou de férias para João Pessoa (PB) e se viu de corpo inteiro no espelho do hotel. Treino na academia, rotina alimentar e uma conta no instagram a ajudaram a atingir os 69 kg.
Janaíne, que tem 1,68 m de altura, lembra que procurou a nutricionista justamente por indicação do médico que recomendou a bariátrica. “Ele pediu que eu perdesse 10 kg, mas acabei perdendo 11 kg. Eu deveria emagrecer durante o processo de laudos e exames, que a gente achava que levaria dois meses. Só que dois meses viraram. Tive de repetir exames e consultas, todas essas coisas. Aí, no Natal de 2013, veio a resposta do plano, de que não ia mais autorizar a cirurgia."
Chateada, a motorista procurou o Ministério Público, o Procon e a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e, por fim, decidiu acionar a Justiça. Ela seguiu mantendo os hábitos indicados pela nutricionista enquanto isso, como cortar carboidratos e cerveja. As refeições, que antes ocorriam apenas três vezes no dia, passaram a ser feitas de três em três horas, mas em menor quantidade. Janaíne começou também a frequentar a academia de segunda a segunda, além de correr.
“Refrigerante cortei, mas já não gostava muito. Eu nunca tive frescura para comer, na verdade. De diferente acrescentei chia, farelos. Minha nutricionista montou a dieta com base na minha realidade. Antes eu comia um pratão, porque eu ficava muitas horas sem comer. A gente aqui em casa nunca foi de comer muita fritura, mas o almoço era arroz, feijão e macarrão, só que salada era pouca. Era o grosso, era muita carne, muito arroz, muito feijão, verdura cozida. Isso tudo junto é uma bola”, lembra.
“Minha comida hoje é muito pouquinha. Eu gosto muito de frango desfiado com batata doce, frango desfiado com brócolis. Faço marmitas no domingo, congelo. Onde vou levo minha marmita, está sempre ali”, completa. Cada refeição tem cerca de 450 gramas e ocupa apenas metade do prato.
Janaíne conta que chegou a sofrer preconceito por parte de familiares do marido, ser alvo de piadinhas na rua e até perder oportunidades de emprego por estar acima do peso. Ver as três grandes amigas com quem vivia saindo enfrentarem a mesma luta também a motivou a emagrecer. O fim das grandes festas em casa e o resultado acabaram, porém, despertando “ciúme”.
“Nesse processo de emagrecimento eu chorei muito. Sou dessas de querer estar perto, de incentivar, de chamar para malhar junto, mas me viraram as costas porque achavam que eu queria ‘competir’. Desse quarteto, só minha prima, que é como uma irmã, continuou realmente perto de mim. Perdi muita gente. Muitos amigos que viviam na minha casa hoje não ligam. Hoje eu aceito numa boa, entendo, sei quem é quem. Tem aqueles que ficam tempos sem ligar, mas quando ligam é OK”, diz. “Abri mão de saída, de noitadas. Meu foco agora é minha alimentação, minha família, meu treino.”
A conta no instagram acabou virando uma grande aliada. A motorista divide com os 3,8 mil seguidores vídeos dos treinos, fotos de antes e agora, refeições e mensagens motivacionais. A conta ganhou o nome #projetofocaquedacerto.
Saúde, ação judicial e discriminação
Para perder peso, Janaíne teve de superar até a negativa do plano de saúde, que barrou a cirurgia bariátrica que planejava. Ela teve o pedido de cirurgia negado na primeira instância, mas recorreu da decisão judicial. A resposta só veio dois anos depois, quando ela já tinha chegado ao manequim 42.
"A negativa do plano foi horrível, foi muito dolorosa. Então, cada curtida que eu tinha, cada palavra dos seguidores me ajudou demais. Se não fosse a motivação deles, de todo dia ter um ‘bom dia’, ter uma evolução, nossa, de ‘não desiste, não’. Da mesma forma que me ajudavam, eu retribuía também, postando uma foto, um incentivo. Foi fundamental para eu me manter", afirma.
Janaíne tinha índice de massa corporal de 38,9 (classificado como obesidade classe II) quando decidiu dar início ao processo para fazer a cirurgia bariátrica. Ela diz que já havia se aceitado com o manequim 56, mas se sentia incomodada com as piadinhas e conversas.
“Minha filha mais nova tem 5 anos, e acho que ela não se lembra de mim antes. Mas a maior, que tem 11, já ouviu falar algo. Eu ia entrar no carro, com toda a dificuldade por estar gorda, e ela falou: ‘Nossa, mãe, o carro balançou’. Minha prima já tentou arrumar emprego para mim e me contou que não aceitaram porque eu estava gordinha. E, para o meu marido, já falaram ‘não casa com ela, não, você é bonitão, olha o jeito que ela é. Imagina daqui uns 15 anos’. Ele sempre me deu apoio, é um companheirão, imagino que ouviu muito”, diz a motorista. A união tem 12 anos.
Ela conta que, por causa do excesso de peso, chegou a ter apneia, bursite no quadril, problema no joelho e início de pressão alta. “Hoje eu posso cruzar uma perna, coisa que eu não fazia, calçar um tênis – porque antes eu já não calçava mais, com 110 kg. Sandália, quando eu ia fechar, sempre era minha filha que me ajudava. Emagrecer foi como nascer de novo.”
“Demorou para a ficha cair que eu cabia em peças menores. Fiquei muito tempo indo a loja pegando as GG, extra GG, aí chegava em casa com o vestido e estava enorme. Aí pensava ‘mando arrumar, não, vou lá trocar’, aí chegava lá e tinha que pegar um P. Era a P que servia, nem a M ficava legal, ficava largo”, conta.
Janaíne diz que mantém os 75 minutos diários na academia e a alimentação “certinha” para não voltar ao excesso de peso. Ela sempre teve tendência a engordar, mas viu a situação sair do controle em 2006.
“Fiquei sedentária, desleixei e o marido nunca me cobrou. Sempre me aceitou, enfrentou muita barreira com a família dele por conta de eu ser obesa, mas se manteve ali. Eu tenho um puta marido, muito bacana, ótimo companheiro, ótimo pai. Era super contra a cirurgia, inclusive. E aí eu tinha me aceitado, mas parece que isso é pior, porque eu não caía na realidade daquilo que eu estava vivendo. Quando notei, caí na realidade, queria mudar para mim, mas também por ele. Mas ele sempre me tratou muito bem, de me elogiar da mesma forma”, conclui.
Fonte: G1/Distrito Federal
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- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.