Número representa um terço das crianças e jovens que morrem por ano no país. “Portugal está no nível zero, a par de África, da Ásia e da América do Sul ocidental”, diz a pediatra Ana Lacerda.
Todos os anos morrem em Portugal cerca de 600 crianças e jovens, cerca de 200 necessitariam de cuidados paliativos mas morrem sem os receber, afirma a pediatra Ana Lacerda, da Comissão de Cuidados Continuados e Paliativos da Sociedade Portuguesa de Pediatria. Este será um dos temas debatidos no VII Congresso Nacional de Cuidados Paliativos que decorre nesta quinta e sexta-feira no Algarve.
Quando se fala de paliativos pensa-se erradamente que apenas dizem respeito “a cuidados em final de vida”, a situações “agónicas” em que a morte é inevitável e iminente, e essa é uma noção incorrecta, esclarece, desde logo, a médica.
A prestação de cuidados paliativos, tal como os define a Organização Mundial de Saúde (OMS), engloba, por exemplo, a medicação para o controlo de sintomas, desde fármacos para a dor, para o controlo de espasmos e vómitos, mas também apoio psicológico à crianças e suas família, incluindo os irmãos da criança doente, “que muitas vezes são esquecidos”. Passa “por encaminhar as pessoas para os apoios sociais e financeiros que existem para os seus casos e que as pessoas muitas vezes desconhecem”. Nos casos “mais dramáticos” os cuidados paliativos passam também “pelo apoio no luto, no apoio à família pós-morte”, nota.
Ana Lacerda, que é pediatra no Instituto Português de Oncologia de Lisboa, diz que não se está a dizer que estas crianças não recebem cuidados de saúde adequados, o que se está a dizer é que não recebem cuidados paliativos, com tudo o que isso implica. E, a este nível, Portugal é “na Europa desenvolvida” o mais atrasado. De acordo com um mapa da OMS divulgado em Janeiro deste ano, “Portugal está no nível zero em termos de provisão de cuidados paliativos pediátricos, a par de África, da Ásia e da América do Sul ocidental”.
Seis mil precisam de cuidados
Estima-se que existam cerca de seis mil crianças e jovens (até aos 18 anos) que precisam de cuidados paliativos e este grupo inclui uma pequena minoria que irá morrer e que precisa de cuidados em fim de vida, mas a maioria destes cuidados destina-se “a crianças que não vão melhorar da sua doença mas que podem ter a sua qualidade de vida muito melhorada”, se forem devidamente acompanhadas. A médica refere, por exemplo, o caso de crianças que sofrem de paralisia cerebral, de doenças metabólicas, epilepsia grave, que têm cancro mas que vão superar a doença (a taxa de sobrevivência em idades pediátricas ronda os 75%).
Das seis mil crianças que necessitariam de cuidados paliativos, 200 acabam por morrer sem receberem os cuidados paliativos de que necessitariam. Este grupo representa um terço das cerca de 600 crianças e jovens que morrem todos os anos, o que inclui também as mortes por causa acidental.
No grupo das 200 que acabam por morrer a causa de morte é sobretudo o cancro, doenças cardiovasculares (nomeadamente patologias cardíacas congénitas) e doenças neuromusculares, explica a médica.
A médica refere haver experiências pontuais no IPO de Lisboa, que tem uma equipa intra-hospitalar, que faz acompanhamento de crianças desde o diagnóstico até à cura ou à morte da criança; no IPO do Porto existem equipas de apoio domiciliário, mas que estão mais vocacionadas para questões como o acompanhamento na ventilação, a manutenção de cateteres, questões nutricionais e “não têm uma visão holística. Estas nossas experiências não são reconhecidas como cuidados paliativos”, de acordo com os critérios da OMS, sublinha.
Serviços distantes
Os poucos cuidados existentes nesta área estão centralizados em hospitais centrais que ficam muitas vezes a 200 e 300 quilómetros da residência da criança, diz. “Devia ser incentivada a colaboração com médicos de família, nos centros de saúde, e hospitais distritais”. As crianças não são, porém, as únicas afectadas pela inexistência de cuidados paliativos. No Serviço Nacional de Saúde, apenas 10% dos doentes são referenciados, segundo a Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos (APCP). “Cerca de 90% da população que precisa de cuidados paliativos em Portugal não os recebe”, aponta a APCP.
Fonte: www.publico.pt
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- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.