Minha foto
Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico, Odontológico e da Saúde (FMRP-USP). Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado do curso de Bioética e Biodireito do HCor. Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

Paciente morre em SP após sofrer AVC e médico receitar xarope; hospital estava sem tomógrafo

Uma sucessão de problemas na rede de saúde pública municipal e estadual de Osasco (Grande São Paulo) resultou na morte do aposentado Zigomar Rodrigues Domingues, 62, no último 26.

O paciente sofreu um AVC (Acidente Vascular Cerebral) na noite de 3 de fevereiro e foi levado ao pronto-socorro municipal da Vila Pestana. Lá, segundo a família de Domingues, um médico lhe receitou um xarope e o dispensou, ignorando a gravidade do caso. O aposentado era deficiente físico desde os sete anos, em decorrência de uma poliomielite, e tinha histórico de acidentes vasculares.

Segundo a jornalista Evelyn Rodrigues, filha de Domingues, a família ligou para o Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) por volta de 20h do dia 3 de fevereiro. A ambulância levou o paciente o pronto-socorro mais próximo, como de praxe. “Ele não conseguia falar direito, nem se mexer e estava com falta de ar. Na ambulância, mediram a pressão dele e deu 28 por 15”, relata a filha.

Na unidade, o paciente foi encaminhado para a sala de emergência, onde foi analisado e medicado com vitaminas e soro fisiológico, segundo a direção do PS. Após quatro horas “em observação neurológica”, diz o hospital, o paciente foi reavaliado e recebeu alta. O médico que lhe atendeu apenas receitou um xarope para ajudar na respiração (Salbutamol) e o liberou.

Em seguida, de acordo com Evelyn, a enfermeira do Samu, a mesma que havia removido Domingues de casa até o PS, recomendou que a família levasse o paciente para outro hospital, dada a gravidade do caso, contrariando a decisão do médico.

A família, então, levou de carro o aposentado até o Hospital Regional de Osasco Dr. Vivaldo Martins Simões, administrado pelo governo do Estado. “Meu pai não tinha forças sequer para sentar, não conseguia falar nada e estava completamente sem noção do que acontecia”, afirma Evelyn.

Em nota, a Secretaria de Saúde de Osasco afirmou que o hospital liberou Domingues porque ele “respirava normalmente, estava corado e ativo” e que as sequelas aparentes --glicemia e dificuldades motoras-- estavam “relacionadas aos episódios anteriores de AVC e a doenças preexistentes, como diabetes e glicemia."

“Ele nunca teve diabetes; a glicemia estava alterada por conta do AVC. A reavaliação só foi feita porque minha mãe foi cobrar o médico sobre o que estava acontecendo”, questiona a filha.

Segundo a secretaria, o xarope foi receitado porque “ruídos discretos” foram diagnosticados na caixa torácica de Domingues –posteriormente, no hospital regional, os médicos constataram que o paciente estava, na verdade, com enfisema pulmonar. O hospital justifica a alta alegando que o quadro do paciente era “estável”.

“Ele estava com dois problemas graves [AVC e enfisema] que não foram diagnosticados corretamente”, diz Evelyn. “Os médicos do PS não o encaminharam para lugar nenhum, nem solicitaram tomografia ou um exame mais completo .Se eles tivessem preocupados com a integridade do paciente, ele não teria deixado o hospital com uma receita de xarope”, afirma.

Hospital de referência não tinha tomógrafo

O diagnóstico do quadro de Domingues realizado no Hospital Regional Dr. Vivaldo Martins Simões confirmou que o caso era grave. “O paciente foi diagnosticado com AVC muito extenso, de alta gravidade”, afirmou a Secretaria de Saúde do Estado, em nota. Apesar de identificar a gravidade do caso, o atendimento a Domingues no Hospital Regional também foi falho.

Apesar de ser a unidade do município referência em UTI neurológica, o hospital regional estava sem tomógrafo --equipamento indicado para detectar o AVC-- quando Domingues foi internado. O único tomógrafo da unidade não estava funcionando, porque uma peça havia quebrado dias antes, e a peça substituta ficou apreendida na alfândega.

O equipamento só voltou a funcionar cerca de 25 dias após a internação do aposentado. Durante todo esse tempo os médicos não tinham como saber a dimensão do AVC, nem a área cerebral afetada.

Nesse período, Domingues foi levado para o setor de internação, onde ficou por dois dias. De lá, foi transferido para a UTI (Unidade de Terapia Intensiva), onde foi entubado por apresentar insuficiência respiratória e passou a se alimentar e a urinar por sondas. Na UTI, o aposentado contraiu uma infecção pulmonar, que, em pouco tempo, fez com que seu quadro evoluísse para “coma vigil”, condição que deixa o paciente em estado vegetativo.

Após finalmente Domingues fazer a tomografia, foi detectado que o paciente realmente havia sofrido um AVC no dia 3 de fevereiro e que sofreu outro acidente, na artéria basilar, três dias antes da tomografia. Os dois acidentes afetaram todo o tronco cerebral do aposentado.

Segundo Evelyn, seu pai ficou entubado por mais de 20 dias, quando a recomendação é retirar os tubos após no máximo dez dias e fazer uma traqueostomia. A jornalista afirma que a traqueostomia não foi feita por não haver cirurgiões no hospital, fato negado pela Secretaria de Saúde. “Temos equipes diurnas e noturnas de cirurgiões.”

A filha do paciente afirma ainda que faltou acompanhamento médico ao seu pai durante os dias de internação. A secretaria, mais uma vez, nega: “o paciente foi assistido por equipe multidisciplinar, recebendo antibióticos adequados para seu quadro clínico, além de fisioterapia respiratória.”

Sobre o tomógrafo, a secretaria afirma que “o equipamento realiza, em média, 1.000 tomografias por mês e, apesar das manutenções periódicas, teve uma peça danificada, sem possibilidade de troca imediata pela empresa Toshiba, sendo necessária sua importação.”

Uma saída para o problema seria a transferência do paciente, mas o procedimento não foi realizado por conta do alto risco que poderia oferecer ao aposentado. “O Hospital Regional é o único da região com UTI neurológica. Como pode ter ficado sem tomografia por mais de 28 dias por causa de uma peça presa na alfândega?”, questiona Evelyn.

Domingues acabou morrendo por uma série de fatores --parada cardíaca e respiratória, edema do pulmão, insuficiência renal, AVC isquêmico e choque séptico. Ele deixou a mulher e quatro filhos.

A Corregedoria de Saúde de Osasco e o Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) abriram sindicância para investigar o caso, após solicitação da filha do paciente. Evelyn também fez boletim de ocorrência.

Fonte: UOL