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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador ajunto do Mestrado em Direito Médico e Odontológico da São Leopoldo Mandic. Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Por que os pacientes preferem demandar em face da pessoa jurídica?

A pergunta acima formulada comumente é feita pelos representantes de Hospitais, Clínicas, etc. quando recebem citações de processos em que a reclamação do paciente versa única e exclusivamente sobre determinado ato médico praticado no interior destes estabelecimentos.

Antes de tudo, deve-se ressaltar que estamos tratando apenas e tão somente das demandas em que o paciente ficou insatisfeito com o serviço realizado pelo médico que o atendeu. Ou seja, não se está analisando as demandas em que poderia ter ocorrido algum defeito na prestação do serviço pela própria pessoa jurídica.

Tendo em vista o atual quadro, podemos afirmar que a inclusão da pessoa jurídica possui razões derivadas de fundamentos diversos, devendo-se ressaltar o fundamento legal e o fundamento econômico.

Primeiramente, as pessoas jurídicas são incluídas no pólo passivo das ações judiciais porque a legislação assim permite. Tal permissão decorre do disposto nos artigos 7º, parágrafo único e 25, §1º do Código de Defesa do Consumidor; e 932, inciso III do Código Civil e Súmula 341 do Supremo Tribunal Federal, dentre outros.

A Súmula e o Código Civil afirmam, resumidamente, que o empregador é responsável pelos danos causados pelos empregados. Por sua vez, o Código de Defesa do Consumidor dispõe que todos os integrantes da cadeia de prestadores de serviço são responsáveis solidariamente.

Assim, a legislação nacional admite que as ações sejam propostas em face das pessoas jurídicas, eis que estas respondem solidariamente pelos danos causados pelos profissionais que atuam em suas dependências.

Questão interessante que será objeto de análise futura refere-se ao alcance da norma que determina que a solidariedade entre os profissionais e as pessoas jurídicas, conforme exemplo abaixo.

A pessoa jurídica é responsável pelos atos praticados por profissional que apenas utiliza as dependências, sem possuir relação de trabalho ou de subordinação entre eles? Exemplo disso ocorre quando o paciente procura um determinado médico para a realização de certo ato cirúrgico. Este ato cirúrgico poderia ser realizado no Hospital A, no B ou no C. A escolha é que seja feito no Hospital A. Acontecendo o defeito na prestação do serviço, este hospital responde solidariamente?

Importante salientar que não é necessária a inclusão do profissional no pólo passivo da demanda. Isto é, uma vez que o paciente entenda que efetivamente existe a solidariedade no caso concreto, a ação pode ser proposta somente em face da pessoa jurídica.

Isso se torna possível na medida em que a existência de solidariedade permite que o paciente busque a satisfação do seu direito contra um ou contra todos os prestadores do serviço, não havendo a necessidade de todos serem demandados.

Ainda sob o aspecto da legislação, outro ponto que contribui para que as ações sejam propostas em face da pessoa jurídica é a questão da natureza da responsabilidade civil.

Mister se faz esclarecer que é inegável que a prestação do serviço na área da saúde corresponde a uma relação de consumo, onde o paciente é o consumidor e o profissional e a pessoa jurídica são os prestadores de serviço.

Nosso sistema jurídico é baseado na responsabilidade subjetiva, segundo a qual, para que seja atribuída responsabilidade a uma pessoa deve ser apurada a culpa, em qualquer de suas modalidades (imperícia, imprudência ou negligência). Esta é a modalidade de responsabilidade dos profissionais liberais.

Porém, por força do disposto no caput do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, a responsabilidade das pessoas jurídicas é objetiva, isto é, independe da apuração de culpa.

Cumpre notar que, após enormes esforços, faz-se crescente na doutrina e na jurisprudência nacional o firme conceito de que, nos casos envolvendo prestação de serviço na área da saúde, em que a pessoa jurídica é demandada por ato praticado por um profissional, antes de se responsabilizar a pessoa jurídica, é necessário que se apure se o profissional agiu com culpa na prestação do serviço ao paciente.

Em suma, a alegação do paciente é que para a responsabilização das pessoas jurídicas bastam que sejam provados o dano e o nexo causal entre o dano do paciente e a conduta do prestador do serviço.

Contudo, repita-se, tem-se conseguido crescente êxito nas ações judiciais argüindo a tese da necessidade de apuração de culpa do profissional, mitigando a aparente fragilidade da pessoa jurídica nas demandas envolvem prestação de serviços na área da saúde.

Portanto, analisando a questão sob a ótica do paciente, este entende estar devidamente amparado pela legislação na busca de eventual indenização, sendo possível propor a demanda em face das pessoas jurídicas.

Há, ainda, além do fundamento legal, o fundamento econômico a justificar a propositura de ações judiciais em face das pessoas jurídicas prestadoras de serviço na área da saúde.

Economicamente, o paciente opta por demandar em face da pessoa jurídica para que tenha mais possibilidade de ver satisfeito o seu direito na hipótese de procedência da ação.

Evidentemente, havendo a condenação dos réus (que é a expectativa do paciente), via de regra, é mais fácil executar a pessoa jurídica do que a pessoa física.

Primeiro porque a dificilmente a pessoa jurídica “sumiria”, tornando difícil a sua localização, ainda que atualmente não seja necessária a citação pessoal para o início da execução. Eventual arrolamento de bens tornar-se-ia menos tormentoso para o paciente-credor.

Segundo porque a pessoa jurídica teria maiores condições de suportar a condenação do que a pessoa física. Isto é, a pessoa jurídica supostamente teria mais fôlego financeiro para pagar o valor da condenação do que a pessoa física.

Com efeito, vale a pena salientar que cabe direito de regresso da pessoa jurídica em face da pessoa física, caso comprovada a responsabilidade do profissional liberal.

Portanto, do ponto de vista econômico a demanda em face da pessoa jurídica possui maiores condições de efetivamente ser satisfeita do que em relação à pessoa física.

Desse modo, percebe-se que o paciente, através do fundamento legal, busca meios de facilitar a procedência da ação, uma vez que, no seu entender, não seria necessário provar a culpa do profissional que efetivamente prestou o serviço em nome da pessoa jurídica e, sob o aspecto econômico, havendo a procedência, a pessoa jurídica possui maior liquidez para pagar o valor da indenização.

Código de Defesa do Consumidor
“Art. 7. (omissis)
Parágrafo único. Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo.”

“Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.”

“Art. 25 (omissis)
§1º Havendo mais de um responsável pela causação do dano, todos responderão solidariamente pela reparação prevista nesta e nas Seções Anteriores.”

Código Civil
“Art. 932 são também responsáveis pela reparação do dano:
III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele.”

Supremo Tribunal Federal
“Súmula 341. É presumida a culpa do patrão ou do comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto.”