Estado determinou que o Ihene inutilize 1.843 amostras do material.
Ele é utilizado para tratar doenças relacionadas a cânceres no sangue.
A Agência Pernambucana de Vigilância Sanitária (Apevisa) determinou, nesta quarta-feira (2), que o Banco de Ossos e Sangue do Nordeste LTDA do Instituto de Hematologia do Nordeste (Ihene), na Boa Vista, área Central do Recife, inutilize 1.843 de células progenitoras hematopoéticas – CPH do cordão umbilical e placentário. Essas células foram armazenadas de forma irregular, conforme atestou também a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Caso fosse usado, o material poderia causar até a morte do paciente.
A ordem para inutilização das unidades partiu após uma investigação minuciosa. Na portaria 001/2016, o diretor-geral da agência, Jaime Brito de Azevedo, segue a recomendação das Promotorias de Defesa da Cidadania e de Defesa da Saúde e do Consumidor, do Ministério Público de Pernambuco (MPPE).
De acordo com a agência pernambucana, as células foram armazenadas em tanque de nitrogênio líquido em temperatura acima de -150 graus Celsius, no período de 13 de maio a 23 de outubro de 2015.
O problema mais grave foi a descoberta do armazenamento com temperaturas positivas observadas entre os dias 10 e 23 de outubro do ano passado. O caso seguiu, então, para avaliação da agência nacional.
Por isso, a Gerência de Sangue, Tecidos, Células e Órgãos da Anvisa concluiu que “houve desvio de qualidade. A agência atestou risco, agravo e consequência à saúde dos pacientes que receberiam esse material.”
Na recomendação conjunta, publicada no Diário Oficial do Ministério Público de Pernambuco, de terça-feira (1º), as Promotorias de Defesa da Cidadania e de Defesa da Saúde e Consumidor justificam, com detalhes, o que foi detectado nas investigações realizadas no Ihene.
Além dos tanques de congelamento, que estavam em desacordo com as normas vigentes, a Vigilância Sanitária detectou que o principal agente usado para congelar as células (Dimetilsulfóxido –DMO) é altamente tóxico para o material, se deixado em temperatura ambiente.
“Essas bolsas não possuem qualidade ou segurança requeridas no uso terapêutico, devendo ser descartadas”, afirma o texto publicado pelas promotorias no Diário Oficial.
A conclusão do MPPE é clara: “O produto possui risco de causar dano irreparável e irreversível grave.”
Surpresa
O diretor-geral do Instituto de Hematologia do Nordeste (Ihene), Clemente Tagliari, afirmou, no início da manhã desta quarta-feira (2), ter ficado surpreso com a divulgação da portaria da Apevisa. “Soube desse problema pela reportagem do G1 da TV Globo Nordeste.”
Ele alegou não ter sido notificado oficialmente sobre a determinação de inutilizar as células de cordão umbilical congelados pelo Ihene.
“Assim que recebermos qualquer notificação da Saúde e da Apevisa, vamos seguir todas as determinações “, assegurou.
Tagliari disse também que o material coletado em Pernambuco passa por testes no Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, onde existe um banco de armazenamento de cordão umbilical que é referência em todo o Brasil.
“Como fazemos esses testes e nunca fomos informados de problemas, fico surpreso com a decisão do Ministério Público e da Apevisa”, acrescentou.
Medidas
As informações repassadas pelo Ihene são contestadas pela Apevisa. O diretor-geral da Agência, Jaime Brito de Azevedo, afirmou que o instituto sabia dos problemas, foi notificado e chegou a se justificar. "Eles souberam em dezembro do ano passado, em janeiro apresentaram a defesa, alegando uma falha técnica na programação de um dos tanques de armazenamento de cordões umbilicais. Mês passado, mandaram amostras para São Paulo", observou.
Brito conta que o problema só foi descoberto por causa da iniciativa de uma funcionária do Ihene. Ela percebeu falhas nos tanques e enviou comunicado aos diretores, por e-mail. "Informou que o Ihene havia aplicado uma quantia insuficiente de recursos para colocar nitrogênio líquido em um dos tanques. Reiterou o aviso e acabou sendo demitida."
O diretor-geral da Apevisa afirma que o problema detectado em um dos tanques era muito sério. "Chegamos a medir 30 graus Celsius positivos. Era melhor colocar no ar-condicionado da sala", comparou.
Diante do problema a promotora de Defesa da Saúde, Ivana Botelho, declarou que o instituto terá dez dias para descartar o material. Esse processo, segundo ela, deverá ser acompanhado pela Apevisa e pela Anvisa. "Se eles não cumprirem a recomedação, poderemos adotar medidas judiciais", disse Botelho.
Congelamento
O congelamento de cordão umbilical de recém-nascidos em bancos privados ganhou força nos últimos anos no Brasil. Acredita-se que ao guardar o material dos bebês a família teria mais chances de uso terapêutico em caso de detecção de algumas doenças, sobretudo, as leucemias, acúmulo de células jovens anormais na medula óssea.
A prática, no entanto, é criticada pelos especialistas em hematologia. “A indicação para guardar esses cordões é zero. A possibilidade de uso em pacientes com algumas doenças é de 1 caso para 200 mil e depende de vários fatores”, afirma a representante técnica do Banco de Cordão Umbilical Público do Estado, ligado ao Brasil Cord, da rede credenciada pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca), Carolina Militão.
A especialista esclarece que o uso de células de cordão congelado só é viável, por exemplo, em um caso em que a gestante já tem outro filho, que sofre de leucemia. Para ajudar essa criança, se faz um teste no bebê, ainda na barriga, para saber se existe compatibilidade e o material tem qualidade.
Carolina Militão ressalta a importância dos bancos públicos, como o Hemope, em Pernambuco. “Há muito tempo, defendemos as vistorias nos bancos privados para garantir a qualidade do material. Queremos que eles orientem as pessoas e atuem em acordo com a lei. Além disso, em todo o mundo, os estudos científicos são feitos apenas em bancos públicos. Isso corre nos grandes centros da Europa.”
Fonte: G1/Pernambuco
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- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.