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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

segunda-feira, 19 de agosto de 2019

TRF 1 suspende decisão liminar que autorizava a divulgação de títulos de pós-graduação sem registro no CRM

PROCESSO: 1026859-07.2019.4.01.0000 PROCESSO REFERÊNCIA: 1018010-31.2019.4.01.3400
CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202)
AGRAVANTE: CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA

AGRAVADO: ASSOCIACAO BRASILEIRA DE MEDICOS COM EXPERTISE DE POS GRADUACAO
Advogados do(a) AGRAVADO: PAULO FRANCISCO SOARES FREIRE - DF50755, RAIMUNDO CEZAR BRITTO ARAGAO - DF32147-A

DECISÃO

O Conselho Federal de Medicina/réu agravou da decisão que assegurou aos associados da autora “o direito de divulgar e anunciar suas respectivas titulações de pós-graduação latu senso desde que reconhecidas pelo Ministério da Educação e Cultura”, não se aplicando a vedação prevista na Resolução CFM 1974/2011:

Art. 3º É vedado ao médico:
...
l) Fica expressamente vetado o anúncio de pós-graduação realizada para a capacitação pedagógica em especialidades médicas e suas áreas de atuação, mesmo que em instituições oficiais ou por estas credenciadas, exceto quando estiver relacionado à especialidade e área de atuação registrada no Conselho de Medicina.

Existe probabilidade de provimento do recurso (CPC, art. 995, p. único). Essa vedação está amparada no Código de Ética Médica aprovado pela Resolução CFM nº 2.217/2018 editada com fundamento no art. 5º, alínea “d”, da Lei 3.268/1957:

É vedado ao médico:
Art. 114. Anunciar títulos científicos que não possa comprovar e especialidade ou área de atuação para a qual não esteja qualificado e registrado no Conselho Regional de Medicina.

A vedação prevista no art. 3º, alínea “l”, da Resolução 1.974/2011 não exige lei específica porque não se trata de “condições ou qualificação para o exercício de profissão” (Constituição, arts. 5º/XII e 22/XVI). Ao contrário disso, visa preservar a ética profissional do exercício da Medicina. É insuscetível de controle judicial de legalidade a violação de preceito ético instituído pelo órgão profissional legalmente competente.

“A participação do médico na divulgação de assuntos médicos, em qualquer meio de comunicação de massa, deve se pautar pelo caráter exclusivo de esclarecimento e educação da sociedade, não cabendo ao mesmo agir de forma a estimular o sensacionalismo, a autopromoção ou a promoção de outro(s), sempre assegurando a divulgação de conteúdo cientificamente comprovado, válido, pertinente e de interesse público.

Ao conceder entrevistas, repassar informações à sociedade ou participar de eventos públicos, o médico deve anunciar de imediato possíveis conflitos de interesse que, porventura, possam comprometer o entendimento de suas colocações, vindo a causar distorções com graves consequências para a saúde individual ou coletiva. Nestas participações, o médico deve ser identificado com nome completo, registro profissional e a especialidade junto ao Conselho Regional de Medicina, bem como cargo, se diretor técnico médico responsável pelo estabelecimento.

Em suas aparições o médico deve primar pela correção ética nas relações de trabalho, sendo recomendado que não busque a conquista de novos clientes, a obtenção de lucros de qualquer espécie, o estimulo à concorrência desleal ou o pleito à exclusividade de métodos diagnósticos e terapêuticos. Essas ações não são toleradas, quer em proveito próprio ou de outro(s)” - Resolução CFM 1.974/2011.

Não há que se falar também em ofensa ao princípio constitucional da legalidade (art. 5º/II). Como visto precedentemente, o Conselho Federal de Medicina tem competência legal para dispor sobre “ética médica”, caso em que essa autarquia federal pode definir preceitos e vedações a que os médicos estão sujeitos. Não teria sentido a lei dispor sobre matéria assim tão sensível.

São notoriamente sabidos os malefícios e dissabores causados com a divulgação imagens de pessoas pelas redes sociais, além de configurar captação de clientela. O médico está sujeito a disciplina deontológica estabelecida pelo órgão profissional. Pouco importa que o eventual abuso seja reprimido pela lei civil ou pelo Código de Defesa do Consumidor decorrente de relações contratuais do médico com o seu paciente.

Legitimidade ativa e passiva

Como demonstrado na petição inicial da ação civil pública, a entidade associativa/autora tem legitimidade para essa demanda, nos termos do art. 1º/IV e art. 5º, “b”, da Lei 7.357/1985. E não se confunde com organização sindical.

O CFM apenas editou a Resolução 1974/2011, que é um ato normativo, geral e abstrato, assim insuscetível de lesar direito. O ato que lesaria direito subjetivo seria a eventual penalidade aplicada pelos Conselhos Regionais de Medicina (autarquia federal com personalidade jurídica do CFM) a quem compete cumprir esse ato. Diante disso, caberá ao juiz de primeiro grau apreciar a legitimidade do réu/CFM.

Fica suspensa a eficácia da decisão agravada, devendo a causa prosseguir na forma da lei.

Comunicar ao juízo de origem para cumprir esta decisão (20ª Vara da SJ/DF) e publicar. Apresente a agravada sua resposta em 15 dias.

Brasília, 16.08.2019

NOVÉLY VILANOVA DA SILVA REIS
Desembargador Federal Relator