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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico, Odontológico e da Saúde (FMRP-USP). Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado do curso de Bioética e Biodireito do HCor. Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Atestado médico falso: implicações para o médico

O atestado médico falso pode ser de natureza material quando é emitido por qualquer pessoa que não tenha habilitação para exercer a medicina. Trata-se de exercício ilegal da medicina e deve receber o devido tratamento legal.

O atestado médico falso pode, também, ser de natureza ideológica, quando emitido por médico devidamente habilitado para o exercício da profissão. O Conselho Federal de Medicina (CFM), de acordo com o Código de Ética Médica, artigos 80 e 81, reconhece duas espécies de falsidade ideológica no documento emitido pelo médico, conforme explicitado a seguir.

A primeira espécie de falsidade ideológica, descrita no artigo 80 é o atestado emitido sem ter o médico praticado ato profissional que o justifique, ou seja, sem a apresentação do prontuário médico correspondente ao respectivo atestado. A inexistência do prontuário médico é o bastante para caracterizar a ausência do ato médico, uma vez que, o mesmo Código de Ética, em seu artigo 86, veda ao médico deixar de elaborar prontuário legível para cada paciente.

O mesmo artigo 80 reconhece como falsidade ideológica o atestado médico que seja tendencioso ou que não corresponda à verdade. Considera-se tendencioso o atestado que exagera no seu conteúdo, a exemplo da afirmativa: “atesto que o paciente tem hipertensão de difícil tratamento, não pode trabalhar e deve ser aposentado”. Já o atestado que não corresponde à verdade é aquele que justifica a ausência da pessoa a uma atividade qualquer (prova, audiência, etc.), com um diagnóstico (CID) de uma doença inexistente.

A segunda espécie de falsidade ideológica, desta vez descrita no artigo 81 do citado Código de Ética, é o atestado emitido como forma de obter vantagens, a exemplo do profissional que facilita a emissão de atestado como forma de captação de clientela, ou ainda, como forma de obtenção de renda. Como exemplo desta última opção, cita-se o fornecimento de atestado de óbito, condicionado a pagamento prévio, de paciente falecido de causa natural, mas sem acompanhamento por médico assistente.

Em todos os Conselhos Regionais de Medicina, o recebimento de denúncias de suspeita de uso de atestado médico para abonar falta ao trabalho tem sido um problema freqüente. O Regional da Bahia, por exemplo, encaminhou, no ano de 2014, 599 solicitações para verificar a veracidade do atestado. Desses, ao menos 183 já foram comprovados como falsos.

Em suma, a emissão de um atestado pelo médico, deve ser baseada em questões éticas, técnicas e objetivas. Ao banalizar o atestado, que é um documento jurídico, o médico além de descumprir o Código de Ética Médica (arts. 30, 80, 81), fere a Constituição Federal (art. 5º, inciso XIII), ataca o Código Penal (art. 302) e agride o Código Civil (art. 187). E assim procedendo, o médico emissor, à luz do Direito, comete ato ilícito: pratica uma ação voluntária, que viola um direito e causa dano a outrem (Código Civil Brasileiro, artigo 186).

No caso de atestado reconhecidamente falso fornecido para fins de abono de falta ao trabalho, a empregadora é quem sofre prejuízo direto com tal atitude. Cabe, neste caso, ação indenizatória da empresa contra o médico emissor do atestado com pedidos de danos material e moral.

Os danos materiais, que devem ser comprovados, podem ser assim descritos e quantificados: (1) Pagamento de salário e encargos ao trabalhador afastado ilicitamente; (2) Pagamento de salário e encargos a mão de obra substituta, em iguais valores aqueles do titular; (3) Redução direta de produtividade decorrente da ausência do trabalhador titular, a qual é calculada dividindo-se o faturamento da empresa pelo número de empregados; (4) Redução indireta da produtividade em decorrência da menor capacidade produtiva da mão de obra substitutiva, a qual é calculada dividindo pela metade o valor encontrado para o empregado titular.

Cabe ainda o pedido de danos morais contra o nome, a imagem e a honra da pessoa jurídica empregadora. A arbitragem por parte do magistrado é o critério de indenizar o dano moral adotada pela legislação pátria (Constituição Federal, artigo 5º. Inciso X; Código civil art. 52; Súmula 227 STJ).

É necessário, portanto, que o médico esteja atento às questões técnicas e objetivas aqui comentadas, pois, ao ignorar essas questões, o profissional desrespeita o Código de Ética Médica e fica vulnerável aos rigores e punições previstos em lei.

Texto de Raimundo Pinheiro – médico, bacharel em Direito e conselheiro do Conselho Regional de Medicina do Estado da Bahia (Cremeb) – originalmente publicado pelo CFM.

Fonte: SaúdeJur