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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

quarta-feira, 25 de maio de 2016

Averiguação de paternidade deixará de existir em caso de dador anónimo

PORTUGAL

Situação vai mudar com a legalização do acesso a técnicas de procriação medicamente assistida a mulheres sem parceiro masculino. Há quem não concorde.

Porque em Portugal é proibido haver filhos de pai incógnito, Cristina Nunes já sabia que, depois de Ana nascer, ia ser chamada ao tribunal. De acordo com a legislação anterior, o Ministério Público abre automaticamente um processo de averiguação da paternidade às mulheres que registem os seus filhos sem nome do pai. Ao Tribunal de Menores de Cascais, Cristina disse que não sabe quem é o pai da sua filha nem pode saber, uma vez que a sua gravidez tinha resultado da dádiva de esperma de um dador anónimo e que a lei espanhola não permite a sua identificação. “O processo foi arquivado”. Tinha Ana três meses. No primeiro cartão do cidadão da filha estava o seu nome e um “X”, agora com a sua renovação surge apenas o nome da mãe, explica esta programadora informática de 38 anos.

Com a legalização do acesso a técnicas de procriação medicamente assistida a mulheres sem parceiro masculino, este procedimento legal vai deixar de existir, refere o projecto de lei aprovado pelo Parlamento, na sua versão mais recente: “Se apenas teve lugar o consentimento da pessoa submetida a técnica de PMA, lavra-se apenas o registo de nascimento com a sua parentalidade estabelecida, sem necessidade de ulterior processo oficioso de averiguação”, lê-se.

O presidente do Centro de Direito Biomédico da Universidade de Coimbra, André Dias Pereira, diz que esta legislação vem criar uma excepção àquela que é, desde há cerca de 40 anos, uma regra introduzida no Código Civil: a ideia de que não podem existir “filhos de pai incógnito”. “Em nome do interesse da mulher, fica em causa o interesse da criança em ter um pai, ou pelo menos em saber quem ele é.”

O jurista e professor de Direito da Família diz que a regra de que não existem “filhos de pai incógnito” foi “um sucesso”, já que o número de pessoas com menos de 40 anos que não sabem quem foi o pai diminuiu muito face ao período anterior a esta regra. “A lei diz que é importante [saber quem é o pai], aqui diz-se que não é importante, só se a mãe quiser. Estamos a dizer que, só nestes casos, isso já não interessa”, lembrando que tem havido muitas lutas no Tribunal Constitucional quanto ao direito de a pessoa, mesmo com 60-80 anos, “conhecer o pai”.

A lei portuguesa prevê que se possa tentar saber quem é o pai na justiça até aos 28 anos, ou, no caso de haver factos novos, três anos depois de estes terem surgido, explica. “Vai ser um problema com estas crianças”, diz. E aqui coloca-se a questão do anonimato do dador, que a nova legislação não altera. Não é possível conhecer a sua identidade.

Cristina Nunes conhece o caso holandês. Sabe que na Holanda houve uma evolução, primeiro começou como Portugal, o dador de esperma é sempre anónimo, depois “começou a haver uma procura de saber, por parte de pessoas que nasceram nestas circunstâncias”, e o regime foi alterado, e agora estes filhos podem saber quem foi o dador.

“Eu pessoalmente prefiro o anonimato, mas não é uma coisa que me envolva a mim directamente. Não sei o que seria melhor. Espero que não haja nessa necessidade de saber”, diz Cristina Nunes, que é lésbica e teve a filha não tendo parceira.

Já Teresa Ramalho, que foi a Espanha engravidar há quatro anos e teve gémeos, anda a treinar os filhos, na rua, a estarem atentos a novas formas de família não tradicionais, mas admite que eles possam vir a ficar curiosos. “Tenho noção que para eles vai ser estranho e vão querer preencher o vazio”. Preferia que eles não quisessem saber nada, mas essa é uma opção deles e Teresa Ramalho admite que seria interessante que a lei portuguesa lhes permitisse satisfazer essa curiosidade aos 18 anos.

A lei nacional refere que a dádiva de terceiros (quer de esperma, de ovócitos ou de embriões) é anónima, prevê apenas duas excepções. Se houver suspeita de duas pessoas poderem ser irmãos, e isso ser motivo de impedimento para um casamento, é possível colocar essa pergunta ao Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida (CNPMA). A outra excepção prevista é para pedir dados genéticos do dador, por exemplo, sobre questões de saúde que possam ser importantes. Esta questão nunca foi colocada.

Apenas duas pessoas no país, o presidente e o vice-presidente do CNPMA, têm acesso a essa informação. E é preciso que os dois insiram, ao mesmo tempo, duas palavras-chave numa plataforma, o Registo de dadores, beneficiários e crianças nascidas com recurso a dádiva de terceiros, que apenas existe desde Janeiro de 2013.

Mas, caso a pessoa queira mesmo saber o nome do seu dador, terá em princípio de avançar com um processo para tribunal alegando “razões ponderosas” e de ver confirmado o seu pedido por uma sentença judicial. O CNPMA não tem conhecimento de nenhum caso desta natureza.

Fonte: PUBLICO.pt