Empresa californiana estaria violando leis federais
A FDA, agência de vigilância sanitária dos EUA, ordenou hoje a empresa de exames genéticos 23andMe que suspendesse a venda de seus kits para testes personalizados de DNA, afirmando que a companhia falhou em provar que a tecnologia tem respaldo científico.
Em uma carta de advertência publicada na internet, autoridades do FDA afirma que a empresa californiana está violando leis federais, pois alega que seus produtos são capazes de identificar o risco associado a mais de 250 doenças e problemas de saúde.
Apenas testes médicos que já tenham recebido autorização do FDA pode fazer tais alegações.
A carta é mais um capítulo de um longo histórico de escaramuça entre o governo e a 23andMe, que teve investimentos do Google. A empresa é hoje a marca mais conhecida entre uma série de startups que vendem informação genética pessoal. A proliferação de testes genéticos direcionados ao mercado consumidor incomodou muitas autoridades de saúde pública e médicos, que temem que muitos produtos tenham sido desenvolvidos com uma ciência questionável.
Há vários anos, a 23andMe tem resistido à regulamentação governamental, argumentando que fornece apenas informação, e não serviços médicos, a seus consumidores. Mas no ano passado a empresa aparentemente mudou de estratégia, submetendo para avaliação vários de seus testes para doenças específicas incluídos no kit.
Uma assessora de imprensa da empresa, sediada em Mountain View (Califórnia, EUA) reconhece que a companhia ``não cumpriu as expectativas da FDA`` sobre questionamentos a respeito da submissão.
``Nosso relacionamento com a FDA é extremamente importante e estamos comprometidos em trabalhar com eles para tratar de suas preocupações``, afirmou Kendra Cassillo em uma nota.
A carta do FDA sugere que o órgão regulador teve enorme dedicação em tentar dialogar com a empresa. Os reguladores mencionam até mesmo que houve ``mais de 14 reuniões cara-a-cara e por teleconferência, trocas de centenas de e-mails e dúzias de mensagens por escrito``.
``Contudo, apesar dessas muitas interações com a 23andMe, ainda não temos segurança alguma de que a empresa validou clinicamente ou analiticamente`` a sua tecnologia, afirma a carta.
ALEGAÇÕES EXTRAORDINÁRIAS
O aviso da FDA questiona uma série de alegações que a companhia faz sobre seu teste baseado em amostras de saliva, particularmente ao chamá-lo de ``um primeiro passo na prevenção`` contra doenças como diabetes, cardiopatias e câncer de mama. Reguladores dizem estar preocupados com eventuais falsos resultados levem os pacientes receber tratamento médico inadequado ou cuidados inapropriados.
A 23andMe afirma, por exemplo, que seu teste pode identificar mulheres portadoras de mutações no gene BRCA, que aumenta significativamente o risco de cânceres de ovário e mama. Mas um resultado equivocado pode levar mulheres passarem por triagem, quimioterapia e cirurgias desnecessários. O teste também alega predizer quais pacientes vão reagir bem a remédios populares como o anticoagulante varfarina. A FDA alerta que uma leitura inadequada pode resultar em ``risco significativamente acima do aceitável para doenças, ferimentos ou morte do paciente`` que não receber a dose apropriada da droga.
Uma das fundadoras 23andMe é Anne Wojcicki, ex-mulher de Sergey Brin, um dos criadores do Google, que investiu milhões de dólares na empresa ao longo dos anos.
OUTRO LADO
Diretores da 23andMe haviam dito anteriormente que tinham contatado a FDA em 2007, antes de lançarem seus produtos. A agência não tinha se interessado em avaliar a tecnologia até 2010, quando enviou cartas a diversas empresas de testes, afirmando que seus produtos eram considerados dispositivos médicos e precisavam comprovar segurança e eficácia.
O FDA já regulamenta vários testes genéticos administrados por hospitais e consultórios médicos, como aqueles dados a grávidas para detectar fibrose cística em fetos. A preocupação do FDA com a 23andMe parece estar centrada em sua abordagem comercial, que faz uso de parcerias com médicos e profissionais de saúde.
Consumidores encomendam os produtos da empresa pela internet. Quando o kit chega por correio, usuários são instruídos a cuspir num pequeno tubo, fornecendo uma amostra de saliva que é enviada de volta à empresa para análise. A 23andMe afirma que o DNA do consumidor e analisado para determinar sua propensão a desenvolver várias doenças e sua reação a diversas drogas. O teste também alega fornecer informação sobre ancestralidade, apesar de esse tipo de informação não ser regulamentado pela FDA.
Fonte: Folha de S.Paulo
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- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.