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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico, Odontológico e da Saúde (FMRP-USP). Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado do curso de Bioética e Biodireito do HCor. Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

Parecer CRM-CE 01/2021 - Laqueadura tubária

PARECER CREMEC Nº 01/2021

11/01/2021

Protocolo CREMEC Nº 12877/2020

ASSUNTO: Laqueadura tubária durante o parto

INTERESSADO: Médica ginecologista e obstetra

PARECERISTA: Conselheiro Lino Antonio Cavalcanti
EMENTA: O médico não deve proceder laqueadura tubária durante parto cesariano ou normal, exceto se história de cesarianas sucessivas anteriores ou risco à vida ou saúde da mulher ou do futuro concepto.
Sempre deverá haver um prazo mínimo de 60 dias entre a manifestação da vontade e o ato cirúrgico para a ligação. A autorização de planos de saúde, per si, não dá permissão ética e legal para tal mister, a não ser que esteja de acordo com as normas legais vigentes.

DA CONSULTA

Médica ginecologista e obstetra solicita PARECER deste egrégio Conselho Regional de Medicina do Estado do Ceará, a fim de obter esclarecimentos acerca da suposta responsabilidade do médico plantonista pela não realização de esterilização cirúrgica (laqueadura tubária) no mesmo tempo cirúrgico de parto cesárea, realizada em contexto de emergência em paciente hígida, com um (um) filho vivo, nascido de parto vaginal anterior.

Requer, assim, que este Ilustre Conselho se manifeste sobre o tema, especialmente sobre as seguintes questões:

1) o médico obstetra plantonista pode/deve realizar laqueadura tubária no mesmo tempo cirúrgico de parto cesárea, quando não há comprovada necessidade, por cesarianas sucessivas anteriores, nem existe risco à vida ou à saúde da mulher ou do futuro concepto?

2)   o   médico   obstetra   plantonista   pode/deve   observar se   estão atendidos os requisitos legais, por exemplo o prazo mínimo de 60 (sessenta) dias entre a manifestação da vontade e o ato cirúrgico, antes de realizar a laqueadura tubária?

3)  o médico obstetra plantonista pode/deve se recusar a realizar a laqueadura tubária em virtude do não atendimento dos requisitos legais?

4)  a prévia autorização do plano de saúde para realização de laqueadura tubária obriga o médico obstetra a realizá-la?

DO PARECER:

O Conselho Federal e vários Conselhos de Medicina já se pronunciaram sobre o assunto, inclusive o CREMEC, com pareceres do Dr. Helly Pinheiro Ellery (08/00) e do professor Dr. Helvécio Neves Feitosa (08/2004), embasados na lei 9.263, de 12 de janeiro 1996, de onde extraímos o artigo 10 e alguns dos seus parágrafos:

Art. 10. Somente é permitida a esterilização voluntária nas seguintes situações:

(Artigo vetado e mantido pelo Congresso Nacional - Mensagem no 928, de 19.8.1997)

I - em homens e mulheres com capacidade civil plena e maiores de vinte e cinco anos de idade ou, pelo menos, com dois filhos vivos, desde que observado o prazo mínimo de sessenta dias entre a manifestação da vontade e o ato cirúrgico, período no será propiciado à pessoa interessada acesso a serviço de regulação da fecundidade, incluindo aconselhamento por equipe multidisciplinar, visando desencorajar a esterilização precoce;

II - risco à vida ou à saúde da mulher ou do futuro concepto, testemunhado em relatório escrito e assinado por dois médicos.

§1º. É condição para que se realize a esterilização o registro de expressa manifestação da vontade em documento escrito e firmado, após a informação a respeito dos riscos da cirurgia, possíveis efeitos colaterais, dificuldades de sua reversão e opções de contracepção reversíveis existentes.

§2º. É vedada a esterilização cirúrgica em mulher durante os períodos de parto ou aborto, exceto nos casos de comprovada necessidade, por cesarianas sucessivas anteriores.

§3º. Não será considerada a manifestação de vontade, na forma do §1º, expressa durante ocorrência de alterações na capacidade de discernimento por influência de álcool, drogas, estados emocionais alterados ou incapacidade mental temporária ou permanente.

§4º. A esterilização cirúrgica como método contraceptivo somente será executada através da laqueadura tubária, vasectomia ou de outro método cientificamente aceito, sendo vedada através da histerectomia e ooforectomia.

§5º. Na vigência de sociedade conjugal, a esterilização depende do consentimento expresso de ambos os cônjuges.

§6º.  A esterilização cirúrgica em pessoas absolutamente incapazes somente poderá ocorrer mediante autorização judicial, regulamentada na forma da Lei.
 

PARTE CONCLUSIVA

Eticamente, devemos nos comportar de acordo com as leis existentes.

Há situações, entretanto, que a despeito da regulamentação legal, o médico tem o direito à objeção de consciência por motivo de foro íntimo, o que não é o caso na consulta em tela, dando-nos o discernimento de responder às perguntas exaradas pela peticionante;

1) No caso citado, sem história de múltiplos partos cesarianos anteriores e sem risco à vida ou à saúde da mulher ou de seu futuro concepto, o médico não deve proceder a ligadura de trompa.

2) Deve observar o que preconiza a lei, ou seja, se foi atendido o prazo mínimo de 60 dias entre a manifestação da vontade e o ato cirúrgico.

3) Deve recusar realizar o procedimento de laqueadura tubária em virtude do não atendimento dos requisitos legais rotineiros, com exceções já ditas na primeira pergunta.

4)  A autorização do de saúde dá permissão ética e legal para o médico fazer laqueadura tubária, a não ser que a dita autorização esteja de acordo com as normas legais vigentes.

Este é o parecer, s.m.j.

Cons. Lino Antonio Cavalcanti

Parecerista

*Parecer aprovado em Sessão Plenária virtual, de 11 de janeiro de 2021.

 Fonte: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/pareceres/CE/2021/1