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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico, Odontológico e da Saúde (FMRP-USP). Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado do curso de Bioética e Biodireito do HCor. Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Plano de saúde e liberdade

*Por Paul Krungman (NYT)

O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, vai divulgar em breve um novo orçamento e os comentários já estão fluindo rápidos e furiosos. Os progressistas estão irritados (e com razão) com os cortes propostos para a área da Previdência Social; os conservadores estão denunciando os pedidos por mais receitas. Mas isso é tudo teatro. Como os republicanos vão bloquear qualquer coisa que Obama propuser, é melhor ver o orçamento do presidente não como política, mas como posicionamento – ou uma tentativa de ganhar elogios de especialistas "de centro".

Não, a ação política real neste momento está ocorrendo nos Estados, onde a dúvida é: quantos norte-americanos terão seu direito à assistência médica essencial negado em nome da liberdade?

Estou me referindo, é claro, à questão de quantos governadores republicanos vão rejeitar a expansão do "Medicaid", que é uma parte fundamental do "Obamacare". O que isso tem a ver com liberdade? Na realidade, nada. Mas quando se trata de política, a história é diferente.

É desnecessário dizer que os republicanos se opõem a qualquer expansão dos programas destinados a ajudar os menos afortunados – juntamente com os cortes de impostos para os mais abastados. Essa oposição define o conservadorismo moderno. Mas eles parecem estar tendo mais problemas do que no passado para defender sua oposição sem simplesmente parecerem as pessoas mais mesquinhas da face da Terra.

Especificamente, a prática consagrada pelo tempo de atacar os beneficiários dos programas do governo como se eles fossem fingidores indignos não tem funcionado como antes. Quando Ronald Reagan falava sobre as rainhas dos benefícios sociais que dirigiam Cadillacs, o tema repercutia com muitos eleitores. Quando Mitt Romney foi pego em uma gravação zombando do contingente de 47% dos norte-americanos que utilizam ou utilizaram benefícios sociais, o tema não repercutiu tanto assim.

Existe, contudo, uma alternativa. A partir da recepção entusiasmada que os conservadores norte-americanos deram a "Road to Serfdom" ("Caminho da Servidão", em tradução livre), de Friedrich Hayek, a Reagan e aos governadores que atualmente tentam bloquear a expansão do Medicaid, a direita dos EUA tentou retratar sua posição não como uma questão de confortar os confortáveis enquanto aflige os aflitos, mas como uma corajosa defesa da liberdade.

Os conservadores adoram, por exemplo, citar um discurso inflamado que Reagan proferiu em 1961, no qual ele alertava para a possibilidade de um futuro sombrio para os EUA, a menos que os patriotas tomassem uma posição. (Liz Cheney usou esse mesmo discurso em um editorial publicado pelo Wall Street Journal apenas alguns dias atrás.) "Se você e eu não fizermos isso", Reagan declarou, "você e eu poderemos passar nossos últimos anos contando aos nossos filhos e aos filhos de nossos filhos como as coisas costumavam ser nos Estados Unidos quando os homens eram livres". O que você pode não imaginar a partir da linguagem empolada é que o "isso" a que Reagan se refere – o ato heroico ato que Reagan estava pedindo que seus ouvintes realizassem – era um esforço concentrado para impedir a promulgação do Medicare.

Atualmente, os conservadores têm argumentos muito semelhantes contra o Obamacare. Por exemplo: o senador Ron Johnson, de Wisconsin, declarou que o programa é o "maior ataque à liberdade visto em nossa época". E esse tipo de retórica é importante, pois quando se trata do principal obstáculo que resta hoje em dia para a adoção da assistência médica mais ou menos universal nos EUA – a relutância dos governadores republicanos em permitir a expansão do Medicaid, que é uma parte fundamental da reforma de Obama –, retórica é tudo o que a direita tem.

Como já dissemos acima, o velho truque de culpar os necessitados por suas parece não ter o mesmo impacto que costumava ter – e especialmente não em relação à assistência médica: hoje o Medicaid goza de um apoio notavelmente forte por parte do público talvez porque a experiência de perder o seguro saúde seja tão comum para muitos norte-americanos. E agora que a reforma do sistema de saúde é a lei da terra, a defesa econômica e fiscal para que os estados aceitem a expansão do Medicaid é esmagadora. É por isso que os interesses empresariais apoiam fortemente a expansão do seguro-saúde em quase todos os estados – até mesmo no Texas. Mas tais preocupações práticas poderão ser postas de lado se você for capaz de argumentar com sucesso que o seguro-saúde equivale à escravidão.

É claro que ele não equivale à escravidão. Na verdade, é difícil pensar em uma proposta que tenha sido mais completamente refutada pela história do que a noção de que a previdência social prejudica a sociedade livre. Quase 70 anos se passaram desde que Friedrich Hayek previu (ou pelo menos seus admiradores pensam que ele previu) que o estado de bem-estar social da Grã-Bretanha iria colocar o país em um terreno escorregadio rumo ao stalinismo; 45 anos se passaram desde que o Medicare entrou em vigor. E, até onde a maioria de nós é capaz de afirmar, a liberdade não morreu em ambos os lados do Atlântico.

Na verdade, a experiência real sentida pós-Obamacare provavelmente será a de uma liberdade individual significativamente maior. Pois, se levarmos em conta toda aquela conversa de que somos a terra da liberdade, os norte-americanos que ainda detêm alguns dos reduzidos postos de trabalho que oferecem planos de saúde decentes geralmente sentem que são tudo menos livres. Isso porque eles sabem que, se saírem ou perderem o emprego por qualquer motivo, podem não ser capazes de recuperar a cobertura médica de que necessitam. Com o passar do tempo, à medida que as pessoas percebem que a assistência médica acessível está garantida a partir de agora, isso terá um efeito libertador poderoso.

Mas o que nós ainda não sabemos é quantos norte-americanos terão negado o acesso a esse tipo de libertação – negação que é a mais cruel de todas, pois será imposta em nome da liberdade.

Fonte: UOL