CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA
RESOLUÇÃO CFM Nº 2.174, DE 14 DE DEZEMBRO DE 2017
Diário Oficial da União; Poder Executivo, Brasília, DF, 27 fev. 2018. Seção I, p.82-84
REVOGA A RESOLUÇÃO CFM Nº 1.802, DE 04-10-2006
Dispõe sobre a prática do ato anestésico e revoga a Resolução CFM nº 1.802/2006.
O CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, no uso das atribuições conferidas pela Lei nº 3.268, de 30 de setembro de 1957, regulamentada pelo Decreto nº 44.045, de 19 de julho de 1958, e pela Lei nº 11.000, de 15 de dezembro de 2004, e
CONSIDERANDO que é dever do médico guardar absoluto respeito pela vida humana, não podendo, em nenhuma circunstância, praticar atos que a afetem ou concorram para prejudicá-la;
CONSIDERANDO que o alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional;
CONSIDERANDO que o médico deve aprimorar e atualizar continuamente seus conhecimentos e usar o melhor do progresso científico em benefício do paciente;
CONSIDERANDO que não é permitido ao médico deixar de ministrar tratamento ou assistência ao paciente, salvo nas condições previstas pelo Código de Ética Médica;
CONSIDERANDO a Resolução da Diretoria Colegiada da Anvisa nº 50, de 21 de fevereiro de 2002, que dispõe sobre o Regulamento Técnico para planejamento, programação, elaboração e avaliação de projetos físicos de estabelecimentos assistenciais de saúde, em especial, salas de indução e recuperação pós-anestésica;
CONSIDERANDO a Portaria GM/MS nº 529/2013, que instituiu o Programa Nacional de Segurança do Paciente (PNSP), que tem o objetivo de contribuir para a qualificação do cuidado em saúde em todos os estabelecimentos de saúde do território nacional;
CONSIDERANDO a RDC nº 36/2013, da Anvisa, que institui ações para a segurança do paciente em serviços de saúde, regulamenta e coloca pontos básicos para a segurança do paciente, como Núcleos de Segurança do Paciente, a obrigatoriedade da Notificação dos eventos adversos e a elaboração do Plano de Segurança do Paciente;
CONSIDERANDO a Resolução CFM nº 2.147/2016, que determina que a responsabilidade pelas condições mínimas de segurança e pelo cumprimento das disposições legais e regulamentares em vigor é do diretor técnico;
CONSIDERANDO a necessidade de observância dos critérios definidos no Parecer CFM nº 30/2016, que trata da monitorização da atividade elétrica do sistema nervoso central;
CONSIDERANDO a necessidade de atualização e modernização da prática do ato anestésico; e
CONSIDERANDO, finalmente, o decidido em sessão plenária de 14 de dezembro de 2017; resolve:
Art. 1º Determinar aos médicos anestesistas que:
I - Antes da realização de qualquer anestesia, exceto nas situações de urgência e emergência, é indispensável conhecer, com a devida antecedência, as condições clínicas do paciente, cabendo ao médico anestesista decidir sobre a realização ou não do ato anestésico.
a) Para os procedimentos eletivos, recomenda-se que a consulta pré-anestésica do paciente seja realizada em consultório médico, antes da admissão na unidade hospitalar, sendo que nesta ocasião o médico anestesista poderá solicitar exames complementares e/ou avaliação por outros especialistas, desde que baseado na condição clínica do paciente e no procedimento proposto.
b) Não sendo possível a realização da consulta préanestésica, o médico anestesista deve proceder à avaliação préanestésica do paciente, antes da sua admissão no centro cirúrgico, podendo nesta ocasião solicitar exames complementares e/ou avaliação por outros especialistas, desde que baseado na condição clínica do paciente e no procedimento proposto.
c) O médico anestesista que realizar a consulta préanestésica ou a avaliação pré-anestésica poderá não ser o mesmo que administrará a anestesia.
II - Para conduzir as anestesias gerais ou regionais com segurança, o médico anestesista deve permanecer dentro da sala do procedimento, mantendo vigilância permanente, assistindo o paciente até o término do ato anestésico.
III - A documentação mínima dos procedimentos anestésicos deverá incluir obrigatoriamente informações relativas à avaliação e prescrição pré-anestésicas, evolução clínica e tratamento intra e pósanestésico (ANEXOS I, II, III e IV).
IV - É vedada a realização de anestesias simultâneas em pacientes distintos, pelo mesmo profissional ao mesmo tempo.
V - Para a prática da anestesia, deve o médico anestesista responsável avaliar e definir previamente, na forma prevista no artigo 2º, o risco do procedimento cirúrgico, o risco do paciente e as condições de segurança do ambiente cirúrgico e da sala de recuperação pós-anestésica, sendo sua incumbência certificar-se da existência das condições mínimas de segurança antes da realização do ato anestésico, comunicando qualquer irregularidade ao diretor técnico da instituição e, quando necessário, à Comissão de Ética Médica ou ao Conselho Regional de Medicina (CRM).
VI - Caso o médico anestesista responsável verifique não existirem as condições mínimas de segurança para a prática do ato anestésico, pode ele suspender a realização do procedimento até que tais inconformidades sejam sanadas, salvo em casos de urgência ou emergência nos quais o atraso no procedimento acarretará em maiores riscos ao paciente do que a realização do ato anestésico em condições não satisfatórias. Em qualquer uma destas situações, deverá o médico anestesista responsável registrar no prontuário médico e informar o ocorrido por escrito ao diretor técnico da instituição e, se necessário, à Comissão de Ética Médica ou ao Conselho Regional de Medicina (CRM).
Art. 2º É responsabilidade do diretor técnico da instituição, nos termos da Resolução CFM nº 2.147/2016, assegurar as condições mínimas para a realização da anestesia com segurança, as quais devem ser definidas previamente entre: o médico anestesista responsável, o serviço de anestesia e o diretor técnico da instituição hospitalar, com observância das exigências previstas no artigo 3º da presente Resolução.
Art. 3º Entende-se por condições mínimas de segurança para a prática da anestesia a disponibilidade de:
I - Monitorização do paciente, incluindo:
a) Determinação da pressão arterial e dos batimentos cardíacos;
b) Determinação contínua do ritmo cardíaco por meio de cardioscopia; e
c) Determinação da temperatura e dos meios para assegurar a normotermia, em procedimentos com duração superior a 60 (sessenta) minutos e, nas condições de alto risco, independentemente do tempo do procedimento (prematuros, recém-nascidos, história anterior ou risco de hipertermia maligna e síndromes neurolépticas).
II - Monitorização contínua da saturação da hemoglobina por meio de oximetria de pulso;
III - Monitorização contínua da ventilação, incluindo os teores de gás carbônico exalados, monitorados por capnógrafo, nas seguintes situações: anestesia sob via aérea artificial (como intubação traqueal, brônquica ou dispositivo supraglótico) e/ou ventilação artificial e/ou exposição a agentes capazes de desencadear hipertermia maligna; e
IV - Equipamentos obrigatórios (ANEXO VI), instrumental e materiais (ANEXO VIII) e fármacos (ANEXO IX) que permitam a realização de qualquer ato anestésico com segurança, assim como a realização de procedimentos técnicos da equipe voltados à reanimação cardiorrespiratória.
Art. 4º Diante da necessidade de implementação de medidas preventivas voltadas à redução de riscos e ao aumento da segurança do ato anestésico, recomenda-se aos médicos anestesistas observar os critérios clínicos de gravidade:
a) da monitorização do bloqueio neuromuscular, para pacientes submetidos a anestesia geral, com uso de bloqueadores neuromusculares;
b) da monitorização da profundidade da anestesia, com o uso de monitores da atividade elétrica do sistema nervoso central, em pacientes definidos no Parecer CFM nº 30/16;
c) da monitorização hemodinâmica avançada (pressão arterial invasiva, pressão venosa central e/ou monitorização do débito cardíaco) para pacientes de alto risco em procedimentos cirúrgicos de grande porte, e para pacientes de risco intermediário (conforme definido no ANEXO V) em procedimentos cirúrgicos e/ou intervencionistas de grande e médio porte;
d) do uso de monitores dos gases anestésicos (ar comprimido, óxido nitroso e agentes halogenados);
e) da utilização da ecocardiografia no período intraoperatório com o objetivo terapêutico hemodinâmico; e
f) dos equipamentos previstos no ANEXO VII.
Art. 5º Considerando a necessidade de implementação de medidas preventivas voltadas à redução de riscos e ao aumento da segurança sobre a prática do ato anestésico, recomenda-se que:
a) a sedação/analgesia seja realizada por médicos, preferencialmente anestesistas, ficando o acompanhamento do paciente a cargo do médico que não esteja realizando o procedimento que exige sedação/analgesia;
b) os hospitais garantam aos médicos anestesistas carga horária compatível com as exigências legais vigentes, bem como profissionais anestesistas suficientes para o atendimento da integralidade dos pacientes dos centros cirúrgicos e áreas remotas ao centro cirúrgico;
c) os hospitais mantenham um médico anestesista nas salas de recuperação pós-anestésica para cuidado e supervisão dos pacientes;
d) o Registro dos Eventos Adversos em Anestesia, alinhado com o Programa Nacional de Segurança do Paciente, estruturado nos Comitês de Segurança institucionais, seja implementado junto com a Análise Periódica dos Eventos Adversos, na forma determinada pela RDC nº 36/2013, da Anvisa;
e) nas instituições hospitalares, os serviços ou departamentos de anestesia estruturem um Protocolo de Cuidado voltado tanto à prevenção quanto ao atendimento dos Eventos Adversos em Anestesia;
f) nas instituições de saúde onde se realizem procedimentos sob cuidados anestésicos, a implementação de um sistema de checagem de situações de risco para a anestesia; e
g) a organização e treinamento de situações críticas em anestesia, com ênfase na via aérea difícil e em eventos graves e de alto risco.
Art. 6º Após a anestesia, o paciente deverá ser removido para a sala de recuperação pós-anestésica (SRPA) ou para o Centro de Terapia Intensiva (CTI), conforme o caso, sendo necessário um médico responsável para cada um dos setores (a presença de médico anestesista na SRPA).
Art. 7º Nos casos em que o paciente for encaminhado para a SRPA, o médico anestesista responsável pelo procedimento anestésico deverá acompanhar o transporte.
§1º. Existindo médico plantonista responsável pelo atendimento dos pacientes em recuperação na SRPA, o médico anestesista responsável pelo procedimento anestésico transferirá ao plantonista a responsabilidade pelo atendimento e continuidade dos cuidados até a plena recuperação anestésica do paciente.
§2º. Não existindo médico plantonista na SRPA, caberá ao médico anestesista responsável pelo procedimento anestésico o pronto atendimento ao paciente.
§3º. Enquanto aguarda a remoção, o paciente deverá permanecer no local onde foi realizado o procedimento anestésico, sob a atenção do médico anestesista responsável pelo procedimento.
§4º. É incumbência do médico anestesista responsável pelo procedimento anestésico registrar na ficha anestésica todas as informações relevantes para a continuidade do atendimento do paciente na SRPA (ANEXOS III) pela equipe de cuidados, composta por enfermagem e médico plantonista alocados em número adequado.
§5º. A alta da SRPA é de responsabilidade exclusiva de um médico anestesista ou do plantonista da SRPA.
§6º. Na SRPA, desde a admissão até o momento da alta, os pacientes permanecerão monitorizados e avaliados clinicamente, na forma do ANEXO IV, quanto:
a) à circulação, incluindo aferição da pressão arterial e dos batimentos cardíacos e determinação contínua do ritmo cardíaco por meio da cardioscopia;
b) à respiração, incluindo determinação contínua da saturação periférica da hemoglobina;
c) ao estado de consciência;
d) à intensidade da dor;
e) ao movimento de membros inferiores e superiores pósanestesia regional;
f) ao controle da temperatura corporal e dos meios para assegurar a normotermia; e
g) ao controle de náuseas e vômitos.
Art. 8º Nos casos em que o paciente for removido para o Centro de Terapia Intensiva (CTI), o médico anestesista responsável pelo procedimento anestésico deverá acompanhar o transporte do paciente até o CTI, transferindo-o aos cuidados do médico plantonista.
§1º. É responsabilidade do médico anestesista responsável pelo procedimento anestésico registrar na ficha anestésica todas as informações relevantes para a continuidade do atendimento do paciente pelo médico plantonista do CTI (ANEXO III).
§2º. Enquanto aguarda a remoção, o paciente deverá permanecer no local onde foi realizado o procedimento anestésico, sob a atenção do médico anestesista responsável.
Art. 9º Os anexos e as listas de equipamentos, instrumentais, materiais e fármacos que obrigatoriamente devem estar disponíveis no ambiente onde se realiza qualquer anestesia e que integram esta resolução serão periodicamente revisados, podendo ser incluídos itens adicionais indicados para situações específicas.
Art. 10. Revogam-se todas as disposições em contrário, em especial a Resolução CFM nº 1.802 publicada em 1º de novembro de 2006.
Art. 11. Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação.
MAURO LUIZ DE BRITTO RIBEIRO
Presidente do Conselho
Em exercício
HENRIQUE BATISTA E SILVA
Secretário-Geral
Espaço para informação sobre temas relacionados ao direito médico, odontológico, da saúde e bioética.
- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.