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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico, Odontológico e da Saúde (FMRP-USP). Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado do curso de Bioética e Biodireito do HCor. Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Superdosagem: Técnico de enfermagem presta esclarecimentos no Coren

O presidente do Coren, Wellington Antônio da Silva, informou que abriu um processo ético para apurar a responsabilidade dos profissionais

O técnico em enfermagem do Hospital Materno Infantil de Brasília (Hmib), responsável pela aplicação de adrenalina em Rafaela Luiza Formiga de Morais, esteve ontem no Conselho Regional de Enfermagem (Coren-DF) para prestar esclarecimentos sobre a morte da criança. A menina não resistiu após receber uma injeção intramuscular de 3,5ml do medicamento (leia Entenda o caso). A dosagem é considerada altíssima por especialistas.

Com a condição de não ter o nome divulgado, o profissional concordou em conversar com a reportagem. Ele confirmou, por exemplo, ter questionado a pediatra Fernanda Sousa Cardoso em relação à quantidade prescrita. “Cheguei e falei para a médica assim: ‘Doutora, a senhora passou 3ml para essa criança (Rafaela), é isso mesmo?’ Eu levei uma ampola da adrenalina e disse que eram três iguais àquela. A doutora me respondeu que era aquilo mesmo”, revelou, com exclusividade, ao Correio (leia Depoimento).

Ele trabalha há 10 anos como técnico em enfermagem e disse nunca ter aplicado adrenalina no músculo de paciente. Acrescentou não ter se recusado a aplicação em Rafaela por ter sido convencido de que o medicamento não faria mal à criança, após ouvir a explicação da pediatra. “Ela olhou e disse: ‘Pode fazer a medicação porque é uma aplicação intramuscular e a absorção (pelo corpo) será mais lenta’. Se fosse uma aplicação na via de conhecimento, como intravenosa, ninguém faria uma coisa dessas”, afirmou.

A enfermeira supervisora no momento do atendimento, que também não quis se identificar, informou que, na hora da medicação, estava em outro procedimento emergencial, na área de isolamento de contato. O acesso é restrito e, antes de entrar na sala, é preciso vestir equipamentos de proteção individual, como luvas e máscara. “Soube do que tinha acontecido depois que o alarme começou a tocar. Saí da área e ouvi a mãe gritando do lado de fora que a filha estava passando mal por causa da medicação”, contou.

Rafaela passou mal e ficou pálida cinco minutos após receber a injeção de adrenalina. O técnico em enfermagem disse ter informado a médica sobre a reação, mas ela teria pedido para aguardar um pouco mais para observar como seria a aceitação pelo corpo da menina. Segundo a equipe de enfermeiros, alguns minutos depois, Rafaela vomitou e ficou ainda mais pálida. Nessa hora, a menina foi entubada, mas morreu três dias depois, ao dar entrada na unidade de terapia intensiva (UTI) do Hospital Regional de Santa Maria.

Para a mãe da menina, Jane Formiga, 31 anos, ficaram a dor, a tristeza e a revolta. “Antes de a médica ir embora, eu perguntei: Doutora, a minha filha está boa? E ela respondeu: ‘Ela não está boa, mas creio que ela ficará bem com as medicações’”, contou. Jane enterrou a filha na última quinta-feira. “Queria entender o que passou pela cabeça dela, pois o enfermeiro (técnico) a alertou. Queria saber por que ela ainda não me procurou. Se ela é mãe, ela sabe o que estou sentindo”, disse.

Responsabilidade

O presidente do Coren, Wellington Antônio da Silva, informou que abriu um processo ético para apurar a responsabilidade dos profissionais de enfermagem no caso. A punição vai desde uma advertência até a cassação do registro, ou ao arquivamento da investigação. Todo o procedimento demora, em média, seis meses. Segundo ele, a explicação da pediatra, de que a aplicação era intramuscular e, por esse motivo, não faria mal ao paciente, “induziria até um profissional experiente ao erro”.

Para evitar que episódios como o da menina Rafaela Luiza, o Coren começou ontem a oferecer um curso de capacitação, com duração de cinco dias. “O profissional pode, sim, se negar a aplicar uma medicação caso veja que ela fará mal, mas muitos não o fazem por medo de que esse ato leve o paciente ao óbito”, ressaltou.

A reportagem tentou localizar algum contato da pediatra ou dos advogados dela, mas não obteve sucesso. O pai dela, Iran Cardoso, presidente do Conselho Regional de Medicina (CRM), atendeu a ligação às 18h53 de ontem, mas disse que não daria entrevistas e desligou, sem antes saber sobre o assunto. Fernanda estava de atestado médico e deve voltar hoje ao trabalho.

Entenda o caso
Suspeita de superdosagem

A menina Rafaela Luiza Formiga Morais, de um 1 ano e 7 meses, deu entrada no Hospital Materno Infantil de Brasília (Hmib), na Asa Sul, no último dia 20, com manchas vermelhas pelo corpo. Segundo Jane Formiga, 31 anos, mãe da criança, Rafaela estava com urticária e o quadro não era grave. A menina não apresentou febre e entrou sorrindo na unidade de saúde. Rafaela, porém, teria começado a passar mal cinco minutos após receber 3,5ml de adrenalina, recomendado pela pediatra Fernanda Sousa Cardoso a fim de controlar a alergia. A quantidade, porém, é 10 vezes maior do que o organismo da paciente suportava, conforme especialistas ouvidos pelo Correio. A menina apresentou complicações e teve de ser transferida para a unidade de terapia intensiva (UTI) do Hospital Regional de Santa Maria (HRSM), mas morreu na última quarta-feira, após cinco paradas cardíacas. A Secretaria de Saúde do DF abriu sindicância para apurar se a morte foi causada por erro médico.

Depoimento
“De quem seria a culpa?”

“A criança apresentava vermelhidão e estava inchada. Ela veio para medicar na minha sala. Dei uma olhada na quantidade de adrenalina que estava na prescrição e assustei. Nunca tinha visto essa prescrição via muscular. Só sabia que adrenalina era aplicada de maneira subcutânea, por meio de nebulização ou intravenosa, ainda em quantidades muito pequenas. Perguntei primeiro para uma colega o que ela achava da medicação e ela disse: ‘Está alta. Vá lá na médica e pergunta, com jeito, se é isso mesmo’. A gente vai com jeitinho porque existe uma diferença de classe, de hierarquia, e muitos médicos não aceitam ser questionados.

Então, eu cheguei e falei para a médica assim: ‘Doutora, a senhora passou 3 ml para essa criança (Rafaela), é isso mesmo? Eu levei uma ampola da adrenalina e disse que eram três iguais àquela. A doutora me respondeu que era aquilo mesmo. Ela olhou e disse: ‘Pode fazer a medicação porque é uma aplicação intramuscular e a absorção (pelo corpo) será mais lenta’. Se fosse uma aplicação na via de conhecimento, como intravenosa, ninguém faria uma coisa dessas, mas fui convencido pela explicação.

Ainda encontrei a colega no corredor e falei que a médica tinha dito que a dosagem estava certa. Não passei a dosagem prescrita para a enfermeira supervisora, porque ela estava em outro procedimento de emergência, trabalhando numa área de isolamento de contato. A médica estava mais próxima de mim e só ela pode prescrever.

Falei para a mãe da criança o que a médica tinha explicado, e ela confiou, assim como eu também confiei, infelizmente. A menina ficou na sala de medicação e começou a ficar pálida e com as placas mais vermelhas. Fui novamente falar com a médica, e ela pediu para aguardar mais um pouco para ver qual seria a reação. Deu um tempo depois, e a criança já começou a vomitar. Isso foi por volta das 17h40. Imediatamente, ela foi levada para a sala de reanimação. Nessa hora, soou um alarme e todo mundo foi para lá, inclusive a médica.

Até a hora em que eu saí do hospital, ela não tinha dado nenhuma parada cardíaca. Fiquei de casa acompanhando todos os boletins da criança. Vou carregar isso por toda a minha vida, com certeza. Mas e se a criança morresse por eu me recusar a aplicar o que estava na prescrição, de quem seria a culpa?”

Técnico em enfermagem do Hmib, um dos responsáveis pelo atendimento da menina Rafaela Luiza Formiga Morais

Fonte: www.advsaude.com.br