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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Direito da criança e do adolescente de não serem submetidos à excessiva medicalização

MINISTÉRIO DAS MULHERES, DA IGUALDADE RACIAL E DOS DIREITOS HUMANOS
CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

RESOLUÇÃO CNDCA Nº 177, DE 11 DE DEZEMBRO DE 2015
Diário Oficial da União; Poder Executivo, Brasília, DF, 18 dez. 2015. Seção I, p.94

Dispõe sobre o direito da criança e do adolescente de não serem submetidos à excessiva medicalização.

O CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, no uso das atribuições que lhe confere o inciso I do art. 2º da Lei n° 8.242, de 12 de outubro de 1991, e tendo em vista o disposto no inciso I do art. 2º do Decreto n° 5.089, de 20 de maio de 2000, e

Considerando que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à dignidade, ao respeito e à liberdade, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão;

Considerando que, nos termos do § 1º do art. 227 da Constituição Federal, o Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança, do adolescente e do jovem;

Considerando o art. 7º do Estatuto da Criança e do Adolescente, que estatui "a criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência";

Considerando o art. 17 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que prevê "o direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.";

Considerando o art. 125 do Estatuto da Criança e do Adolescente que dispõe que é dever do Estado zelar pela integridade física e mental dos internos do Sistema Socioeducativo, cabendo-lhe adotar as medidas adequadas de contenção e segurança;

Considerando a recomendação MERCOSUL/XXVI RAADH/P. REC. No 01/15 do MERCOSUL no âmbito da XXVI Reunião de Altas Autoridades em Direitos Humanos (RAADH), que se realizou na cidade de Brasília, República Federativa do Brasil, no dia 6 de julho de 2015, que afirma a importância de garantir o direito de crianças e adolescentes a não serem excessivamente medicados e recomenda o estabelecimento de diretrizes e protocolos clínicos sobre o tema;

Considerando as "Recomendações do Ministério da Saúde para adoção de práticas não medicalizantes e para publicação de protocolos municipais e estaduais de dispensação de metilfenidato para prevenir a excessiva medicalização de crianças e adolescentes", publicada em 1º de outubro de 2015, que apontam a existência de diagnósticos excessivos e abusos na prescrição do medicamento;

Considerando a Recomendação nº 19 do Conselho Nacional de Saúde, de 8 de Outubro de 2015, que recomenda ao Ministério da Saúde, Secretarias Estaduais por meio do Conselho Nacional das Secretarias Estaduais de Saúde e Secretarias Municipais, por meio do Conselho Nacional das Secretarias Municipais de Saúde, a promoção de práticas não medicalizantes por profissionais e serviços de saúde, bem como recomenda a publicação de protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas para prescrição de metilfenidato, de modo a prevenir a excessiva medicalização de crianças e adolescentes;

Considerando as experiências do Município de São Paulo, por meio da edição da Portaria nº 986, de 12 de junho de 2014, e de Campinas, que demonstram como a publicação de protocolos pode contribuir para a diminuição da prescrição excessiva, e por vezes desnecessária, do medicamento;

Considerando o alto índice de utilização de medicamentos, em especial psicotrópicos, em serviços de acolhimento institucional e em unidades de medidas sócio educativas, levando especialistas a afirmarem a existência de prática corrente de contenção química;

Considerando que o Brasil se tornou o segundo mercado mundial no consumo do metilfenidato, com cerca de 2.000.000 de caixas vendidas no ano de 2010, e estudos apontam para um aumento de consumo de 775% entre 2003 e 2012 segundo dados do Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro;

Considerando que as estimativas de prevalência de Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) em crianças e adolescentes no Brasil são bastante discordantes, com valores de 0,9% a 26,8% segundo o Boletim de Farmacoepidemiologia do Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados (SNGPC) da Agência Nacional de Vigilância Sanitária;

Considerando que os medicamentos psicotrópicos podem causar dependência física ou psíquica, conforme Portaria n.º 344, de 12 de maio de 1998, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, segundo a bula do medicamento;

Considerando que o TDAH, não pode ser confirmado por

nenhum exame laboratorial, segundo o boletim SNGPC da ANVISA, resolve:

Art. 1º Esta Resolução dispõe sobre o direito da criança e do adolescente de não serem submetidos à excessiva medicalização, em especial no que concerne às questões de aprendizagem, comportamento e disciplina.

Parágrafo único. Para os fins desta Resolução, define-se excessiva medicalização como a redução inadequada de questões de aprendizagem, comportamento e disciplina a patologias, em desconformidade com o direito da criança e do adolescente à saúde, ou que configure negligência, discriminação ou opressão.

Art. 2º A criança e o adolescente têm direito à proteção integral, particularmente ao acesso a alternativas não medicalizantes para seus problemas de aprendizagem, comportamento e disciplina que levem em conta aspectos pedagógicos, sociais, culturais, emocionais e étnicos, e que envolvam a família, profissionais responsáveis pelos cuidados de crianças e adolescentes e a comunidade.

Art. 3º A proteção integral da criança e do adolescente implica a abordagem multiprofissional e intersetorial das questões de aprendizagem, comportamento e disciplina de crianças e adolescentes, com vistas a reduzir a excessiva medicalização e promover práticas de educação e cuidados de saúde.

Parágrafo único. A promoção das práticas de educação e cuidados de saúde, previstas no caput envolve a oferta pelo Poder Público competente de orientação para familiares e de capacitação para profissionais responsáveis pelos cuidados de crianças e adolescentes, com relação aos transtornos de comportamento e aprendizagem que vêm sendo objeto de excessiva medicalização.

Art. 4º Os órgãos e entidades que integram o Sistema de Garantia de Direitos deverão prevenir a ocorrência de violação dos direitos da criança e do adolescente decorrentes da excessiva medicalização, tendo como ações, dentre outras, a promoção de campanhas educativas e debates para a divulgação do direito da criança e do adolescente de serem educados e cuidados sem o uso de excessiva medicalização.

Art.5º A atenção integral à saúde dos adolescentes, no âmbito do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), tem como diretriz os cuidados especiais em saúde mental.

§ 1º Os cuidados especiais em saúde mental referidos no caput deverão ser realizados por equipe multidisciplinar e multissetorial de saúde cuja composição esteja em conformidade com as normas de referência do Sistema Único de Saúde.

§ 2º O adolescente em cumprimento de medida socioeducativa que apresente indícios de transtorno mental, de deficiência mental, ou associadas, deverá ser avaliado por equipe técnica multidisciplinar e multissetorial e esta avaliação subsidiará a elaboração e execução da terapêutica a ser adotada, a qual será incluída no Plano Individual de Atendimento PIA do adolescente.

§ 3º A prescrição de medicamento psiquiátrico para adolescentes no âmbito do Sinase deve ser feita nos termos da lei, bem como deve estar em conformidade com o PIA e com as necessidades individuais do adolescente.

Art.6º As entidades que ofereçam programas de atendimento socioeducativo e de privação de liberdade devem adotar medidas que coíbam a prática de excessiva medicalização e de contenção química arbitrária de adolescentes.

Art. 7º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

RODRIGO TORRES DE ARAÚJO LIMA
Presidente do Conselho