*Por Thiago Crepaldi
Criado para uniformizar as decisões das instâncias inferiores, o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas não gerou o efeito desejado quanto a um tema sensível na Seção de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, os reajustes nas mensalidades dos planos de saúde.
Em novembro do ano passado, a Turma Especial da Subseção de Direito Privado I julgou o IRDR 0043940-25.2017.8.26.0000 sobre a validade da cláusula de contrato coletivo de plano de saúde (empresarial ou por adesão) que prevê reajuste por mudança de faixa etária aos 59 anos de idade.
Seguindo a mesma orientação dada em recurso repetitivo do Superior Tribunal de Justiça nos planos individuais e familiares, a turma do TJ-SP definiu, em uma das duas teses: É válido, em tese, o reajuste por mudança de faixa etária aos 59 anos de idade, nos contratos coletivos de plano de saúde (empresarial ou por adesão), celebrados a partir de 1/1/2004 ou adaptados à Resolução 63/03, da ANS, desde que (I) previsto em cláusula contratual clara, expressa e inteligível, contendo as faixas etárias e os percentuais aplicáveis a cada uma delas, (II) estes estejam em consonância com a Resolução 63/03, da ANS, e (III) não sejam aplicados percentuais desarrazoados que, concretamente e sem base atuarial idônea, onerem excessivamente o consumidor ou discriminem o idoso.
De acordo com a decisão, os três critérios observados precisam ser cumulativos para se aceitar o reajuste imposto. Mas decisões de algumas câmaras, contudo, não tem observado os requisitos de forma conjunta.
Em março de 2019, a 3ª Câmara de Direito Privado reformou sentença que reduzia reajuste de 131,73% aplicado a um usuário por entender que seguiu a resolução 63 da ANS. O relator, desembargador Carlos Alberto Salles, faz a análise apenas em relação aos dois primeiros requisitos, previsão contratual e respeito às normas da ANS, mas quando menciona o terceiro requisito, que seria apreciar a razoabilidade do reajuste, alega que se respeita a resolução o reajuste seria razoável.
Assim, Salles não enfrentou o terceiro requisito do IRDR e julga pela validade do reajuste por faixa etária. No caso, entre 49 e 53 anos de idade do usuário, foi aplicado reajuste de 1,6%, entre 54 e 58 anos, de 4,06%, para daí se aplicar o percentual de 131,73% aos 59 anos, última faixa etária possível de aumento.
Já no caso relatado pela desembargadora Mary Grun, da 7ª Câmara de Direito Privado, também julgado em março, foi acolhido recurso de operadora e reformada a sentença que havia julgado reajuste de 88% como excessivo.
Também existe uma análise dos três requisitos do IRDR, há também a constatação da abusividade do reajuste pela câmara, em desconformidade com o item três do IRDR, porém nesse caso foi substituído pelo painel de precificação da ANS, uma solução diversa do caso anterior.
“Assim, partindo de uma base de dados ampla, observa-se que o aproximado incremento do risco com o aumento da idade na última faixa é de 48,40%, muito abaixo do aumento questionado in casu (88,38%), que é, portanto, abusivo”, concluiu a relatora, mantendo a restituição das quantias pagas a maior.
De relatoria do desembargador J. B. Paula Lima, a 10ª Câmara de Direito Privado reformou, em dezembro do ano passado, decisão que aplicava 131,61%.de reajuste no aniversário de 59 anos de um beneficiário de plano.
A decisão exclui os reajustes, por serem desarrazoados e onerosos aos beneficiários, sendo interpretado todos os requisitos do IRDR. O desembargador enxerga que não existe um equilíbrio na distribuição das faixas etárias anteriores e aplica os reajustes fixados pela ANS.
“A abusividade é manifesta, já que as rés tencionaram majorar excessivamente o valor da mensalidade no aniversário de 59 anos dos autores, deixando de distribuir equitativa e razoavelmente os reajustes nas diversas faixas etárias previstas, como era de rigor a fim de evitar o evidente dano à consumidora”, afirmou.
Continua o magistrado: “Veja-se que em diversas faixas etárias anteriores houve previsão irrisória de reajuste, a exemplo de 24 a 28 anos (2,72%), de 29 a 33 anos (1,68%), de 34 a 38 anos (3,03%), de 39 a 43 anos (1,37%), de 49 a 53 anos (1,60%), concentrando indevidamente o expressivo reajuste de 131,73% nos 59 anos”.
E conclui: “Nada justificava a conduta das rés ao prever as faixas etárias no contrato, mas deixar de distribuir proporcionalmente os percentuais de reajustes, conduta essa que é de ser coibida por abusiva, ilegal e contrária às teses sedimentadas pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Tribunal de Justiça”.
1003835-87.2016.8.26.0011
1011980-17.2016.8.26.0114
1019329-16.2016.8.26.0100
Fonte: Revista Consultor Jurídico (https://www.conjur.com.br/2019-mar-18/reajuste-plano-saude-ainda-solucoes-diferentes-tj-sp)
Espaço para informação sobre temas relacionados ao direito médico, odontológico, da saúde e bioética.
- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.