Minha foto
Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico, Odontológico e da Saúde (FMRP-USP). Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado do curso de Bioética e Biodireito do HCor. Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Perícias médicas nas ações acidentárias na Justiça do Trabalho

Por Raimundo Simão de Melo

Um dos maiores problemas atuais vivenciados pela Justiça do Trabalho diz respeito às perícias médicas nas ações acidentárias, porque faltam peritos verdadeiramente de confiança dos juízes, que aceitem o encargo. A Justiça do Trabalho, que com a EC 45/2004 recebeu a incumbência de julgar as ações acidentárias em face dos empregadores, não tem estrutura adequada par isso e os peritos particulares, em algumas comarcas, findam por querer ditar as regras do jogo, pois sabem que os juízes precisam deles. Todavia, não obstante a necessidade e importância do seu trabalho, são eles auxiliares dos juízes. Quem conduz e julga a demanda é o juiz. O melhor seria, para resolver ou amenizar o problema, que a Justiça do Trabalho mantivesse um quadro próprio de peritos, porém, enquanto isso não ocorrer, só resta conviver com os peritos particulares, cabendo aos magistrados direcionar o seu trabalho e, com punho forte, estabelecer as regras da sua atuação.

Nas ações perante a Justiça do Trabalho envolvendo acidentes do trabalho e doenças ocupacionais, os objetos são os pleitos de indenizações por responsabilidade civil (danos moral, material e estético e pela perda de uma chance) e por reintegração no emprego, neste último caso, com base no artigo 118 da Lei 8.213/1991 e em normas coletivas, que asseguram estabilidade provisória aos acidentados.

O papel da perícia nestes casos envolve a verificação do nexo causal, a existência de dano e sua extensão, a incapacidade ou capacidade residual de trabalho da vítima, o percentual de invalidez ou invalidez total e a possibilidade de readaptação em alguma outra função na empresa.

É de grande importância a perícia nas ações acidentárias para o deslinde da causa, embora não seja o único meio de prova, cabendo ao juiz valer-se dos demais elementos existentes nos autos. A perícia, por óbvio, será feita por profissional habilitado, que detenha conhecimentos técnicos para auxiliar o juiz. De acordo com o artigo 420 do CPC, “a prova pericial consiste em exame, vistoria ou avaliação”.

Na forma do artigo 2º da Resolução 1.488/1998 do Conselho Federal de Medicina, o médico perito deve adotar em relação aos vários fatores responsáveis por um evento acidentário, o seguinte:

“Para o estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de saúde e as atividades do trabalhador, além do exame clínico (físico e mental) e os exames complementares, quando necessários, deve o médico considerar:
I — a história clínica e ocupacional, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo causal;
II — o estudo do local de trabalho (grifados);
III — o estudo da organização do trabalho (grifados);
IV — os dados epidemiológicos;
V — a literatura atualizada;
VI — a ocorrência de quadro clínico ou subclínico em trabalhador exposto a condições agressivas;
VII — a identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes e outros;
VIII — o depoimento e a experiência dos trabalhadores (grifados);
IX — os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais, sejam ou não da área da saúde”.

Assim, não basta o exame clínico da vítima, porquanto, e de grande importância, são o estudo do local e da organização do trabalho, o depoimento e a experiência dos trabalhadores colegas da vítima em relação ao presente e ao passado, isto porque a empresa pode ter feito importantes alterações modificando as condições, métodos e organização do trabalho, o que deve ser levado em conta pelo perito.

De outra parte, para mostrar lisura e permitir igualdade entre as partes, não pode o perito criar empecilhos ao acompanhamento das diligências nos locais de trabalho pelas duas partes, cabendo ao juiz assegurar esse direito em igualdade de condições para não perpetrar cerceamento de defesa e, consequentemente, nulidade do processo.

Ao Estado-Juiz cabe, como questão de ordem pública, buscar a verdade real para, na lição de Aristóteles, dar a cada um o que é seu.

Na forma do artigo 436 do CPC o juiz não se vincula à conclusão do perito, podendo decidir a causa agregado a outros fatores colhidos nos autos, valendo-se da prudência e da lógica do razoável, atento aos fatos, indícios, presunções e a observação do que ordinariamente acontece.

Não são poucos os casos no dia a dia na Justiça do Trabalho, em que o perito não esclarece a contento e suficientemente a matéria objeto da perícia, sendo necessário e de boa política judiciária, na busca da verdade real, que o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, nomeie outro perito e no final aprecie as duas perícias para bem decidir a questão, cabendo-lhe apreciar livremente o valor de uma e de outra e, se for o caso, em situações extremes de dúvida, pode até nomear um terceiro perito. O objetivo maior do Judiciário, portanto, é esclarecer a verdade dos fatos e, a partir daí, dar a cada um o que é seu por direito.

Raimundo Simão de Melo é consultor jurídico e advogado. Procurador Regional do Trabalho aposentado. Doutor e Mestre em Direito das relações sociais pela PUC/SP. Professor de Direito e de Processo do Trabalho. Membro da Academia Nacional de Direito do Trabalho. Autor de livros jurídicos, entre outros Direito ambiental do trabalho e a saúde do trabalhador.

Fonte: Revista Consultor Jurídico