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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico, Odontológico e da Saúde (FMRP-USP). Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado do curso de Bioética e Biodireito do HCor. Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

quinta-feira, 25 de abril de 2019

Direito Odontológico - Sentença - Responsabilidade Civil - Plano Odontológico - Defeito do Serviço - Condenação

ESTADO DO ESPÍRITO SANTO - PODER JUDICIÁRIO
VITÓRIA - 11ª VARA CÍVEL
Número do Processo: 0016679-92.2009.8.08.0024 (024.09.016679-4)
Requerente: MARCELE CRISTINE DE FREITAS
Requerido: COIFE ODONTO

SENTENÇA

Marcele Cristine de Freitas, devidamente qualificada na petição inicial, propôs a presente ação de indenização por danos materiais, morais e estéticos em face de Coife Odonto Planos Odontológicos Ltda., igualmente qualificado nos autos, que foram registrados sob o nº 024.09.016679-4.

Narra a demandante, em breve síntese, que firmou com o réu contrato de prestação de serviços odontológicos em 6 de maio de 2006. Acrescenta que o tratamento ortodôntico realizado através da rede conveniada não corrigiu a biprotusão que lhe acometia, além de lhe causar graves imperfeições, tais quais desalinhamento e desnivelamento dos dentes, bem como possibilidade de perda dentária e necessidade de novo tratamento para correção.

Por tais razões, pleitou a condenação do demandado a pagar indenização pelos danos estéticos e morais suportados na importância sugerida de cem (100) salários mínimos, a ressarcir o montante dispendido com o plano odontológico, bem como a arcar com os custos do tratamento ortodôntico corretivo.

A petição inicial veio instruída com as peças de folhas 15/63.

O preparo foi realizado (fl. 69).

Devidamente citado (fl. 71), o réu ofertou contestação de forma intempestiva (fl. 108), sobre a qual manifestou-se a parte autora (fls. 87/98).

Em prosseguimento, realizou-se audiência de conciliação, ocasião em que, infrutífera a tentativa de composição entre as partes, foi deferida a oitiva de testemunhas e do representante legal do réu, bem como a produção de prova pericial (fls. 108/109).

Após, foram as partes intimadas novamente para especificarem as provas, tendo o réu quedado-se inerte e a autora insistido pelas provas requeridas e deferidas em audiência (fls. 130/132).

Por fim, diante do não pagamento dos honorários periciais pela parte ré (fls. 126-v. e 138-v.), a autora pugnou pelo julgamento antecipado do feito (fl. 141).

Este é o relatório.

Estou a julgar o feito nos moldes do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, eis que o caso não necessita de maior atividade probatória1, a parte autora pugnou pelo julgamento antecipado do feito e a produção de prova pericial restou preclusa em virtude da desídia da parte ré, que manteve-se inerte às intimações para depositar os honorários do perito.

Devidamente citado (fl. 71) e tendo o réu apresentado resposta intempestiva, operou-se a revelia que, no caso, produz a plenitude dos seus efeitos (CPC, art. 344), já que não se faz presente nenhuma das hipóteses elencadas no artigo 345 do Código de Processo Civil e vez que a prova documental produzida, notadamente o contrato firmado entre as partes (fls. 17/18), as fotos anteriores e posteriores ao tratamento (fls. 23, 55/56 e 59/62) e o laudo do ortodontista particular (fl. 63) estão em consonância com a tese autoral.

Em consequência, firmado nesses fundamentos, é de ser acolhida a pretensão deduzida pela parte autora, a cujo propósito faço as considerações a seguir.
À partida, convém salientar que, nos termos dos artigos 2.º e 3.º da Lei n.º 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor), a demanda em voga cuida de relação de consumo, de sorte que se aplicam os princípios e regras insculpidos no referido diploma legal.

Cinge-se a quaestio iuris à responsabilidade civil do demandado, na qualidade de plano de saúde prestador de serviços ortodônticos, pelos alegados danos materiais, morais e estéticos sofridos pela autora em virtude do insucesso do procedimento ministrado em sua dentição por profissional credenciado a seus quadros.

Nesse particular, convém salientar que é entendimento consolidado no Superior Tribunal de Justiça que a empresa de plano de assistência à saúde possui legitimidade passiva para a ação indenizatória decorrente de erro no tratamento odontológico realizado por profissional credenciado2.

A responsabilidade civil, nesses casos, pode se dar em decorrência do serviço prestado diretamente pelo cirurgião-dentista como profissional de saúde ou, ainda, em virtude da prestação dos serviços de forma empresarial, na qual está incluída a responsabilidade das operadoras de plano de saúde. Quando demandadas por erro na atuação dos dentistas credenciados, respondem solidariamente, desde que demonstrada a culpa do profissional (CDC, art. 14, § 4º).

Nesse sentido, muito embora haja divergência acerca do tipo de responsabilidade assumida pelo cirurgião-dentista, predomina o entendimento de que desenvolve obrigações de resultado na maior parte de suas atividades, mormente na ortodontia, de expressiva finalidade estética. À vista disso, malgrado seja necessária a comprovação de culpa do profissional conveniado para a responsabilização do plano odontológico nas hipóteses de falha técnica, é certo que aqueles que se obrigam a um resultado possuem culpa presumida. Vejam-se:

RESPONSABILIDADE CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TRATAMENTO ODONTOLÓGICO. APRECIAÇÃO DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL. INVIABILIDADE. TRATAMENTO ORTODÔNTICO. EM REGRA, OBRIGAÇÃO CONTRATUAL DE RESULTADO. REEXAME DE PROVAS. INADMISSIBILIDADE. 1. As obrigações contratuais dos profissionais liberais, no mais das vezes, são consideradas como "de meio", sendo suficiente que o profissional atue com a diligência e técnica necessárias, buscando a obtenção do resultado esperado. Contudo, há hipóteses em que o compromisso é com o "resultado", tornando-se necessário o alcance do objetivo almejado para que se possa considerar cumprido o contrato. 2. Nos procedimentos odontológicos, mormente os ortodônticos, os profissionais da saúde especializados nessa ciência, em regra, comprometem-se pelo resultado, visto que os objetivos relativos aos tratamentos, de cunho estético e funcional, podem ser atingidos com previsibilidade. 3. O acórdão recorrido registra que, além de o tratamento não ter obtido os resultados esperados, "foi equivocado e causou danos à autora, tanto é que os dentes extraídos terão que ser recolocados". Com efeito, em sendo obrigação "de resultado", tendo a autora demonstrado não ter sido atingida a meta avençada, há presunção de culpa do profissional, com a consequente inversão do ônus da prova, cabendo ao réu demonstrar que não agiu com negligência, imprudência ou imperícia, ou mesmo que o insucesso se deu em decorrência de culpa exclusiva da autora. 4. A par disso, as instâncias ordinárias salientam também que, mesmo que se tratasse de obrigação "de meio", o réu teria "faltado com o dever de cuidado e de emprego da técnica adequada", impondo, igualmente a sua responsabilidade. 5. Recurso especial não provido. (STJ, REsp nº 1238746/MS, 4ª Turma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 18.10.2011, DJe 4.11.2011). (destaquei).

APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. TRATAMENTO ORTODÔNTICO. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. DEVER DE INDENIZAR. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS FIXADA EM PATAMAR RAZOÁVEL. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS DEVIDOS AOS ADVOGADOS DA AUTORA. 1. Predomina na doutrina e na jurisprudência a orientação de que o dentista se responsabiliza pelo resultado, mormente nos procedimentos ortodônticos. 2. Restando comprovado que o tratamento realizado na autora lhe causou danos, ainda que de pequena monta e reversíveis, patente o dever de indenizar, principalmente considerando que ela terá de se submeter a retratamento ortodôntico de duração estimada de 36 (trinta e seis) meses. 3. Mostra-se justo o valor da indenização por dano moral fixado na sentença em R$3.000,00 (três mil reais), levando em conta a extensão e a reversibilidade do dano. […] 5. - Apelação cível conhecida e desprovida; recurso adesivo conhecido e parcialmente provido. (TJES, Ap. cível nº 011994-86.2006.8.08.0011, 3ª Câmara Cível, Rel. Dair José Bregunce de Oliveira, j. 16.10.2012, DJe 26.10.2012). (destaquei).

Desse modo, é devida a responsabilização do plano odontológico pelos danos materiais, morais e estéticos sofridos pela autora em razão da falha técnica do cirurgião-dentista credenciado, eis que, por se tratar de obrigação de resultado, “tendo a autora demonstrado não ter sido atingida a meta avençada, há presunção de culpa do profissional, com a consequente inversão do ônus da prova, cabendo ao réu demonstrar que não agiu com negligência, imprudência ou imperícia, ou mesmo que o insucesso se deu em decorrência de culpa exclusiva da autora” (STJ, REsp nº 1238746/MS, 4ª Turma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 18.10.2011, DJe 4.11.2011).

Considerando que a demandante demonstrou o dano e o nexo causal por meio da juntada dos recibos, que comprovam o adimplemento das mensalidades e indicam regular comparecimento às consultas agendadas (fls. 24/52), do laudo do ortodontista particular, que constatou a necessidade de nova terapêutica pelo período estimado de setenta e dois (72) meses (fls. 63 e 142) e das fotos anteriores e posteriores ao tratamento (fls. 23, 55/56 e 59/62), bem como que o réu não se desincumbiu de afastar a presunção relativa de culpa, comprovando que a conduta da profissional credenciada não foi imprudente, negligente ou imperita ou que os danos advieram de culpa exclusiva da autora (CPC, art. 373, inciso II), ressai clarividente sua obrigação de arcar com os custos do tratamento corretivo (CC, art. 949), como também de ressarcir o montante dispendido com o pagamento do convênio (fls. 24/52), porquanto tinha por objeto tão somente o acompanhamento clínico ortodôntico (fls. 17/18).

Nesse sentido, colaciono as seguintes ementas de julgado:

APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL, AÇÕES DE EXECUÇÃO E EMBARGOS À EXECUÇÃO. APELOS DA AUTORA E DO RÉU. IMPLANTE ORTODÔNTICO. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. PREJUÍZO ESTÉTICO. PEDIDO EXORDIAL PROCEDENTE. DANOS MATERIAIS E DANOS MORAIS. INDENIZAÇÃO. DEU-SE PROVIMENTO AO APELO DA AUTORA. APELOS DO RÉU IMPROVIDOS. 1. O implante ortodôntico com fins estéticos constitui obrigação de resultado que profissional prestador do serviço se obriga a alcançar, sob pena de responsabilidade civil. Não alcançado o resultado, é cabível a rescisão contratual, com a consequente devolução dos valores pagos. 2. O abalo emocional causado pela imperfeição estética das próteses implantadas implica o reconhecimento de dano moral indenizável, fixado em valor compatível com as condições pessoais das partes, a extensão do dano e o grau de culpa do réu. 4. Deu-se provimento ao apelo da autora, para julgar procedente o pedido exordial e condenar o réu no pagamento de danos morais e materiais e a suportar integralmente os ônus sucumbenciais. 5. Negou-se provimento aos apelos do réu. (TJDF, Ap. Cível nº 2012011107364700129802-54.2012.8.07.0001, 4ª Turma Cível, Rel. Sérgio Rocha, j. 7.12.2016, DJe 26.1.2017). (destaquei).

CONSUMIDOR. PLANO ODONTOLÓGICO. COLOCAÇÃO DE IMPLANTES. AUSÊNCIA DE COMPLEXIDADE. EXAME RADIOGRÁFICO QUE DEMONSTRA O MAU POSICIONAMENTO DOS IMPLANTES. FALHA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO CONFIGURADA. DIREITO AO RESSARCIMENTO DOS VALORES PAGOS. SENTENÇA MANTIDA. Não há cogitar de complexidade da causa. Os elementos contidos nos autos são suficientes para o justo e adequado julgamento do processo, inexistindo necessidade de produção de prova pericial. O exame radiográfico (fl. 32) demonstra o mau posicionamento dos implantes, confortando a tese da autora. A ré, por sua vez, além de não impugnar o exame, não produziu qualquer prova de que o defeito inexiste. Para isso, poderia ter juntado laudo técnico emitido pelos profissionais que atenderam a autora. Porém, optou por não produzir qualquer prova, devendo suportar o ônus de sua desídia. Uma vez demonstrada a falha da prestação do serviço, não sanada nem mesmo durante o período em que o processo restou suspenso para esse fim, é impositiva a restituição integral dos valores pagos, inclusive os referentes ao plano, já que este foi contratado exclusivamente para viabilizar a colocação dos implantes. Sentença mantida por seus próprios fundamentos, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95. RECURSO IMPROVIDO. (TJRS, Recurso Cível nº 71003752227, 2ª Turma Recursal Cível, Rel. Alexandre de Souza Costa Pacheco, j. 8.3.2013, DJe 10.3.2013). (destaquei).

O quantum a ser pago a título de ressarcimento do tratamento corretivo deve ser apurado em liquidação de sentença pelo procedimento comum (CPC, art. 509, inciso II), haja vista a necessidade de aferir, por meio de novos elementos, os valores efetivamente dispendidos pela autora.

Relativamente aos danos morais, é evidente que a situação vivenciada pela autora lhe gerou muito mais que um simples aborrecimento, pois submeteu-se por mais de dois anos a tratamento desgastante, doloroso e totalmente ineficiente que, além de não ter atendido aos seus anseios, causou ainda mais danos à sua dentição, inclusive risco de perda de cinco dentes, bem como necessidade de novo tratamento por período aproximado de setenta e dois meses.

Patente a situação de aflição psicológica e angústia, circunstância que é efetivamente capaz de atingir negativamente a órbita extrapatrimonial da autora, como de qualquer outra pessoa que se encontrasse na mesma situação, gerando significativo prejuízo aos atributos imateriais da personalidade, o que comporta a devida compensação pecuniária (CF/1988, art. 5.º, inc. X; CDC, art. 6.º, inc. VI).

No que tange à quantificação do dano moral, entendo que o valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais) é adequado à compensação. Trata-se de valor razoável ao tipo de dano que ora se cuida e para reparação de tão caro bem jurídico (saúde), não sendo, sob esse aspecto, nem módico e nem excessivo, e que não importará em enriquecimento ilícito da autora (CC, art. 884), além de estar conforme a mais abalizada jurisprudência, a exemplo dos seguintes julgados:

APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. TRATAMENTO ORTODÔNTICO. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. DEVER DE INDENIZAR. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS FIXADA EM PATAMAR RAZOÁVEL. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS DEVIDOS AOS ADVOGADOS DA AUTORA. 1. Predomina na doutrina e na jurisprudência a orientação de que o dentista se responsabiliza pelo resultado, mormente nos procedimentos ortodônticos. 2. Restando comprovado que o tratamento realizado na autora lhe causou danos, ainda que de pequena monta e reversíveis, patente o dever de indenizar, principalmente considerando que ela terá de se submeter a retratamento ortodôntico de duração estimada de 36 (trinta e seis) meses. 3. Mostra-se justo o valor da indenização por dano moral fixado na sentença em R$3.000,00 (três mil reais), levando em conta a extensão e a reversibilidade do dano. 4. Merece reforma a sentença no que tange ao valor dos honorários advocatícios devidos aos patronos da autora, apelante adesiva, devendo ser majorado para 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, dado o tempo de duração do processo - aproximadamente 6 (seis) anos -, a natureza da causa e o trabalho por eles realizado. 5. Apelação cível conhecida e desprovida; recurso adesivo conhecido e parcialmente provido (TJES, Ap. Cível nº 0011994-86.2006.8.08.0011, 3ª Câmara Cível, Rel. Dair José Bregunce de Oliveira, j. 16.10.2012, DJe 26.10.2012). (destaquei).

ERRO MÉDICO – TRATAMENTO ORTODÔNTICO – OBRIGAÇÃO PREDOMINANTEMENTE DE RESULTADO – PROVA PERICIAL QUE APONTA DA FALHA NO TRATAMENTO – LAUDO CONCLUSIVO - MALPRACTICE REVELADA – DANO MORAL FIXADO SEM MODERAÇÃO – ADEQUAÇÃO REALIZADA – MAIS VERBAS MANTIDAS -SENTENÇA REFORMADA EM PARTE – APELO PARCIALMENTE PROVIDO (TJSP, Ap. Cível nº 10034216920158260223/SP, 2ª Câmara de Direito Privado, Rel. Giffoni Ferreira, j. 20.3.2018, DJe 20.3.2018) (Nota: valor da indenização por danos morais – R$ 5.000,00).

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. TRATAMENTO DENTÁRIO. UTILIZAÇÃO DE APARELHO ORTODÔNTICO PARA CORRIGIR DISFUNÇÃO TEMPOROMANDIBULAR. DORES OROFACIAIS. ALTERAÇÃO DA POSIÇÃO LABIAL. EXTRAÇÃO DESNECESSÁRIA DE DENTES. PROVA PERICIAL INDICANDO FALHA NA EXECUÇÃO DO SERVIÇO CONTRATADO. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO DO DENTISTA. DEVER DE INDENIZAR CARACTERIZADO. A responsabilidade civil das clínicas no contrato de prestação de serviços odontológicos é objetiva, segundo o “caput” do art. 14 do CDC, enquanto a responsabilidade do profissional dentista é subjetiva, nos termos do § 4º do art. 14 do CDC. A obrigação do cirurgião-dentista, ao realizar implante de aparelho ortodôntico, é de resultado, eis que há expectativa de resultado satisfatório. A autora apresentava Disfunção Temporomandibular, e realizou tratamento ortodôntico prolongado e inexitoso, no qual houve extração desnecessária de dois dentes. Laudo pericial apontando falha na prestação do serviço. Necessidade de novo tratamento ortodôntico, conforme planejamento feito por outro ortodontista. A falta de resolutividade e a falha na execução do procedimento ortodôntico enseja o dever de reparar o dano. DANOS MORAIS IN RE IPSA. Dano moral “in re ipsa”, dispensando a prova do efetivo prejuízo sofrido pela vítima em face do evento danoso. ARBITRAMENTO DO “QUANTUM” INDENIZATÓRIO. VALOR REDUZIDO. DEMORA NO AJUIZAMENTO DA AÇÃO. INDICATIVO QUE O FATO NÃO ALCANÇOU REPERCUSSÃO MUITO SIGNIFICATIVA NO ÍNTIMO DA AUTORA. Montante da indenização reduzido em atenção aos critérios de proporcionalidade e razoabilidade, bem assim às peculiaridades do caso concreto. Toma-se em conta parâmetros adotados pelo Colegiado em situações similares. APELO PARCIALMENTE PROVIDO (TJRS, Ap. Cível nº 70060521903/RS, 9ª Câmara Cível, Rel. Miguel Ângelo da Silva, j. 30.9.2015, DJe 2.10.2015). (Nota: valor da indenização por danos morais – R$ 10.000,00)

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ERRO NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ODONTOLÓGICOS. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. FUNDAMENTO NÃO ATACADO. SÚMULA 283 STF. APLICAÇÃO. DANO MORAL. CARACTERIZAÇÃO E VALOR. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. Com efeito, no tocante à comprovação do dano moral sofrido pela parte recorrida, elidir as conclusões do aresto impugnado demandaria o revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos, providência vedada nesta sede especial a teor da Súmula 07/STJ. Quanto ao valor fixado a título de indenização por danos morais e estéticos, também não pode ser dado provimento à pretensão recursal em virtude da incidência do óbice da Súmula 7 deste Superior Tribunal de Justiça. É cediço que a intervenção desta Corte Superior para modificação do quantum indenizatório somente é admitida em situações de arbitramento ínfimo ou exagerado. Esta, porém, não é a hipótese dos autos. O valor fixado a título de indenização por danos morais e estéticos em 20 (vinte) salários mínimos, vigentes na data da sentença, não escapa à razoabilidade, nem se distancia do bom senso e dos critérios recomendados pela doutrina e pela jurisprudência desta Corte. (STJ, AREsp nº 1050763/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, DJe 9.11.2017). (destaquei).

No que tange à vindicada indenização pelos danos estéticos sofridos, assinalo, inicialmente, que a sua cumulação com indenização a título de reparação por danos morais é permitida, ainda que decorrentes do mesmo fato, quando passíveis de identificação em separado, nos termos da Súmula nº 387 do Superior Tribunal de Justiça.

Como sabido, para que o dano estético se configure, a vítima deve apresentar alguma sequela ou deformidade como decorrência do ato lesivo imputado ao ofensor, estando, pois, diretamente relacionado a uma alteração na aparência, capaz de causar desgosto, complexos e abalo à autoestima da vítima.

No caso em testilha, não há dúvidas da coexistência dos referidos danos, na medida em que o sofrimento e a dor causados à autora por submeter-se por longo período a tratamento dentário ineficaz e prejudicial não se confundem com aqueles decorrentes do comprometimento de sua estética pelo grave desalinhamento dos dentes, área de grande exposição ao público e que reflete em sua imagem e harmonia facial, conforme se observa das fotografias de folhas 55/56 e 59/62.
Assim, arbitro o valor da indenização pelos danos estéticos em R$ 4.000,00 (quatro mil reais), valendo-me, neste particular, do parâmetro utilizado pelos tribunais pátrios no julgamento de casos semelhantes:

Apelação Cível. Acidente de trânsito. Perda de dente. Danos morais configurados, condenação de R$ 10.000,00. Danos estéticos fixados em R$ 6.000,00. Sentença que merece ser mantida. Jurisprudência do TJRJ. Nos termos do art. 577, caput, do Código de Processo Civil nega-se seguimento ao recurso (TJRJ, Ap. Cível nº 00175014920118190204, 27ª Câmara Cível, Rel. Des. Maria Aglae Tedesco Vilardo, j. 21.10.2015, DJe 26.10.2015). (destaquei).

APELAÇÃO CÍVEL. Responsabilidade civil. Tratamento dentário ineficiente. Ilegitimidade da clínica não configura. Culpa do profissional reconhecida. Dano material, moral e estético: cabimento. - Clínica que responde pelos prejuízos causados a consumidor por profissional a ela vinculado. Ficha de atendimento a indicar a prestação de serviço pelo consultório odontológico demandado. - Prova que demonstra o erro no procedimento levado a cabo pelo réu Cassidi. Perícia judicial que concluiu pela incompatibilidade da prótese disponibilizada ao autor. Profissional dentista extraiu os dentes do paciente sem que realizasse qualquer exame para atestar sua necessidade. - Responsabilidade do profissional liberal presente. Danos material, moral e estético ocorrentes. - Dano material que abrange a restituição do valor pago pelo tratamento ineficiente. - Prejuízo extrapatrimonial. Circunstância que ultrapassa o mero dissabor. Valor majorado para R$ 15.000,00 (quinze mil reais). - Dano estético. Ocorrência. Fotografia que atesta a presença de lesão permanente à harmonia corporal do demandante. Retirada de quatro dentes. Montante compensatório fixado em R$ 7.000,00 (sete mil reais), levando-se em conta as circunstâncias do caso (TJRS, Ap. Cível nº 70077293371, 10ª Câmara Cível, Rel. Jorge Alberto Schreiner Pestana, j. 26.7.2018, DJe 2.8.2018). (destaquei).

Correção monetária e juros. Taxa SELIC. Precedentes STJ e TJES.

Consoante orientação jurisprudencial, o termo inicial dos juros de mora, na responsabilidade contratual, é a data da citação, nos termos do art. 405 do CCB. (REsp 1621375/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, STJ-3ª T., j. 19.9.2017, DJe 26.9.2017).

Desse modo, como a presente causa trata de responsabilidade contratual de plano odontológico, tanto o valor da indenização dos danos materiais, quanto o valor da indenização dos danos morais e estéticos têm como termo inicial de fluência de juros de mora: a data da citação, que, no caso, aperfeiçoou-se com a juntada do aviso de recebimento da carta de citação, em 10 de dezembro de 2009 (fl. 71).

A correção monetária dos valores dos danos materiais incide a partir da data do prejuízo (STJ, Súmula nº 43), que, concretamente, deu-se: (a) relativamente ao montante dispendido com o plano de saúde, na data do pagamento de cada mensalidade (fls. 24/52); (b) quanto ao ressarcimento dos curtos do tratamento corretivo, na data de cada desembolso, a ser comprovada em liquidação de sentença.

Por sua vez, “A correção monetária das importâncias fixadas a título de danos morais e estéticos ‘incide desde a data do arbitramento’ (Enunciado n. 362 da Súmula do STJ)” (REsp 934.969/SP, Rel. Ministro Antônio Carlos Ferreira, 4ª T., j. 24.4.2014, DJe 10.11.2014).

Quanto ao índice a ser utilizado para correção monetária e juros de mora, o Superior Tribunal de Justiça tem sufragado o entendimento de que nas condenações posteriores à entrada em vigor do Código Civil de 2002, deve-se aplicar a taxa SELIC, que é composta de juros moratórios e de correção monetária. (AgRg no AREsp 776.698/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 3ª T., j. 1.3.2016, DJe 8.3.2016).

Como a taxa SELIC é, a um só tempo, fator de correção monetária e pagamento de juros de mora, há particularidades do caso que precisam ser consideradas, em virtude da diversidade de termos iniciais de correção monetária e de juros de mora, sob pena de se onerar o devedor ou desfalcar o credor.

Como solução de ajuste, “[...] para a obtenção da ‘taxa de juros real’ – a taxa equivalente ao aumento real do capital, excluída a simples atualização da moeda – é necessário abater da taxa do SELIC o índice correspondente à inflação.”3

Desse modo, no tocante aos danos morais e estéticos, a partir da data da citação fluirá juros legais até a data da fixação da indenização, calculado pela taxa SELIC, mas com a dedução da correção monetária que nela se contém, pelo abatimento do índice do INPCIBGE do mesmo período. A partir da data da fixação do valor da indenização dos danos morais e estéticos, incidirá a taxa SELIC integralmente, como fator de correção monetária e juros moratórios.

Relativamente aos danos materiais concernentes ao pagamento das mensalidades do plano odontológico, há de se colmatar o período entre o efetivo desembolso do gasto a ser ressarcido e a data da citação, a partir de quando a utilização da taxa SELIC se impõe tanto para manter atualizado o valor (correção monetária) quanto para remunerar a mora (juros de mora). Sobre esse ponto, tomando como paradigma a jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça Capixaba, deve ser corrigido monetariamente a partir de cada desembolso ilegal pelo índice do INPC⁄IBGE (índice adotado pela Corregedoria Geral de Justiça do Estado do Espírito Santo) até a citação e, a partir de então, atualizado apenas pela Taxa Referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic), na qual já se inclui também a remuneração dos juros de mora (TJES, Ap. Cív. 24120209069, Rel. Des. Fabio Clem de Oliveira, 1ª Câm. Cív., j. 4.7.2017, DJe 28.7.2017).

No tocante às despesas com o novo tratamento, os valores pagos antes da citação serão atualizados do mesmo modo, corrigindo-se monetariamente a partir de cada desembolso ilegal pelo índice do INPC⁄IBGE, até a citação e, a partir de então, atualizado apenas pela aplicação da Taxa Selic. Quanto aos desembolsos realizados posteriormente, a partir da data da citação fluirá juros legais até a data do efetivo prejuízo, calculado pela taxa SELIC, mas com a dedução da correção monetária que nela se contém, pelo abatimento do índice do INPC-IBGE do mesmo período. A partir da data do efetivo prejuízo incidirá a taxa SELIC integralmente, como fator de correção monetária e juros moratórios.

Dispositivo.

Ante o expendido, julgo procedente os pedidos autoras para condenar o demandado: (a) ao ressarcimento do montante dispendido com o novo tratamento, a ser apurado em liquidação de sentença pelo procedimento comum; (b) à restituição dos valores pagos pela contratação do plano de saúde (fls. 24/52), em valor a ser aferido por cálculos aritméticos; (c) ao pagamento da importância de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de danos morais e estéticos.

Sobre tais condenações deverão incidir correção monetária e juros de mora, de acordo com os critérios, índices e termos indicados no capítulo anterior, que passam a integrar este capítulo dispositivo.

Dou por meritoriamente resolvida a causa (CPC, art. 487, inc. I).

Por força da sucumbência, condeno o réu ao pagamento das despesas processuais e da verba honorária de sucumbência que arbitro em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, tendo em vista o trabalho dos patronos, o lugar de prestação do serviço, a natureza e importância da causa e o tempo de tramitação do feito (CPC, art. 85, § 2º).

Ressalto que a demanda fora ajuizada na vigência do Código de Processo Civil de 1973 e contemporânea à “vigência” do verbete sumular nº 326 do Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual: “Na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca”.

P. R. I.

Vitória-ES, 11 de outubro de 2018.

JÚLIO CÉSAR BABILON
Juiz de Direito