Para o TJ, o hospital é sim responsável solidariamente pelo erro do médico, que deixou o paciente incapaz de exercer sua profissão
Dois erros em procedimentos cirúrgicos vão custar ao Hospital de Base de Rio Preto R$ 35 mil de indenização por danos morais mais pensão de dois salários mínimos, até que o soldador Daniel Bispo Clemente complete 65 anos. A decisão é do Tribunal de Justiça e foi publicada anteontem. O acórdão assinado pelo desembargador Mathias Coltro reforma a sentença de primeira instância que havia julgado o pedido de indenização improcedente em agosto do ano passado. Para o TJ, o hospital é sim responsável solidariamente pelo erro do médico, que deixou o paciente incapaz de exercer sua profissão.
“A indenização também é devida, até e porque incontestáveis os sofrimentos porque passou e passa o autor, como constatado pelo perito, o qual, inclusive afirmou que o demandante apresenta autoestima severamente rebaixada”, afirma o desembargador. A sentença tem 30 páginas e está disponível na internet.
Ontem, o advogado do paciente, Marcos Cezar Chagas Perez, disse que ainda não foi notificado da decisão, mas não deve entrar com recurso. “Independente do valor, a Justiça reparou um sério dano causado a ele (Bispo). Ainda não analisei o teor, mas não devemos recorrer. Nos próximos dias veremos isso”, afirmou.
Erros em dobro
Bispo foi vítima de dois erros médicos, em duas cirurgias diferentes. A saga do paciente começou quando em 98, após sentir fortes dores abdominais, ele foi diagnosticado com hérnia inguinal do lado direito. O tratamento convencional não deu certo e, em junho de 2000, ele foi submetido à primeira intervenção. “O médico, ao invés de realizar o procedimento apenas do lado direito, acabou por operar também o lado esquerdo do abdome. Por conta da cirurgia, ficou o demandante inapto para o trabalho e para as atividades cotidianas, além de terem se intensificado as dores”, afirma o desembargador na sentença.
Comprovação
As sucessivas dores do lado esquerdo do corpo submeteram o soldador a inúmeros exames e dois anos depois ficou constatado o erro médico e ele voltou à mesa de cirurgia para correção. Em 2004, as dores aumentaram e novos exames mostraram que Bispo também tinha uma hérnia de disco na região lombar. O diagnóstico sugeriu nova cirurgia, que foi realizada. E novamente médicos erraram no procedimento: tiraram fibra óssea em excesso deixando sequelas na coluna do paciente.
Segundo seu advogado, Bispo sofreu por nove anos além de ficar impedido de exercer a profissão de soldados até em 2007 decidir entrar na Justiça contra o hospital. De lá para cá, foram mais sete anos esperando uma decisão. Inicialmente, eles pediam R$ 190 mil de indenização, mas o valor foi negado.
“Fica provido parcialmente o apelo do autor, para condenar a fundação-ré ao pagamento de pensão mensal no valor de 2 salários mínimos, desde a data da citação até que o autor complete 65 anos de idade, incidindo juros de mora e correção monetária, a partir da citação, bem como ao pagamento de indenização pelos danos morais, no valor de R$ 35.000, com juros de mora desde o evento danoso”, determina o acórdão.
Inclusão na folha de pagamento
Após a primeira cirurgia e detectado o erro médico, Bispo foi submetido a tratamento e, depois de um acordo feito durante o andamento do processo, recebeu dois salários mínimos mensais de ajuda de custo. O benefício foi cessado após a sentença de primeira instância assinada pelo juiz Flavio Dassi Viana, que negou a indenização e ainda condenou o paciente a pagar R$ 3 mil de honorários aos advogados do hospital - decisão também anulada pelo TJ.
Agora, no acórdão, o desembargador determinou que o paciente seja incluso na folha de pagamento do hospital para evitar inadimplência e atrasos. “Nos termos do permissivo do artigo 475-Q, § 2º do Código de Processo Civil razoável determinar-se à ré a inclusão do autor em sua folha de pagamento”, afirma.
O Diário tentou ontem contato com Bispo durante todo dia, mas ele não atendeu o celular. Segundo seu advogado, o soldador ainda sofre com as sequelas das cirurgias mal sucedidas e não conseguiu trabalhar. Já a assessoria da Funfarme, fundação mantenedora do HB, informou por e-mail que vai entrar com recurso contra o acórdão.
Fonte: Diário Web
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- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.