PARECER TÉCNICO COREN-DF 01/2017
SOLICITANTE: Cassiana Arantes de Oliveira, Coren-DF 240.491-ENF.
ASSUNTO: Responsabilidade do enfermeiro ou da equipe de enfermagem de chamar médico em repouso para atender pacientes que aguardam atendimento.
DO FATO
Obrigatoriedade dos enfermeiros ou da equipe de enfermagem de chamar os profissionais médicos em repouso quando houver pacientes à espera de atendimento.
1. FUNDAMENTAÇÃO E ANÁLISE
Há muitos questionamentos, tanto em âmbito estadual quanto nacional, sobre a responsabilidade do enfermeiro ou da equipe de enfermagem de realizar o chamado do profissional médico, em horário de repouso, para atender pacientes que aguardam atendimento. Diante desse fato, faz-se necessário pesquisa na legislação pátria para encontrar a resposta adequada e formular o parecer técnico solicitado.
Não há, em nosso arcabouço legal, imposição ou dever de o profissional de enfermagem chamar médico em horário de repouso para responder pacientes que aguardam atendimento. No entanto, é parte da cultura de trabalho em muitas de nossas unidades de atendimento de saúde, senão em todas, a prática dos profissionais de saúde, em especial a equipe de enfermagem, de efetuar a referida chamada de médicos e demais profissionais da saúde para que estejam em consultórios e em atendimento durante os plantões.
Em boa hora, esse e tantos outros questionamentos chegam ao centro de debates deste Conselho Regional de Enfermagem para que sejam amplamente discutidos e se produza um entendimento – como o parecer técnico – capaz de sanar dúvidas acerca da atuação do profissional de enfermagem e demais trabalhadores da área de saúde.
Assim, este documento se fundamenta na legislação que rege a profissão de enfermagem, como a Lei 7.498, de 25 de junho de 1986, que dispõe sobre o exercício da enfermagem; a regulamentação dessa lei pelo Decreto 94.406, de 8 de junho de 1987; bem como a Resolução Cofen 311/2007, que disciplina o Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem.
Todo esse arcabouço legal tem o propósito de garantir direitos e deveres na execução do exercício profissional da enfermagem, que atua na promoção, prevenção, recuperação e reabilitação da saúde humana, com autonomia e em consonância com os preceitos éticos e legais.
É necessário destacar que tanto a Lei 7.498/1986 quanto o Decreto 94.406/1987 não fazem menção expressa à obrigatoriedade do enfermeiro, técnico ou auxiliar de enfermagem de chamar o médico plantonista quando há pacientes aguardando atendimento.
Ao se referir às atividades que devem ser desempenhadas privativamente pelos enfermeiros, o artigo 11 da Lei 7.498/1986, ratificado pelo artigo 8º do Decreto 94.406/1987, determina que lhes cabe: a direção do órgão de enfermagem integrante da estrutura básica da instituição de saúde, pública ou privada, e chefia do serviço e de unidade de enfermagem; consultoria, auditoria e emissão de parecer sobre matéria de enfermagem; consulta de enfermagem; prescrição da assistência de enfermagem; cuidados de maior complexidade técnica e que exijam conhecimentos científicos adequados e capacidade de tomar decisões imediatas; cuidados diretos a pacientes graves com riscos de vida; assistência à parturiente e ao parto normal, entre outras atividades.
Quanto às atribuições dos técnicos e auxiliares de enfermagem, descreve os arts. 12 e 13 da Lei 7.498/1986 e confirmam os arts. 10 e 11 do Decreto 94.406/1987 que lhes cabe: participar da programação da assistência de enfermagem; executar ações assistenciais de enfermagem, exceto as privativas do enfermeiro; participar da orientação e supervisão do trabalho de enfermagem em grau auxiliar; participar da equipe de saúde; observar, reconhecer e descrever sinais e sintomas; executar açõe de tratamento simples; prestar cuidados de higiene e conforto ao paciente, entre outras funções.
Ao conjunto de trabalhadores da enfermagem, cabem, portanto, os cuidados e o comprometimento com a saúde e a qualidade de vida das pessoas, da família e da coletividade. Nessa mesma seara, temos a Resolução 370/2010 do Conselho Federal de enfermagem, que declara expressamente como dever do “profissional da enfermagem respeito à vida, à dignidade e aos direitos humanos, em todas as suas dimensões.” .
É importante atentar para o fato de que a questão levantada é fruto de questionamentos pelo país afora. Nesse sentido, há pareceres técnicos produzidos pelos conselhos regionais de enfermagem de São Paulo, Goiás, Sergipe, Paraíba e Tocantins. Entre os entendimentos desses colegiados, destaque para o Parecer Coren-GO 03/2016-CT, que sublinha que “não compete ao profissional de enfermagem chamar o médico no repouso para atender pacientes em espera, pois todos os profissionais devem permanecer em seu posto de trabalho durante o plantão, respeitando o revezamento”.
É sempre de bom alvitre recordar que a Resolução Cofen 311/2007, que dispõe sobre o Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem, destaca a responsabilidade e deveres desses profissionais, orientando em seu artigo 1º que “o profissional de enfermagem deve exercer a enfermagem com liberdade, autonomia e ser tratado segundo os pressupostos e princípios legais, éticos e dos direitos humanos”.
Desse modo, é relevante afirmar que ao enfermeiro cabe respeitar a dignidade e os direitos humanos, em todas as suas dimensões, baseando seu trabalho em uma política de humanização e respeito mútuo, tanto nas relações com os demais profissionais de saúde quanto com os pacientes e seus familiares.
Também são deveres da equipe de enfermagem, conforme estabelece a Resolução Cofen 311/2007:
assegurar à pessoa, à família e à coletividade assistência de enfermagem livre de danos decorrentes de imperícia, negligência ou imprudência, bem como avaliar criteriosamente também sua competência técnica, científica e ética e somente aceitar encargos ou atribuições, quando capaz de desempenho seguro para si e para outrem.
2. CONCLUSÃO
Ante o exposto, o parecer técnico do Conselho Regional de Enfermagem do Distrito Federal é que não compete ao enfermeiro – tampouco a qualquer outro profissional da área – chamar o médico no horário de repouso para atender pacientes que aguardam atendimento.
Todos os profissionais da saúde devem ser conscientes e cientes de suas atribuições e se fazerem presentes nas escalas de plantão. Devem estar disponíveis em seus postos de trabalho, respeitando o revezamento de descanso, sem, com isso, deixar desamparado quem procura atendimento nos estabelecimentos de saúde.
Casos rotineiros e previsíveis de atendimento de saúde não devem servir de motivo para imposição de responsabilidades a enfermeiros e demais profissionais de enfermagem, sob pena de estarmos atribuindo competências para além do que determina o ordenamento legal e jurídico.
Em situações caracterizadas como atendimento de emergência, a responsabilidade de comunicar o médico torna-se de todos os profissionais de saúde envolvidos na assistência ao paciente. O profissional de saúde deve efetuar o registro do chamado com data, local e horário.
Oportuno registrar ainda que as relações entre profissionais de saúde devem ser pautadas pelo respeito e responsabilidade para com a vida, motivo pelo qual comungamos do entendimento de que os profissionais de enfermagem têm na saúde e nos pacientes o fim último da sua atividade laboral.
É o parecer.
Brasília, 05 de abril de 2017.
Francisco Ferreira Filho
Coren-DF 142.589-ENF
Membro da CTA – Coren-DF
Cleidson de Sá Alves
Coren-DF 345.144-TE
Conselheiro
Parecer aprovado na 493ª Reunião Ordinária de Plenário do Conselho Regional de Enfermagem do Distrito Federal, realizada em 31 de maio de 2017.
Espaço para informação sobre temas relacionados ao direito médico, odontológico, da saúde e bioética.
- MARCOS COLTRI
- Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.