A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça acata recurso de hospital e julga improcedente o pedido de indenização por danos morais formulado por um paciente que teve parte de agulha cirúrgica deixada dentro do seu corpo durante cirurgia de abdômen. O paciente foi informado da situação, mas optou por não extrair o fragmento deixado em seu organismo.
De acordo com os autos, anos depois da cirurgia, o paciente passou a sentir desconforto físico e pediu indenização por danos morais contra o Hospital das Clínicas de Porto Alegre, alegando que os médicos esqueceram a agulha em seu corpo. O hospital se defendeu sustentando que não houve esquecimento e sim a decisão intencional de encerrar a cirurgia com rapidez para evitar o agravamento da situação e depois extrair o fragmento de metal sem risco de morte para o paciente.
Também argumentou que a agulha quebrou quando o corte já estava sendo fechado e seria temeroso manter o paciente anestesiado e com o corte da cirurgia aberto para procurar uma agulha que não poria em risco relevante sua integridade e que poderia ser facilmente extraída posteriormente em simples procedimento ambulatorial. O paciente foi informado da situação assim que deixou a unidade de terapia intensiva, alguns dias depois da cirurgia, mas optou por não realizar o procedimento naquele momento.
A questão chegou no STJ em um recurso apresentado pelo hospital, tentando reverter a condenação imposta pelo Judiciário gaúcho de indenizar o paciente. Por maioria, acompanhando o voto do relator, ministro Humberto Gomes Barros, a Turma reconheceu que o médico que esquece parte do material cirúrgico no organismo do paciente comete ato ilícito passível de indenização, mas entendeu desaparecer a ilicitude quando, antevendo o risco de morte do paciente em caso de prolongamento de cirurgia urgente, o médico encerra o procedimento mesmo sabendo que fragmento de agulha se perdeu acidentalmente no organismo do enfermo.
“No caso em questão, não houve esquecimento e sim a opção médica pelo encerramento da cirurgia antes de localizar a agulha cirúrgica que se perdeu”, ressaltou o relator, acrescentando não ter havido ilicitude no procedimento médico de encerrar a cirurgia para preservar as chances de vida do paciente.
Segundo o ministro, mesmo optando por não realizar a extração naquela ocasião, o paciente poderia ter realizado o procedimento em qualquer outro momento, desde que soube do fato, mas ainda assim não o fez. Para ele, tal atitude revela que não houve sofrimento a justificar indenização: “primeiro, porque foi do recorrido a opção de não extrair o fragmento deixado em seu organismo. Depois, porque não é crível que, diante do tamanho sofrimento narrado na inicial, o recorrido viesse a juízo postular danos morais, sem pedir, também, a reparação do suposto erro médico, ou seja, a retirada do fragmento”, destacou em seu voto.
Assim, a Turma entendeu que não sofre danos morais o paciente que, tão logo se recupera da cirurgia de urgência, é informado de que parte de material cirúrgico foi deixado em seu organismo e conscientemente decide não realizar simples intervenção para extrair o fragmento.
O ministro Humberto Gomes de Barros concluiu seu voto ressaltando que os danos morais não precisam de prova porque são presumidos, mas a presunção não é absoluta e cede quando a prova convence o juiz de que é improcedente o pedido de reparação.