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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico, Odontológico e da Saúde (FMRP-USP). Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado do curso de Bioética e Biodireito do HCor. Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Medicamentos estão em falta na Farmácia de Alto Custo da rede pública

Com isso, todos os dias, pacientes voltam para casa mais doentes e de mãos vazias

O aposentado José Antônio da Silva, 64 anos, tem um filho de 33 anos que sofre de esquizofrenia. “Meu filho fica louco, quer brigar com todo mundo. Ele ouve vozes.” O descontrole do filho só acontece quando ele não é medicado. Mensalmente, ele consome três caixas de Clozapina, de 100mg. O gasto total supera R$ 500. José recorre à Farmácia de Alto Custo da Secretaria de Saúde, mas há mais de 90 dias não consegue receber gratuitamente o remédio. O caso de José é apenas um entre milhares de cidadãos que convivem diariamente com a falta de remédios de valor excepcional na rede púbica de saúde.

“Eu me sinto enganado, desamparado. A gente vê o dinheiro do povo sendo roubado por políticos e, enquanto isso, a saúde está abandonada”, observa o aposentado. A preocupação de José não se limita à falta de remédio. Em 30 de abril, a autorização para o recebimento dos comprimidos, válida por três meses, venceu. Novamente, José terá de enfrentar a burocracia na Diretoria de Procedimentos de Alta Complexidade (Dipac), responsável por cadastrar usuários, emitir e renovar as permissões de retirada de medicamentos excepcionais. “Fico pensando nas pessoas que têm problemas piores ou que usam remédios ainda mais caros”, lamenta.

É o caso de Luiza Marques Timbó, 53 anos. Ela se desdobra para impedir que o filho, Renan Timbó da Silva, 22, fique sem as ampolas de 40mg do composto Adalimumabe, indispensável para a estabilidade do aparelho digestivo atingido pela doença de Crohn. Renan precisa injetar o remédio uma vez por semana. Uma caixa com duas ampolas custa R$ 7.740. Em abril, Luiza recebeu a notícia de que o medicamento estava em falta. Por participar de um grupo de familiares de pacientes da doença de Crohn do Hospital Universitário de Brasília (HUB), ela conseguiu duas doses de Adalimumabe com outro paciente, suficientes para 15 dias. Quando o remédio acabar, Renan estará suscetível a novas crises — sangramentos, diarreia, perda de peso, náuseas e mal-estar são alguns dos sintomas. “A minha preocupação é: quando acabarem essas ampolas, onde eu vou conseguir mais? É um desespero total.”

Luiza foi à luta. Como não obteve informações na Farmácia de Alto Custo, procurou a Secretaria de Saúde e depois o Setor de Compras de Alta Complexidade. Descobriu que já houve licitação para a aquisição do Humira, nome fantasia do composto, mas entraves burocráticos impedem que o remédio chegue à farmácia. Para Luiza, o problema é a falta de organização e de controle de estoque. “Fico muito decepcionada. Eles têm tudo registrado. Sabem exatamente a quantidade de usuários e como o medicamento é importante. É um descaso total com quem precisa.” Ela está com a papelada pronta para entrar na Justiça com ajuda do Núcleo de Saúde da Defensoria Pública do DF (leia ao lado).

Drama semelhante vive Jorge Luiz de Jesus Monteiro, 41 anos, aposentado por problemas renais crônicos. É comum pacientes renais apresentarem anemia, que é combatida com uma aplicação quinzenal de sacarato hidróxido férrico. As ampolas, que custam mais de R$ 700 a unidade, não chegam às mãos de Jorge há dois meses. “Para mim, já é um sacrifício vir aqui e quando chego é sempre assim. Venho no dia em que me falam que terá estoque e nada”, diz.

Antonio Ferreira dos Santos, 40 anos, padece da mesma doença de Jorge. Se a anemia do renal crônico não for tratada e aparecer uma oportunidade de transplante de rim, Antonio pode até ser preterido por outro candidato. “Não sei se é falta de respeito ou de interesse, mas estão nos tirando um direito constitucional. A vida da gente já está constantemente no limite”, critica.

Meio comprimido
A auxiliar administrativa Elma Borges, 57 anos, sofre pela filha. A jovem de 19 anos tem um tumor na hipófise, glândula localizada no centro do crânio, e precisa tomar diariamente — e para o resto da vida — um comprimido de 0,5mg de cabergolina para conter o tumor. A jovem está há mais de duas semanas sem a medicação porque não há estoque na Farmácia de Alto Custo. “Vim aqui no início de abril e me disseram que só chegaria no fim do mês. Imaginando o pior, nos últimos dias rachei o comprimido, diminuindo a dosagem, só para garantir que ela não ficasse sem o remédio muito tempo”, conta. A caixa do medicamento custa mais de R$ 1 mil, longe de se encaixar no orçamento de Elma.

A ausência de remédios para colesterol e osteoporose afeta milhares de pessoas já que os problemas são de alta incidência. Pílulas de raloxifeno e artovastatina, usadas no controle do colesterol, desaparecem em um sopro das prateleiras. Há três meses, a aposentada Eldi Martins, 77 anos, não consegue retirar o remédio. Ganhando um salário mínimo e tomando outros remédios, ela não dá conta de bancar mais uma receita. “As autoridades têm que fazer o é responsabilidade delas. É sempre o pobre que sofre.”

O Correio procurou a Secretaria de Saúde. Mas o órgão não divulgou os valores gastos com a Farmácia de Alto Custo nem forneceu a lista completa dos remédios em falta, assim como o total de beneficiados. Por meio de nota, afirmou apenas que em 16 de abril comprou emergencialmente 63 tipos de remédios, incluindo alguns de alto custo. A pasta não informou, porém, o nome dos medicamentos nem a quantidade comprada. “A aquisição emergencial tem como objetivo regularizar os estoques em todos os hospitais e centros de saúde do DF por, pelo menos, seis meses”, informa a nota.

NOVA SEDE
» A Farmácia de Alto Custo ganhará nova sede. A previsão é que a partir de 10 de maio, o atendimento será feito na estação do Metro da 102 Sul. Atualmente, a farmácia funciona em frente à emergência do Hospital de Base, de segunda a sexta-feira, das 9 às 17h. Os telefones de contato são 3322-5585 e 3323-7011.

A quem recorrer
O Núcleo de Saúde da Defensoria Pública do Distrito Federal pode ajudar os cidadãos que sofrem com a falta de remédios na rede pública de saúde. “Trabalhamos justamente para que os pacientes recebam o devido amparo médico”, explica o defensor Celestino Chupel. Segundo ele, uma vez reunida a documentação necessária — como laudos, exames e prescrições médicas — o processo é bastante ágil e as liminares são concedidas no mesmo dia da entrada da ação.

“Os juizes têm sido muito sensíveis às causas médicas. Geralmente, as decisões são favoráveis aos pacientes”, afirma o defensor. Uma vez batido o martelo em prol dos reclamantes, a Secretaria de Saúde tem 24 horas para realizar a compra emergencial. Caso a ordem não seja cumprida, a Defensoria é acionada novamente para notificar o juiz que a determinação não foi cumprida.

Luiza Marques Timbó, 53 anos, está juntando os documentos para procurar a ajuda dos defensores públicos na tentativa de garantir para o filho o medicamento Humira, do composto adalimubabe, usado no combate à doença de Crohn, que ataca o intestino. “De todos os remédios que ele já tomou, esse foi o que deu melhores resultados. Temos que ir à luta, não podemos desanimar”, diz. Uma ampola pode custar quase R$ 4 mil.

Ajuda
O Núcleo de Saúde da Defensoria funciona de segunda a sexta-feira, das 9h às 19h, no Setor Comercial Sul, Quadra 4, Edifício Zarife, 2º andar, das 9 às 18h. Dúvidas podem ser tiradas pelos telefones 3223-0294 e 3905-6691.

Resposta do governo
A Secretaria de Saúde não divulgou todos os medicamentos em falta na Farmácia de Alto Custo. Veja a justificativa apresentada pelo órgão para alguns dos remédios não disponíveis:

Atorvastatina 10 ml e 20 ml
O remédio utilizado no combate ao colesterol alto aguarda parecer jurídico da Procuradoria-Geral do DF.

Nas farmácias, a caixa com quatro comprimidos custa entre R$ 50 e R$ 70.

Hidróxido Férrico
Cada ampola usada para o tratamento de anemia custa R$ 700. A compra está em fase de negociação com a empresa ganhadora do processo de licitação.

Clozapina 100 ml
Está em processo de compra por meio de processo de licitação. O preço da caixa de 30 comprimidos: R$ 178.

Adalimumabe
A caixa com duas ampolas do medicamento — prescrito para portadores da doença de Crohn (que ataca o intestino) — custa R$ 7.740. Está em fase de licitação, mas aguarda parecer da Procuradoria-Geral do DF.

Fonte: Correio Braziliense