Mãe pela primeira vez, Fernanda França Fernandes, de 33 anos, estava em trabalho de parto há sete horas, quando o processo foi interrompido. Uma enfermeira entrou no quarto para informar que a doula, acompanhante de Fernanda durante a gestão, não poderia ficar para o nascimento. É que o Hospital Municipal Maternidade Maria Amélia Buarque de Hollanda, referência em parto humanizado na cidade do Rio de Janeiro, não pode mais manter doulas em sala de parto, por causa de uma resolução do Conselho Regional Medicina do Rio (Cremerj) que voltou a valer.
Assustada, Fernanda viu o trabalho de parto regredir. Ela ficou preocupada com a possibilidade de ficar sem o acompanhamento da doula, com quem desenvolveu uma relação de afinidade e confiança. Por causa disso, acredita ter ficado mais nervosa, prejudicando o nascimento do bebê, que ficou em trabalho de parto por 24 horas. “Passaram óleo [na barriga], coisas para tentar fazer o trabalho de parto voltar, mas no final, tive que fazer [uso] de ocitocina [hormônio sintético que aumenta o número de contrações do útero] e todas intervenções que eu não queria”, contou.
“Passei a madrugada evoluindo, mas a partir desse momento [do anúncio da retirada da doula da sala], começou a regredir, não digo parar, mas regredir, porque a enfermeira não voltou. A sensação era de que a qualquer momento alguém poderia chegar e mandar ela embora me deixou nervosa e aí, o trabalho de parto parou geral”, acrescentou.
Mesmo sendo referência em práticas de humanização, como permitir a presença regulamentada de doulas, para tentar reduzir as cesarianas, o Maria Amélia teve de se adaptar à resolução do Cremerj. “Por causa das ameaças de punições a profissionais [pelo Cremerj], a Secretaria Municipal de Saúde suspendeu a permissão à atuação das doulas até que se chegue a um consenso”, informou a secretaria.
Projeto de lei
Preocupadas com o efeito da decisão em outras unidades, mães, gestantes e doulas querem que a resolução do conselho seja derrubada por meio de lei. Elas explicam que doulas dão conforto e segurança às famílias e esclarecem que não interferem nos procedimentos médicos. Para tentar convencer os deputados, elas estarão entre hoje (29) e quinta-feira (31) na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. Tramita na casa projeto de lei que libera a presença das doulas.
A médica sanitarista Tizuko Shiraiwa explica que as doulas usam métodos naturais para ajudar as mães, como a indicação de exercícios de respiração, a aplicação de óleo e a ajuda com posições confortáveis na hora do nascimento. “O que as doulas fazem é dar assistência física e emocional às mães. Está mais que provado cientificamente que [a presença delas] é benéfica para mulher. Não vejo em que [isso] pode ser ruim”, disse a médica, que foi coordenadora do Comitê de Mortalidade Materna do Estado do Rio por dez anos.
De acordo com Tizuko Shiraiwa, a decisão do Cremerj, de proibir as doulas em salas de parto, é uma “defesa corporativa”. “As doulas ajudam as mulheres a optar pelo parto normal, o que os médicos não querem fazer porque demora muito e não é remunerado igualmente.”
A Agência Brasil entrou em contato com o Cremerj, mas não conseguiu, durante todo o dia, entrevistar a médica indicada pela entidade. O telefone passado pelo Cremerj não atendeu. Segundo a entidade, só esta profissional poderia falar sobre o assunto.
O Ministério da Saúde esclareceu, em nota, que a participação de doulas nos partos é “decisão do gestor local” das unidades de saúde. Não há leis ou normas que resguardem a presença das profissionais nas salas e a Lei do Acompanhante dá direito apenas a uma pessoa na sala de parto.
A resolução do Cremerj que proíbe a presença de doulas e/ou parteiras em salas de partos havia sido derrubada na Justiça, antes de o conselho recorrer ao Tribunal Regional Federal do Rio de Janeiro e conseguir reverter a decisão. Caso os médicos sejam flagrados realizando parto na presença das doulas podem até perder o registro.
Outras experiências
Fora do Rio, no entanto, a presença de doulas é incentivada em maternidades. No interior de São Paulo, por exemplo, a contratação delas por um hospital privado reduziu o número de cesáreas, intervenção aconselhada apenas em caso de risco de morte. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, o parto normal é mais seguro e deve ser prioridade.
*Informações da Agência Brasil
Fonte: SaúdeJur
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- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.