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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

terça-feira, 8 de maio de 2012

Parecer CFM nº 7/2012 - Gestação de substituição ("barriga de aluguel")

PROCESSO-CONSULTA CFM nº 8.036/11 – PARECER CFM nº 7/12

INTERESSADO: CRM-PE

ASSUNTO: Fertilização in vitro – Gestação de substituição

RELATOR: Cons. José Hiran da Silva Gallo

EMENTA: A doação temporária do útero está claramente aceita em circunstâncias específicas. No caso de gestações anteriores findas por cesarianas, o risco de ruptura uterina está aumentado em vista da cicatriz fibrótica, inelástica, sobre o órgão muscular, fato que amplia tal possibilidade.

A presidente do Cremepe encaminha cópia de documentação recebida pelo Conselho Regional para emissão de parecer acerca de fecundação artificial “in vitro”, bem como cópia do parecer emitido pela Câmara Técnica de Ginecologia e Obstetrícia e câmara temática de Bioética (fl. 2).

Os membros das câmaras acima citadas respondem ao mandado de intimação encaminhado pelo juiz de Direito da 7ª Vara de Família e Registro Civil da Capital e alegam os seguintes considerandos:

a) O ciclo gravídico puerperal, apesar de grandes avanços na assistência à gestação e ao parto, é um evento com riscos e efeitos (físicos, emocionais e sociais, de curto, médio e longo prazo para a saúde da mulher, inclusive risco de morte materna);

b) Dentre as muitas definições sobre a Bioética podemos considerá-la como sendo a procura da melhor resposta possível para um desafio ético em determinado contexto (como é o presente caso), não existindo respostas óbvias ou padronizadas;

c) Conceitos éticos e bioéticos hegemônicos variam de tempos em tempos e de cultura para cultura, inclusive os relativos a “paternidade/maternidade biológica”;

d) Do ponto de vista da autonomia bioética estamos diante de uma situação assimétrica;

e) A idade da gestante sub-rogada, aliada à sua história obstétrica (dois partos cesarianos), não é a ideal para uma gravidez múltipla;

f) A gestante sub-rogada possui dois filhos menores de idade;

g) As “trocas” existentes entre o feto e a gestante são mais intensas do que antes se imaginava. Diante disso, o Cremepe, considerando a Resolução CFM nº 1.957/10, se posiciona no caso em análise concordando com a autorização de gestação de substituição (doação temporária do útero), mas recomenda fortemente:
1. Que os filhos da gestante sub-rogada, de forma tecnicamente adequada, tenham conhecimento do procedimento (antes da realização do mesmo e que de alguma maneira sejam consultados);
2. Que exista um acompanhamento emocional profissional mínimo para ambos os filhos da gestante sub-rogada, que também deve ser iniciado antes do procedimento;
3. Que sejam transferidos apenas dois pré-embriões (para diminuir o risco de uma gestação múltipla) e que seja obtido um termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE), por escrito, dos requerentes E.H.L.D.Á e M.B.P. Neste termo deverá constar que, em uma gestação em útero duplamente cesariado, o risco de rotura uterina está aumentado. Toda gestação possui riscos físicos emocionais e sociais de curto, médio e longo prazo, inclusive morte materna; no caso de gestação múltipla, todos os riscos de curto, médio e longo prazo estão aumentados. Como o vínculo entre o feto e a gestante é intenso, existe risco de arrependimento e, por esse motivo, o CFM entendeu que nos casos de doação temporária do útero deve existir uma relação familiar que permita maior convivência entre as partes.

Entendem os membros das comissões consultadas que deva ser garantida à gestante sub-rogada a assistência à saúde quanto à possibilidade de sequelas (fls. 3 e 4).

Segue-se exame ultrassonográfico da região pélvica da possível doadora temporária do útero, de características normais (fls. 5 e 6).

Documentação judicial onde o casal solicita autorização para fertilização in vitro e utilização de útero doado temporariamente da sra. D.M.B.S.

Documentações relativas a existência de sanidade física e mental da sra. D.M.B.S., possível doadora temporária do útero, bem como exame ultrassonográfico mostrando útero hipoplásico e formação anecoica esquerda levemente lobulada e discretamente heterogênea, sem fluxo ao Doppler colorido com volume estimado em 30,1ml (fls. 5 a 53).

Documentação judicial e notarial.

Sobre a gestação de substituição (doação temporária do útero), o anexo único da Resolução CFM nº 1.957/10 textualiza em seu item VII:

VII- As clínicas, centros ou serviços de reprodução humana podem usar técnicas de RA para criarem a situação identificada como gestação de substituição, desde que exista um problema médico que impeça ou contraindique a gestação na doadora genética.

1- As doadoras temporárias do útero devem pertencer à família da doadora genética, num parentesco até o segundo grau, sendo os demais casos sujeitos à autorização do Conselho Regional de Medicina.

2- A doação temporária do útero não poderá ter caráter lucrativo ou comercial.

Seguem-se pareceres de conselheiros a respeito de casos específicos.

COMENTÁRIOS
Nos casos de reprodução assistida se indica a tentativa de fertilização com mais de um embrião, para aumentar a possibilidade de êxito de conseguir uma gestação que progrida. Não raro, a tentativa de fertilização não surte efeito. Ao longo do tempo, com a evolução científica, estão se tornando cada vez maiores as possibilidades de que se consiga levar uma gestação a termo.

Indica-se, então, a introdução de dois embriões, com boa chance de resultado satisfatório.

Há que se considerar, entretanto, o fato de a candidata a doadora temporária do útero ser paciente com história de duas gestações anteriores findas em cesariana.

Cabem então algumas considerações: o útero não grávido tem peso em torno de 70g e pode ser caracterizado por três partes: corpo, istmo e colo. Ao fim da gestação, pesa em torno de 1500g, o que significa que sofre enorme hipertrofia e hiperplasia. A região do istmo, virtual, chega a medir 12cm. Nesta região, agora chamada de segmento inferior, se abre o útero nas cesarianas.

Sabemos que o útero é um órgão muscular que se caracteriza pela elasticidade.

No caso de uma cicatriz sobre o mesmo, esta tem características fibróticas, o que faz com que perca elasticidade. Por esse motivo, é habitual indicar a esterilização na terceira cesariana, decisão essa não comprovada como absolutamente indispensável.

Decorre de um princípio de cautela. É prática, nesta ocasião, ser feita fora de trabalho de parto, por ser este momento em que o segmento inferior mais se distende, podendo inclusive romper, causando até mesmo a morte.

Na circunstância em avaliação está se indicando a colocação de dois embriões, podendo ocorrer falha na intenção gestacional, implantação e evolução de um embrião ou dois. Neste caso existe sobre distensão uterina, o que aumenta o risco da ruptura uterina. Se aceito o risco, torna-se indicada a interrupção da prenhe quando alcançada uma prematuridade viável, fato que no caso não nos diz respeito, pois a solicitação depende de decisão judicial.

Este é o parecer, SMJ.
Brasília, 10 de fevereiro de 2012
JOSÉ HIRAN DA SILVA GALLO
Conselheiro relator

Fonte: CFM