PROCESSO-CONSULTA CFM nº 9.212/09 – PARECER CFM nº 21/10
INTERESSADO:
K. M.
ASSUNTO:
Atendimento médico não especializado
RELATOR:
Cons. Renato Moreira Fonseca
EMENTA: O médico devidamente inscrito no Conselho Regional de Medicina está apto ao exercício legal da medicina, em qualquer de seus ramos; no entanto, só é lícito o anúncio de especialidade médica àquele que registrou seu titulo de especialista no Conselho.
DA CONSULTA
A consulente encaminha a seguinte indagação: um médico pode realizar qualquer procedimento mesmo que não tenha feito especialização? Relata que na mídia, sempre que se noticia um caso de erro médico, a população é orientada a procurar um médico titulado.
Afirma ser usuária de plano de saúde e diante do relato quer saber como obter a garantia de que os médicos especialistas oferecidos, de fato, possuem a especialização anunciada.
DO PARECER
Ante as dúvidas suscitadas pela consulente, acho importante esclarecer, preliminarmente, o aspecto legal quanto à realização de atos médicos por profissionais diplomados e devidamente registrados nos Conselhos Regionais de Medicina, e abaixo transcrevo parte da Lei n° 3.268/57, in verbis:
“Art.17 – Os médicos só poderão exercer legalmente a medicina, em qualquer dos seus ramos ou especialidades, após o prévio registro de seus títulos, diplomas, certificados ou cartas do Ministério da Educação e Cultura e de sua inscrição no Conselho Regional de Medicina, sob cuja jurisdição se achar o local de sua atividade.” (negrito nosso)
Da mesma forma, a Constituição Federal expressa em seu artigo 5°, inciso XIII, que:
“É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer.”
No Parecer CFM n° 17/04, da lavra do conselheiro Solimar Pinheiro da Silva, firmou-se entendimento, por esta colenda Casa, conforme a ementa abaixo:
“Os Conselhos Regionais de Medicina não exigem que um médico seja especialista para trabalhar em qualquer ramo da Medicina, podendo exercê-la em sua plenitude nas mais diversas áreas, desde que se responsabilize por seus atos e, segundo a nova Resolução CFM n° 1.701/03, não as propague ou anuncie sem realmente estar nelas registrado como especialista.” (grifo nosso)
Nesse mesmo sentido manifestou-se o conselheiro Júlio César Meireles Gomes, que no Parecer CFM n° 27/95 esclarece:
“A titulação representa uma possibilidade de fomentar e estimular a especialização mediante prerrogativas culturais criadas pelas sociedades médicas sem, no entanto, dispor de força legal para o impedimento do ato médico específico para o não especialista.”
Por sua vez, o ilustre conselheiro Edson de Oliveira Andrade, no Parecer CFM n° 8/96, esboçou o seguinte entendimento, acolhido pelo CFM e que ora transcrevo:
“Nenhum especialista possui exclusividade na realização de qualquer ato médico. O título de especialista é apenas um presuntivo de ‘plus’ de conhecimento em uma determinada área da ciência médica”.
E continua:
“O conhecimento médico é usufruto da sociedade, podendo dele fazer uso o médico que estiver devidamente habilitado e/ou capacitado. Um título de especialista é apenas uma presunção desta capacitação, posto que a habilitação já está contida no próprio diploma médico”.
Na Resolução CFM n° 1.701/03 temos, então, o dispositivo normativo que estabelece critérios para a propaganda em medicina e esclarece pontos relacionados a anúncios, divulgação de assuntos médicos, sensacionalismo, autopromoção e proibições referentes à matéria. Em seu artigo 3°, impõe os seguintes cuidados ao médico:
“É vedado ao médico: a) anunciar que trata de sistemas orgânicos, órgãos ou doenças específicas, por induzir a confusão com divulgação de especialidade; b) anunciar aparelhagem de forma a que lhe atribua capacidade privilegiada; c) participar de anúncios de empresas ou produtos ligados à Medicina; d) permitir que seu nome seja incluído em propaganda enganosa de qualquer natureza; e) permitir que seu nome circule em qualquer mídia, inclusive na Internet, em matérias desprovidas de rigor científico; f) fazer propaganda de método ou técnica não aceitos pela comunidade científica; g) expor a figura de paciente seu como forma de divulgar técnica, método ou resultado de tratamento, ainda que com a autorização expressa deste, ressalvado o disposto no artigo 10 desta resolução; h) anunciar a utilização de técnicas exclusivas; i) oferecer seus serviços através de consórcio ou similares; j) garantir, prometer ou insinuar bons resultados do tratamento.” (negrito nosso)
Ademais, em seu artigo 5° e parágrafo único, há a seguinte determinação:
“Nos anúncios de clínicas, hospitais, casas de saúde, entidades de prestação de assistência médica e outras instituições de saúde, deverá constar, sempre, o nome do diretor técnico e sua correspondente inscrição no Conselho Regional em cuja jurisdição se localize o estabelecimento de saúde.
Parágrafo único. Pelos anúncios dos estabelecimentos de saúde respondem, perante o Conselho Regional de Medicina, os seus diretores técnicos.” (grifo nosso)
Portanto, de acordo com a Resolução CFM n° 1.701/03, fica claro que o anúncio de especialidade médica só pode ser realizado após o efetivo registro de qualificação do médico, em seu Conselho Regional.
CONCLUSÃO
Assim, diante da farta documentação, de caráter normativo, acostada à consulta, reafirmamos que a qualquer médico inscrito no Conselho Regional de Medicina de sua jurisdição é lícito exercer toda a medicina, devendo o mesmo pautar-se única e exclusivamente pelo Código de Ética Médica, que abrange todas as situações de responsabilidades em relação ao trabalho médico.
Quanto ao anúncio de especialidade médica, sob qualquer forma, inclusive em catálogos, placas, carimbos ou cartão profissional, só é lícito praticá-la os médicos com título de especialista devidamente registrado no Conselho Regional de Medicina (CRM), constituindo infração ética o não seguimento dessa norma.
Por conseguinte, orientamos que a consulente acesse o site deste Conselho (www.portalmédico.org.br), onde há uma área de busca por médico em todos os Conselhos Regionais de Medicina, com informações sobre a regularidade do registro profissional, bem como as qualificações registradas como especialidade.
Portanto, verificando a ocorrência de provável indício de violação dos preceitos éticos aqui referidos, a consulente pode requerer ao Conselho Regional de Medicina que adote as providências cabíveis.
Este é o parecer, SMJ.
Brasília-DF, 12 agosto de 2010
Renato Moreira Fonseca
Conselheiro relator
Fonte: CFM
Espaço para informação sobre temas relacionados ao direito médico, odontológico, da saúde e bioética.
- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.