O juiz Leonardo Fleury Curado Dias, da 4ª Vara Criminal de Aparecida de Goiânia, indeferiu, nesta quinta-feira (17), o pedido de uma mãe para interromper sua gravidez, de proximamente 27 semanas, alegando que o feto gerado apresenta microcefalia, associada a alterações do sistema nervoso central.
O magistrado destacou que a análise do pedido deve ser feita de forma cautelosa e dentro dos parâmetros legais, isso porque “questões que abrangem o tema do aborto são tempestuosas e vem sempre à tona a repugnância ética pelo procedimento, que é considerado um ato atentatório contra a vida”.
Leonardo Fleury lembrou que o aborto não é incriminado em dois casos: naqueles em que necessário ou terapêutico, ou seja, de comprovado risco de morte para a mãe, e sentimental, quando decorrente de gestação resultante de estupro. Ele destacou ainda que há o entendimento jurisprudencial que pacificou a possibilidade da interrupção da gestação de feto anencéfalo. Assim, para o juiz, no caso em análise não ocorre nenhuma dessas hipóteses, configurando-se a prática da interrupção da gestação, crime de aborto, conforme os artigos 124 a 128 do Código Penal.
De acordo com o magistrado, trata-se de microcefalia associada a outras alterações não esclarecidas e, por isso, não pode ser confundida nem tratada como caso de anencefalia (feto sem cérebro). Ele ainda salientou que, conforme o laudo médico anexado aos autos, há algumas alterações a serem esclarecidas no período pós-natal, ou seja, indicação de que a criança virá ao mundo com vida.
“Pelo que consta da documentação juntada, não é possível concluir que o caso traz sérios riscos de vida à gestante ou à criança. Constata-se, de fato, que há a microcefalia e outras alterações a serem esclarecidas, porém, não podem estas alterações, não esclarecidas, servir de base para autorizar o pedido, muito menos pela microcefalia, em que haverá vida após o parto, ressalvadas dificuldades cognitivas, motoras e de aprendizado do recém-nascido”, destacou.
Para Leonardo Fleury, é importante esclarecer, segundo conceitos médicos, a distinção entre microcefalia e anencefalia. Segundo análises, a microcefalia é uma condição neurológica em que a cabeça e o cérebro da criança são significativamente menores que o normal para sua idade, o que prejudica o seu desenvolvimento mental. Já a anencefalia é caracterizada pela ausência total ou parcial de encéfalo e da caixa craniana do feto. Portanto, o prognóstico de um bebê com anencefalia é de algumas horas ou dias de vida, não havendo condição de sobrevida. Porém, no caso da microcefalia, apesar de prejudicado o desenvolvimento mental da criança, a mesma sobreviverá.
Com base nos documentos, para o juiz, portanto, a alegação da mãe, de que esteja carregando '‘dentro de si feto sem qualquer chance de sobrevivência’', não prospera. Ele ressaltou que alterações e imperfeições no feto não podem, sempre, justificar uma situação para o aborto, vez que com este raciocínio busca-se a criança perfeita. “Ressalto que não está em discussão o direito da gestante e, sim, o do nascituro. Entretanto, não se nega os transtornos advindos à mãe, o sofrimento e a dor que, provavelmente, a acompanharão durante toda sua existência. Contudo, a vida, por menor que seja e de que forma for, deve ser preservada”, enfatizou.
Fonte: Tribunal de Justiça de Goiás/AASP
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- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.