Filha do casal morreu aos seis meses, devido a complicações relacionadas ao parto
O Hospital da Fundação Casa de Caridade São Lourenço foi condenado a pagar cerca de R$ 55 mil de indenização por danos morais e materiais a um casal, cuja filha morreu aos seis meses de vida, de parada respiratória, em decorrência de complicações no trabalho de parto. A decisão é da 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG).
O casal narrou nos autos que S.A.C.N. estava em trabalho de parto, quando buscou atendimento no hospital, solicitando ser assistida pelo médico C.F., que já acompanhava a gravidez dela. Afirmou que a mulher foi superficialmente examinada pelas enfermeiras, que entraram em contato com o profissional. O médico informou que permaneceria em casa até a hora do parto.
De acordo com o casal, desde a internação, até o momento do parto, um período de cerca de três horas, S. sofreu fortes dores, tendo insistido, em vão, pela presença de um médico. Só depois de S. apresentar forte sangramento ela foi levada às pressas à sala de parto, quando foi constatado que houve “descolamento de placenta”. Ao nascer, a criança foi diretamente para a UTI; ficou internada por mais de dois meses, tendo se submetido a quatro cirurgias no período e, até a data em que morreu, não abria os olhos e se alimentava por meio de sonda. O casal entrou na Justiça contra o hospital por incidência de responsabilidade no erro médico.
Em sua defesa, o hospital alegou que não era parte legítima para figurar na ação, sustentando que os problemas no parto teriam ocorrido pela demora do médico da paciente em chegar à instituição hospitalar.
A juíza Cecília Natsuko Miahra Goya, da comarca de São Lourenço, condenou o hospital a pagar ao casal R$ 54.240 por danos morais e R 903,68, por danos materiais. A instituição recorreu, reiterando suas alegações.
Responsabilidade objetiva
Ao analisar os autos, o desembargador relator, Marcos Lincoln, observou que no caso eram aplicáveis as disposições do Código de Defesa do Consumidor (CDC), pois os hospitais são considerados prestadores de serviços e os pacientes, consumidores. Assim, de acordo com o disposto nessa legislação, a responsabilidade dos hospitais é objetiva, ou seja, independe de culpa, caracterizando-se desde que haja a presença de um dano ao consumidor.
O relator verificou que o exame de corpo de delito, realizado pelo Instituto Médico Legal, informa que S. permaneceu, no dia do parto, entre 2h42 e 5h30 em internação hospitalar, sem assistência médica, o que impediu que fosse diagnosticado o “deslocamento da placenta” e evitado o “sofrimento fetal agudo”.
“Em razão de tais complicações ocorridas durante o trabalho de parto, a criança L.T.R.N. teve que passar por ‘massagem cardíaca’, ‘emtubação oro-traqueal´, ´cateterismo umbilical´ e foi diretamente encaminhada à UTI Neonatal”, ressaltou o desembargador relator. O relator destacou ainda depoimento de médico que estava de plantão no dia do parto, e que afirmou que “a criança ficou com uma sequela neurológica, em virtude da falta de oxigenação periparto”.
“Diante de tais fatos, apurados nos autos, não restam dúvidas de que o falecimento da criança decorreu de complicações no parto da autora, as quais poderiam ser evitadas pelo devido atendimento médico. Ainda que alegue o réu-apelado [hospital] que referidos danos foram causados somente pela demora do médico, o qual foi indicado pelos próprios autores como profissional de confiança, a responsabilidade do hospital é objetiva, pelo que responde solidariamente pelos danos causados ao paciente, quando caracterizada a conduta culposa e ilícita do médico, que demorou a prestar o atendimento”, afirmou o relator.
O relator acrescentou: “não se pode admitir que um estabelecimento hospitalar realize a internação de uma paciente, em trabalho de parto, e deixe-a, por horas, sem qualquer acompanhamento, o que, sem dúvida, configura ato ilícito”.
Avaliando ser inconteste os danos morais, e concordando com o valor arbitrado em Primeira Instância, o desembargador relator manteve a sentença.
Os desembargadores Wanderley Paiva e Alexandre Santiago votaram de acordo com o relator.
Processo 1.0637.08.060250-0/001
Fonte: TJMG
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- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.