Orçamento da União de 2014 incluiu no anexo ``Riscos Fiscais`` o valor de R$ 3,93 bi para a cobertura de despesas decorrentes de sentenças
O lançamento preventivo, na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) da União para o exercício de 2014, de prováveis gastos adicionais de quase R$ 4 bilhões com medicamentos e tratamentos médicos não listados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), mas reivindicados judicialmente por pacientes, é o reconhecimento prévio pelo governo de que será quase sempre derrotado na Justiça.
Mas é, principalmente, a prova da lentidão com que é atualizada a lista de medicamentos e procedimentos médicos cobertos pelo sistema, pois as ações, em geral, referem-se ao fornecimento de remédios ou à cobertura de tratamentos correntes no País, mas ainda não incluídos na relação do SUS.
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Como mostrou reportagem do jornal Valor (15/4), a LDO que balizou o Orçamento da União de 2014 incluiu no anexo ``Riscos Fiscais`` o valor de R$ 3,93 bilhões para a cobertura de despesas decorrentes de sentenças judiciais determinando o fornecimento de remédios ou de tratamentos reclamados por cidadãos, mas que o SUS se recusava a oferecer.
A Advocacia-Geral da União (AGU) reconhece que é grande a possibilidade de o governo continuar sendo derrotado na Justiça. Em 2013, foram julgadas cerca de 18 mil ações contra a União, incluindo tratamento médico e fornecimento de remédios. ``A maioria das decisões é desfavorável à União``, reconheceu o coordenador-geral de Direito Econômico, Social e Infraestrutura da Procuradoria-Geral da União (órgão da AGU), Lourenço Paiva Gabina.
Em 40% dos processos, os pacientes buscam medicamentos de última geração ainda não registrados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e, por isso, não incluídos na relação de medicamentos essenciais fornecidos pelo SUS. A derrota da União nesses processos é uma clara indicação de que tanto a Anvisa como o SUS estão atrasados no reconhecimento desses remédios. Em ações desse tipo, a União saiu vencedora somente nos casos em que conseguiu provar que a alternativa oferecida pelo SUS é tão eficiente quanto o medicamento ou procedimento solicitado pelo paciente na Justiça.
Em março de 2010, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o SUS deve fornecer a pacientes de doenças graves que recorreram à Justiça remédios de alto custo ou tratamento médico não oferecidos pelo sistema. Em seu voto (aprovado pelo plenário), o relator do processo, ministro Gilmar Mendes, afirmou que ``há a necessidade de revisão periódica dos protocolos existentes e de elaboração de novos protocolos``. Por essa razão, segundo Mendes, ``não se pode afirmar que os protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas do SUS são inquestionáveis, o que permite sua contestação judicial``.
O STF já reconheceu a repercussão geral de dois recursos, ainda não julgados, sobre o tema. O primeiro, na pauta desde 2007, trata da questão da obrigatoriedade do Estado de fornecer medicamentos de alto custo a portador de doença grave que não dispõe de recursos financeiros para comprá-los. O segundo se refere à obrigatoriedade de fornecimento de medicamentos não registrados na Anvisa. Ainda não há data para a decisão do STF. O relator dos dois recursos é o ministro Marco Aurélio Mello.
O que a prática tem demonstrado é que, necessitando - em muitos casos, com urgência - de medicamentos ou tratamentos mais modernos não reconhecidos nas relações da Anvisa e do SUS e sabendo que pelas vias normais não poderão dispor deles, muitos pacientes recorrem à Justiça, cuja decisão pode ser mais rápida. Ou seja, a lentidão dos órgãos que regulam e executam as ações públicas na área da saúde empurra muitos pacientes para a Justiça, o que, pelo histórico das decisões judiciais, força o governo a reservar parte do Orçamento para o cumprimento das sentenças. Isso eleva os custos de operação da Justiça, pois a sobrecarrega, e não evita que, afinal, o governo arque com os custos. ``O Estado acaba gastando mais por culpa de sua própria ineficiência e morosidade``, resumiu um advogado de pacientes que recorreram à Justiça para obter do SUS o remédio ou o tratamento de que necessitam.
Fonte: O Estado de S.Paulo
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- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.