Pedido teria sido feito ao governo antes de fechamento do pronto-socorro.
Mudança na gestão será publicada no Diário Oficial nos próximos dias.
A Santa Casa de Misericórdia de São Paulo deixará de administrar o Hospital Estadual de Franco da Rocha, na Grande São Paulo. O centro médico é referência, de acordo com dados do governo do estado, para 540 mil pacientes de ao menos cinco cidades da região metropolitana. Os funcionários do centro médico foram notificados na sexta-feira (25). A informação foi confirmada ao G1 tanto por médicos como por pessoas ligadas à administração.
Procurada pela equipe de reportagem, tanto a Secretaria de Estado da Saúde quanto a Irmandade Santa Casa de Misericórdia não deram detalhes sobre o rompimento do contrato. Não foi informado quem passará a administrar o hospital e se a mudança afeta o atendimento de pacientes.
A mudança na gerência deve ser publicada no Diário Oficial nos próximos dias. O Hospital "Doutor Albano da Franca Rocha Sobrinho" é uma das quatro Organizações Sociais de Saúde Estaduais (OSE) administradas pela Santa Casa. As demais continuam sob gestão da Irmandade: Hospital Geral de Guarulhos, Hospital Estadual de Francisco Morato e o Centro Hospitalar do Sistema Penitenciário.
A Santa Casa teria pedido para deixar a administração do hospital por conta dos problemas financeiros que está enfrentando. A instituição alegou que deseja se concentrar na administração do Hospital Central. O pedido foi feito ao governo antes de a crise eclodir com o fechamento do pronto-socorro em Santa Cecília na terça-feira (22), quando o atendimento de urgências e emergências foi cancelado.
Funcionamento desde 2011
O Hospital Estadual de Franco da Rocha foi inaugurado em abril de 2011, em uma parceria entre o governo e a Irmandade da Santa Casa de Misericórdia. Foram investidos R$ 55 milhões.
Construído dentro do Complexo Hospitalar do Juquery, em uma área de mais ou menos 150 hectares, o centro médico atende 24 horas aos municípios de Franco da Rocha, Francisco Morato, Caieiras, Cajamar e Mairiporã.
O perfil do hospital é o atendimento referenciado, de média e alta complexidades em clínica médica, cirurgia geral, cirurgia vascular, ortopedia, neurocirurgia e UTI, com total de 167 leitos.
À época da sua inauguração, a previsão era fazer 573 internações mensais, 4.500 atendimentos de urgência, 176 cirurgias, 2.816 consultas médicas ambulatoriais e 350 exames. De acordo com balanço realizado no primeiro trimestre do ano passado, o total de atendimentos ambulatoriais foi de 12.299 no período.
Crise em etapas
A Santa Casa fechou o pronto-socorro na terça-feira (22). Na quarta, foram suspensos exames e cirurgias eletivas (não urgentes). O serviço foi reaberto após o governo do estado liberar, de imediato, R$ 3 milhões para a entidade. O hospital terá ajuda do estado para quitar uma dívida de R$ 50 milhões com fornecedores. O Ministério Público notificou a entidade sobre a ilegalidade do fechamento.
A Santa Casa é um hospital filantrópico privado, que não cobra dos pacientes. O atendimento é financiado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e complementado pelo governo do estado.
O secretário estadual de Saúde, David Uip, disse que a auditoria nas contas do hospital terá representantes dos governos federal, estadual e municipal. Segundo David Uip, a Santa Casa recebeu, em 2013, verba equivalente a 2,6 vezes o valor gasto em atendimentos conforme a tabela do SUS.
No ano passado, o valor da produção, segundo a tabela, foi de R$ 155 milhões. No período, o total repassado pelos governos federal e estadual foi de mais de R$ 415 milhões. “É um problema de gestão e financiamento”, disse Uip.
Ainda de acordo com dados apresentados pelo secretário, nos cinco primeiros meses do ano, o total repassado foi de pouco mais de R$ 173 milhões e o custo da produção foi de R$ 63 milhões. "Ninguém está suspeitando de nada aqui. Não é fácil ser gestor de um grande hospital, eu já fui e conheço a dificuldade", disse.
Falta de recursos
Segundo o provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, Kalil Rocha Abdalla, o fechamento ocorreu por causa da dívida acumulada com fornecedores, que levou à falta de medicamentos e materiais cirúrgicos.
“Não tem material nenhum. Não tenho seringa, esparadrapo, não tenho remédio. Estamos em um pronto-socorro à mingua”, afirmou Abdalla. “Achavam que eu estava blefando, que eu estava pedindo dinheiro desnecessariamente”, disse Abdalla. "A Santa Casa precisa de uma infinidade de dinheiro. Nós não sabemos quantas pessoas virão aqui. Quem vier aqui será atendido, é o que sempre aconteceu."
Ápice de crise
O fechamento do pronto-socorro é o ápice de uma crise que se agrava ao longo dos anos e que afeta também outros hospitais filantrópicos pelo país. Em junho, a TV Globo mostrou que cirurgias estavam sendo canceladas por falta de materiais e que a dúvida estimada da Santa Casa era de R$ 400 milhões. A dívida com fornecedores, motivo do fechamento anunciado nesta terça, é de R$ 50 milhões.
A Irmandade é referência no atendimento hospitalar no estado e a estimativa é que tenha sido fundada em 1560. A sede na Santa Cecília foi inaugurada em 1884. De acordo com o secretário municipal de Saúde, José de Filippi Junior, o pronto-socorro do Hospital Central é o segundo em número de atendimentos na cidade. Depois do Pronto-Socorro Municipal do Tatuapé, com 1,2 mil pacientes por dia, o PS da Santa Casa atende cerca de mil pessoas por dia, segundo Filippi Junior.
Recursos
Na terça, em nota, o Ministério da Saúde informou ter recebido "com preocupação" a informação sobre o fechamento. "A medida unilateral não foi previamente comunicada ao Ministério da Saúde. Nesta tarde, a pasta entrou em contato com a secretaria Estadual de Saúde, gestora do contrato com a Santa Casa, para conhecer as providências que serão adotadas e contribuir na solução da situação", informou em nota.
O Ministério da Saúde negou que os valores repassados para a Santa Casa se limitem ao pagamento de procedimentos da tabela do SUS. "Desde 2012, o total de incentivos federais mais que dobra o valor anual repassado por esses procedimentos", afirma.
"Apenas do governo federal, dos R$ 303 milhões previstos para 2014, a Santa Casa receberá 49,7% em repasse por procedimentos (tabela SUS) e 50,3% em incentivos. Os pagamentos estão em dia", informou o Ministério da Saúde.
O governo estadual disse que "tem auxiliado sistematicamente" as Santas Casas e hospitais filantrópicos com recursos extras. "Somente neste ano pelo programa SOS Santas Casas serão 571 milhões de reais extras para 125 entidades, o dobro do valor repassado nos últimos anos, para cobrir a defasagem de valores da tabela do Ministério da Saúde, congelada há anos", informa em nota.
Apenas para a Santa Casa de SP serão encaminhados R$ 168 milhões em recursos extras do tesouro estadual neste ano, totalizando R$ 345 milhões em dois anos.
Crise na saúde filantrópica
A crise afeta diversos hospitais filantrópicos pelo país. No ano passado, a Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas do Brasil (CMB), estimava as dívidas das instituições de saúde filantrópicas em cerca de R$ 15 bilhões. Deste total, R$ 5,4 bilhões são referentes a débitos com a União (relativos a dívidas tributárias e previdenciárias) e R$ 10 bilhões acumulados com bancos e fornecedores.
Em outubro de 2013 o Ministério da Saúde lançou o programa de renegociação das dívidas das santas casas. Segundo o ministério, a nova legislação permite que a dívida das instituições de saúde seja abatida desde que os hospitais mantenham o pagamento das demais contas em dia e garantam o aumento de atendimentos por meio do SUS. A expectativa do ministério é de que o perdão total das dívidas das santas casas com a União ocorra em até 15 anos, a partir de 2014.
Fonte: Globo.com
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- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.