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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

quarta-feira, 23 de julho de 2014

Estados Unidos se tornam meca da barriga de aluguel

TAMAR LEWIN DO ``NEW YORK TIMES``

Um casal gay de Lisboa convidou amigos para uma festa de aniversário e então revelou uma surpresa -uma imagem de ultrassom do seu bebê, na Pensilvânia, mexendo-se na barriga de uma mulher paga para gerar o filho do casal.

``Todos ficaram chocados e perguntaram tudo sobre como fizemos isso``, disse Paulo, que falou sob a condição de que nem seu sobrenome nem o de seu marido, João, fossem usados, já que o que eles estão fazendo é considerado crime em Portugal.

Embora os bebês concebidos em barrigas de aluguel tenham se tornado cada vez mais comuns nos Estados Unidos, com celebridades como Elton John, Sarah Jessica Parker e Jimmy Fallon discutindo abertamente como formaram uma família, a situação é diferente na maior parte do mundo, onde é proibido contratar uma mulher para gestar uma criança.

Além dos Estados Unidos, apenas alguns países -entre eles Índia, Tailândia, Ucrânia e México- permitem a contratação de barrigas de aluguel. Os Estados Unidos estão atraindo casais com alto poder aquisitivo da Europa, Ásia e Austrália.

Em muitas nações, uma situação que divida a maternidade entre a mãe biológica e a barriga de aluguel é amplamente vista como sendo contrária aos interesses da criança. E ainda mais quando três mulheres estão envolvidas: a mãe genética, cujo óvulo é usado; a mãe que gera o bebê; e a que encomendou os serviços e irá criar a criança.

Os alemães Thomas Reuss e Dennis Reuther contrataram o serviço na Pensilvânia.
Esses países abominam o que classificam como comercialização da gestação de um bebê e consideram o comércio da barriga de aluguel como inerentemente explorador de mulheres pobres, observando que mulheres ricas geralmente não alugam seus ventres.

Muitos Estados americanos também proíbem a prática, mas outros, como a Califórnia, a consideram um negócio legítimo. Mais de 2.000 bebês serão gerados em barrigas de aluguel nos Estados Unidos neste ano, quase três vezes mais do que há uma década. Mas as agências que fazem a ponte entre os futuros pais e as barrigas de aluguel não são regulamentadas, criando um mercado onde clientes vulneráveis podem sair prejudicados.

As barrigas de aluguel surgiram nos Estados Unidos há mais de 30 anos, logo depois do nascimento, na Inglaterra, do primeiro bebê concebido por fertilização in vitro. Na época, as mulheres que alugavam seus úteros eram também em geral as mães genéticas, engravidando por inseminação artificial com o esperma do futuro pai. Mas isso mudou depois do caso conhecido como ``Bebê M``, em 1986, em que Mary Beth Whitehead, que alugara seu ventre, recusou-se a entregar o bebê para o pai biológico e sua esposa.

A barriga de aluguel tradicional deu lugar ao tipo gestacional, no qual o embrião é criado em laboratório - às vezes usando óvulos e esperma dos pais, às vezes de doadores - e transferido para uma mulher que não tem nenhum vínculo genético com o bebê.

No Canadá, assim como no Reino Unido, o pagamento das barrigas de aluguel é limitado às despesas. ``Existe um consenso geral de que pagar pelas barrigas de aluguel transformaria as mulheres e seus corpos em commodities``, disse Abby Lipp­man, professora emérita da Universidade McGill, em Montreal.

A Alemanha proíbe as barrigas de aluguel. ``Consideramos as barrigas de aluguel como uma exploração das mulheres e de suas capacidades reprodutivas``, disse Ingrid Schneider, do Centro de Pesquisa para Biotecnologia, Sociedade e Meio Ambiente, da Universidade de Hamburgo. ``O processo de vínculo entre a mãe e a criança começa antes do momento do parto. É um processo contínuo durante a gravidez em si, no qual está sendo formado um intenso relacionamento entre a mulher e a futura criança. Esses vínculos são essenciais para a criação de bases para uma paternidade bem-sucedida.``

Os futuros pais estrangeiros normalmente pagam US$ 150 mil (cerca de R$ 330 mil) ou mais por todo o processo de barriga de aluguel nos Estados Unidos, sendo que as mulheres que alugam seus ventres recebem entre US$ 20 mil e US$ 30 mil (entre R$ 44 mil e R$ 66 mil) desse total.

Para alternativas mais baratas, muitos casais viajam à Índia, à Tailândia ou ao México. Mas vêm surgindo complicações - como o caso de um casal que ficou retido na Índia por seis anos ao tentar levar para casa um menino cujo teste genético revelou que o bebê não era filho deles, aparentemente devido a uma troca ocorrida na doação do esperma.

Alguns advogados que lidam com barrigas de aluguel mencionam problemas éticos com os futuros pais do exterior.

Andrew Vorzimer, um advogado de Los Angeles especializado no assunto, teve um cliente internacional que queria implantar seis embriões.

``Ele queria ficar com dois bebês e oferecer o resto para adoção``, disse Vorzimer. ``Disse que não trabalharia com ele.``

Às vezes, os futuros pais e a barriga de aluguel não chegam a um acordo sobre o que fazer com um feto com deficiência. Heather Rice, do Arizona, disse que, quando um ultrassom mostrou que o feto de 21 semanas em seu ventre tinha uma fissura no cérebro, ``a mãe saiu da sala e me deixou deitada lá``.

Rice não queria abortar o feto e quando, no ultrassom da 28ª semana, o cérebro do bebê parecia um pouco melhor, os pais disseram que afinal ficariam com o menino. Rice disse que não tem ideia de como o bebê está.

Muitas barrigas de aluguel atendem mais de uma vez aos mesmos pais. Kelly, técnica em enfermagem na Pensilvânia, gerou em 2012 o bebê Nico para dois alemães, Thomas Reuss e Dennis Reuther, e agora está grávida de gêmeos deles.

``Adoro estar grávida, mas não quero ter mais filhos``, disse. ``É ótimo ver Thomas e Dennis com Nico, e como estão animados com seus gêmeos. O dinheiro é bom, mas poderíamos viver sem ele, e não é por essa razão que estou fazendo isso``, disse.

A maioria dos casais internacionais quer que seus bebês sejam cidadãos de seus países de origem. Mas muitos pais chineses mantêm a cidadania americana, que é conferida automaticamente para cada bebê nascido em território dos EUA.

Levar para casa um bebê nascido nos Estados Unidos pode envolver um emaranhado de problemas migratórios. Mas o direito internacional está avançando: em 26 de junho, num processo envolvendo dois casos de crianças nascidas de barrigas de aluguel americanas, a Corte Europeia de Direitos Humanos determinou que a França havia violado a Convenção Europeia de Direitos Humanos e prejudicado a identidade das crianças ao recusar o reconhecimento do pai biológico como pai legal, facilitando o caminho para a cidadania francesa.

Fonte: Folha de S.Paulo