Correio Braziliense – Visão do Correio
As operadoras de plano de saúde no Brasil estão se especializando em mandar a qualidade dos serviços para o fundo do poço e os preços para a estratosfera. Apesar da avançada legislação federal em defesa do consumidor, em vigor há mais de duas décadas, e das recentes tentativas da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) de conter os abusos, os usuários não param de ser negativamente surpreendidos pelas empresas do setor. É o caso da proibição de aumento das mensalidades para beneficiários com mais de 60 anos, que não alivia os gastos dos idosos.
Primeiro, o reajuste é antecipado, dentro da lei, com escalada acelerada na faixa etária de 44 a 59 anos — portanto, a salvo da proteção assegurada à terceira idade pelo Estatuto do Idoso, de 2004. Segundo, são promovidas duas altas num mesmo ano. Pior: a incidência extra pode bater em 94,5%, sendo que a correção na data prevista em contrato já tem sido efetuada em valor bem acima da inflação. A taxa fixada pela ANS para os convênios individuais deste ano, por exemplo, é de 7,93%. Para os coletivos, os percentuais são livremente definidos pelas operadoras, ultrapassando os 10% a cada período de 12 meses.
É preciso agir com rigor, não só monitorando os preços, como contendo abusos nas correções anuais. Em julho, a agência reguladora suspendeu as vendas de planos de quase 40 empresas, mas o mês seguinte foi de recorde de reclamações, a maior parte delas já banalizada, como o desrespeito a prazos de atendimento em internações, exames e consultas. Pelo visto, a medida não teve força de convencimento. Responsável pela normatização e fiscalização da concessão pública da prestação de serviço essencial à sociedade, cabe à ANS se impor — com isenção e firmeza.
Surpreende que o setor invista contra a paciência do brasileiro. Afinal, os usuários no país são menos de 50 milhões, claro indicativo do enorme potencial de crescimento que representa para as operadoras uma população próxima de 200 milhões de pessoas. Mais: o mercado a ser explorado torna-se cada vez mais rico, com o fortalecimento da economia nacional, em especial a recuperação do emprego e da renda. Porém, ao desrespeitarem o consumidor, os planos dão um tiro no pé — inclusive por provocarem mais regulação do mercado.
As operadoras não podem se conformar em atuar nas rebarbas do apagão dos serviços públicos de saúde. Precisam, sim, valorizar o trabalho que prestam, oferecendo qualidade e ganhando a confiança dos cidadãos, o que não terão corrigindo distorções apenas mediante punição. Quanto ao Estado, tem a obrigação de enquadrar o setor, caso esse insista em não se autorregular, e também de oferecer alternativas aos contribuintes que não puderem ou não quiserem contratar um plano de saúde. O fracasso nessas duas missões deixa o cidadão vulnerável e favorece a mercantilização da medicina.
Fonte: Correio Braziliense
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- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.