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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

TRF-3ª - União deve fornecer medicamento não registrado na Anvisa com verba de publicidade

TRF3 confirma entendimento da 2ª Vara Federal de Guarulhos; decisão beneficia portadora de doença genética grave e rara

A Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) confirmou decisão da 2ª Vara Federal em Guarulhos/SP que determinou à União fornecer a uma mulher o medicamento importado Soliris, que não tem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A decisão do juiz federal de Guarulhos, Paulo Marcos Rodrigues de Almeida, também havia proibido a União de utilizar verbas do orçamento da Saúde para a aquisição do medicamento, que deve ser adquirido com verbas destinadas à veiculação da publicidade oficial.

A autora da ação afirma ser portadora de uma grave e rara doença genética chamada “hemoglobinúria paroxística noturna” (HPN), que destrói os glóbulos vermelhos e provoca anemias, tromboses, doença renal crônica, hipertensão pulmonar, dispneia e dores torácicas e abdominais. Sem melhora com os tratamentos tradicionais, ela ajuizou a ação solicitando o medicamento Soliris (Eculizumabe), importado e sem registro, que, segundo ela, pode melhorar sua qualidade de vida e aumentar sua expectativa de vida.

Na liminar, o juiz federal relatou que a petição inicial apresentou estudos e relatórios que apontam a eficácia superior do medicamento Soliris em relação aos tratamentos tradicionais e indica o fato de o remédio já ter sido autorizado pela FDA e EMA, órgãos de segurança sanitária dos Estados Unidos e da Europa. Por disso, entendeu ser um caso excepcional, em que o Poder Judiciário pode determinar o fornecimento de um medicamento importado não registrado na Anvisa.

Como os recursos orçamentários vinculados à saúde são finitos, ele também tratou do problema que provocaria a determinação de fornecimento pelo governo de um medicamento caro para um único paciente, em prejuízo da coletividade de usuários do Sistema Único de Saúde (SUS). Para o juiz federal, a saúde e a educação foram eleitas pela Constituição Federal como prioridades da nação e é possível que orçamento destinado a outras áreas não prioritárias seja para lá realocado.

Segundo o magistrado, não é razoável que o Estado se negue a fornecer medicamentos sob a justificativa de carência de recursos quando “segue veiculando regularmente na TV, internet e jornais impressos anúncios publicitários desvestidos de qualquer caráter educativo, informativo ou de orientação social, voltados à mera exaltação das iniciativas do Governo”.

Após a decisão, a União ingressou recurso no TRF3 alegando não ser possível o fornecimento da medicação por se tratar de remédio não registrado na Anvisa, além de ser inadequado ao tratamento devido aos potenciais riscos e efeitos colaterais, além do seu altíssimo custo.

Acórdão do TRF3

Analisando o recurso da União, o relator do caso no TRF3, desembargador federal Johonsom di Salvo, observou que cabe ao poder público obrigatoriamente a garantia da saúde mediante a execução de política de prevenção e assistência à saúde, com a disponibilização dos serviços públicos de atendimento à população. Segundo a Constituição, explica o relator, essa prestação cabe ao Poder Executivo.

“A responsabilidade pelo fornecimento do medicamento de que necessita a autora decorre do direito fundamental dela à vida e a uma existência digna, do qual um dos apanágios é a saúde, cuja preservação também é atribuída aos poderes públicos executivos da União, dos Estados e dos Municípios, todos eles solidários nessa obrigação”, disse o desembargador federal.

Além da disponibilização por parte dos entes públicos de hospitais, médicos e enfermeiros, o magistrado entende que o acesso à saúde compreende também procedimentos clínicos, ambulatoriais e medicação conveniente. “Pouco importa se eles estão ou não disponibilizados em algum programa específico dos órgãos governamentais, já que a burocracia criada por governantes não pode privar o cidadão do mínimo necessário para a sua sobrevivência quando ele mais necessita: quando está efetivamente doente”, completou.

Di Salvo também afastou a alegação da União de que o Poder Judiciário extrapola suas funções e atua como co-gestor do Poder Executivo ao determinar o fornecimento de remédios. Segundo ele, o Judiciário está apenas determinando o cumprimento das regras constitucionais que “asseguram o direito maior que é a vida, está assegurando o respeito que cada cidadão merece dos detentores temporários do Poder Público, está fazendo recordar a verdade sublime que o Estado existe para o cidadão, e não o contrário”.

O relator destacou ainda a Lei nº 8.080/90, que diz ser competência do SUS a “assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica”. Contudo, ele explicou que a compra de medicamentos toma por base a Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename), uma relação de remédios básicos criada pelo Ministério da Saúde que é "dificilmente atualizada".

“Os limites enunciativos dessa Rename e os supostos limites orçamentários do Poder Público (de difícil justificativa quando se sabe que há verbas públicas destinadas a propaganda da "excelência" do Governo de ocasião) não podem ser manejados se colidem diretamente contra o direito à vida, contra o direito social de integralidade do acesso à saúde e contra a essencial dignidade da pessoa humana”, decidiu.

“Ressalto que a saúde - como direito fundamental - está acima do dinheiro, embora assim não entendam os governantes; mas eles não podem se opor à Constituição na ótica vesga com que enxergam as prioridades que o Estado deve observar no trato dos interesses dos cidadãos e na busca do bem comum. O direito a saúde é indisponível”, completou o desembargador federal Johonsom di Salvo

Agravo de Instrumento nº 0026209-59.2015.4.03.0000/SP

Fonte: Tribunal Regional Federal da 3ª Região