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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico, Odontológico e da Saúde (FMRP-USP). Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado do curso de Bioética e Biodireito do HCor. Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Ética em Reprodução Assistida

Será que os médicos conhecem as normas sobre o assunto, estabelecidas pelo Código de Ética Médica e por outras resoluções? Os da ficção, talvez não...

Médica passa por cima de todas as normas éticas de sua profissão e, entre outras facetas, faz reprodução assistida usando embrião congelado do próprio irmão morto – que, aparentemente, não deixou nenhuma permissão para o uso futuro de seu material biológico– e de sua ex-cunhada. Por sua vez, paciente que recebe o embrião era casada na época da fertilização in vitro, mas passa pelo procedimento sem autorização (na verdade, à revelia) do marido.

Aliás, toda a situação é descoberta por uma funcionária da clínica da médica, já que esta, ao que tudo indica, não se ateve à questão do sigilo – um dos pilares hipocráticos da profissão médica, lembrado desde o juramento que diz: “aquilo que no exercício ou fora do exercício da profissão e no convívio da sociedade, eu tiver visto ou ouvido, que não seja preciso divulgar, eu conservarei inteiramente secreto”.

Sem entrar no mérito de enredos, roteiros, ou de liberdade criativa, imagina-se que, ao retratar em horário nobre a rotina de profissionais e profissões, os autores façam pesquisas confiáveis, sob o risco de gerarem desinformação – em vez de o contrário.

Afinal, como disse certa vez o escritor e filósofo italiano Umberto Eco, “a TV não é um gênero, é um ‘serviço’, um jeito de obterem-se informações sobre ferramentas necessárias à vida cotidiana”.

Algumas dúvidas
Dentro desse assunto, confira exemplos de dúvidas sobre Reprodução Humana Assistida, capazes de afligir colegas de outras especialidades, respondidas de acordo com o Código de Ética e com a Res. CFM n° 1.957/2010 (que adota as normas éticas para a utilização das técnicas na área):

1) Doadores podem ser amigos/conhecidos/parentes de receptores?

Em hipótese nenhuma: obrigatoriamente será mantido o sigilo sobre a identidade dos doadores de gametas e embriões, bem como, dos receptores.

Em situações especiais as informações sobre a identidade dos doadores, por motivação médica, podem ser fornecidas exclusivamente para médicos, resguardando-se a identidade do doador.

As clínicas, centros e serviços que empregam a doação devem manter, de forma permanente, um registro dos dados clínicos de caráter geral, características fenotípicas e uma amostra de material celular dos doadores. Tal registro evitará que um doador venha a produzir mais do que uma gestação de criança de sexo diferente numa área de um milhão de habitantes.

2) Se alguém de meu consultório tomar conhecimento sobre dados confidencias de pacientes, não será minha culpa...

De acordo com o Código de Ética Médica, o médico não pode permitir o manuseio e o conhecimento dos prontuários (e em analogia, de outros documentos que trazem informações sigilosas de pacientes) por pessoas não obrigadas ao sigilo profissional, quando sob sua responsabilidade.

Outro ponto cristalino no Código é o que proíbe ao médico revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício da profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente.

O sigilo deve ser mantido ainda que o fato seja de conhecimento público e em caso de morte do paciente, entre outras situações.

3) Acompanho um casal, porém apenas a mulher concorda com a reprodução assistida. Devo atendê-la, contra a vontade do marido?

Nesta situação, não se fala em “esposa” ou “marido” infértil e, sim, de “casal infértil”.

Isso significa que ambos devem estar cientes e concordar com o procedimento.

Prova disso é que os dois, no momento da “criopreservação” (congelamento de embriões), por exemplo, devem expressar a sua vontade, por escrito, quanto ao destino que será dado ao material em caso de divórcio, doença grave ou falecimento de um deles ou de ambos, e quando desejam doá-los.

4) É proibido usar material biológico congelado de pessoa falecida?

Não constitui ilícito ético reprodução assistida post mortem, desde que haja autorização prévia do falecido para o uso do material criopreservado.

5) Pessoas que têm pouco ou nenhum conhecimento sobre as técnicas de reprodução assistida podem participar do processo como doadoras ou receptoras?

Veja: o consentimento informado é obrigatório a todos os pacientes submetidos às técnicas de reprodução assistida, inclusive, aos doadores. O documento de consentimento informado será expresso em formulário especial e estará completo com a concordância, por escrito, das pessoas submetidas às técnicas.

Na verdade, o médico não pode praticar procedimento de procriação medicamente assistida sem que os participantes estejam de inteiro acordo e devidamente esclarecidos.

6) Quantos embriões posso implantar na receptora?

No máximo quatro.

O número seguirá as seguintes determinações, baseadas nas chances de a mulher engravidar pelas técnicas de reprodução assistida e no conhecimento técnico voltado a prevenir riscos desnecessários: mulheres de até 35 anos podem receber em seu útero até dois embriões; de 36 a 39, três embriões; com 40 anos ou mais, até quatro embriões.

Vale lembrar que, em caso de gravidez múltipla, não é permitida a eliminação de um dos embriões.

7) Minha paciente tem uma relação homoafetiva estável. Ela pode solicitar procedimento de reprodução assistida?

Sim. Apesar de implícita, uma das grandes inovações na área é permitir que todas as pessoas capazes, que tenham solicitado o procedimento e cuja indicação não se afaste dos limites da CFM n° 1.957/2010, podem ser receptoras das técnicas de reprodução assistida, desde que estejam de inteiro acordo e inteiramente esclarecidas.

8) Os pais podem escolher o sexo dos embriões a serem implantados?

Não. As técnicas em reprodução assistida não devem ser aplicadas com a intenção de sexagem (ou qualquer característica biológica) do futuro filho, exceto quando se tratar de evitar doenças ligadas ao sexo.

9) O uso de doadora temporária de útero (“barriga de aluguel”) é eticamente proibido?

As clínicas, centros ou serviços de reprodução humana podem usar técnicas de reprodução assistida para criarem a situação identificada como gestação de substituição, desde que exista um problema médico que impeça ou contra-indique a gestação na doadora genética.

De qualquer maneira, as doadoras temporárias de útero deverão pertencer à família da doadora genética, num parentesco até segundo grau, sendo os demais casos sujeitos à autorização do Cremesp.

É claro que a doação temporária de útero não poderá ter caráter lucrativo ou comercial.


Fonte: Centro de Bioética - CREMESP