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Advogado. Especialista em Direito Médico e Odontológico. Especialista em Direito da Medicina (Coimbra). Mestre em Odontologia Legal. Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico e Hospitalar - Escola Paulista de Direito (EPD). Coordenador da Pós-graduação em Direito Médico, Odontológico e da Saúde (FMRP-USP). Preceptor nos programas de Residência Jurídica em Direito Médico e Odontológico (Responsabilidade civil, Processo ético médico/odontológico e Perícia Cível) - ABRADIMED (Academia Brasileira de Direito Médico). Membro do Comitê de Bioética do HCor. Docente convidado da Especialização em Direito da Medicina do Centro de Direito Biomédico - Universidade de Coimbra. Ex-Presidente das Comissões de Direito Médico e de Direito Odontológico da OAB-Santana/SP. Docente convidado em cursos de Especialização em Odontologia Legal. Docente convidado no curso de Perícias e Assessorias Técnicas em Odontologia (FUNDECTO). Docente convidado do curso de Bioética e Biodireito do HCor. Docente convidado de cursos de Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde. Especialista em Seguro de Responsabilidade Civil Profissional. Diretor da ABRADIMED. Autor da obra: COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Defesa de médica de UTI de Curitiba quer tirar grampos de processo

A defesa da médica Virginia Helena Soares de Souza tentará convencer a Justiça a decretar ilegais a as escutas telefônicas feitas pela polícia na UTI (unidade de terapia intensiva) geral do Hospital Evangélico e a impugnar das análises dos prontuários de pacientes que levaram o MPE (Ministério Público Estadual) a denunciá-la por sete homicídios duplamente qualificados e formação de quadrilha.

Os dois pedidos fazem parte da argumentação elaborada pelo advogado criminalista Elias Mattar Assad para a defesa da médica, entregue nesta quinta-feira (11), ao juiz Daniel Surdi de Avelar, da 2.ª Vara do Tribunal do Júri de Curitiba.

"O STF [Supremo Tribunal Federal] entendeu, em decisão de dezembro passado, que escuta telefônica feita a partir de denúncia anônima é ilícita, mesmo com autorização judicial", disse o advogado, ao UOL, pela manhã.

Ele mesmo afirmou, porém, que a decisão do STF, tomada no julgamento de um caso isolado, não é vinculante –ou seja, a sentença não precisa ser seguida por cortes de instâncias inferiores.

A investigação contra Virginia, iniciada em março de 2012, surgiu da denúncia anônima de uma enfermeira à Ouvidoria-Geral do Estado. A denunciante já foi ouvida pela polícia e pelo MPE (Ministério Público Estadual). A identidade dela é mantida sob sigilo.

Quanto aos prontuários, em que se registram tudo o que se passou com os pacientes internados, como intervenções realizadas e medicamentos aplicados, Assad argumentou que não teve acesso aos documentos originais – apreendidos pela polícia, com base em decisão judicial, em 19 de fevereiro passado, dia em que Virginia foi presa e a investigação se tornou pública.

"Por conta disso, peço a impugnação dos prontuários, por ilicitude na apreensão. A prova toda ficou na mão deles [a acusação]. É como ficar com uma arma na mão antes de levar para a Criminalística para perícia. Nesse meio tempo, ela pode ser limpa ou entregue a alguém para registro de digitais. Não confio mais nessas provas, embora os prontuários originalmente não nos assustem", disse.

Erro em transcrição

O advogado usou um erro na transcrição de uma das escutas feitas nos telefones de Virginia, em que o verbo "raciocinar" foi registrado como "assassinar", para justificar sua suspeita de que podem ter ocorrido alterações nos prontuários.

"De quem pode alterar uma transcrição de gravação telefônica, não espero boa conduta na avaliação de prontuários a cujos originais não tive acesso. Tenho resposta de carta que enviei ao hospital, que registra que não foram deixadas por lá sequer cópias dos prontuários. Por qual não fizeram os levantamentos sigilosamente no alegado período de um ano das investigações?", questionou.

Um integrante da equipe que analisa os prontuários, que falou ao UOL sob a condição de ter a identidade ocultada, refutou a acusação. "Os documentos foram levados para uma sala no Ministério Público, onde permanecem. Antes, foram registrados eletronicamente, por um escrivão da polícia, que tem fé pública. Os argumentos do advogado não procedem", disse a fonte.

Além de desqualificar os elementos que formam a espinha dorsal das acusações contra Virginia, Assad pretende exigir que polícia e Ministério Público produzam "provas testemunhais, periciais, documentais e também exumação de todos os cadáveres mencionados nos óbitos, para que os legistas possam colher materiais para exames. Com isto queremos evidenciar tecnicamente a inexistência dos fatos criminosos assestados contra a nossa cliente", afirmou, em nota publicada em seu perfil numa rede social.

"Caso o MP pretenda discutir outras mortes neste processo já iniciado, terá que aditar a denúncia. Nesta hipótese, o processo terá que recomeçar reabrindo os prazos para novas defesas preliminares", disse, segundo a nota.

Além disso, o advogado anexou à defesa duas cartas que, alega, "narra os bastidores das investigações". A reportagem teve acesso a uma delas, que diz denunciar alegados interesses comerciais que teriam motivado as denúncias contra a médica, mas não cita provas nem nomes de envolvidos.

O caso

Virginia foi presa em 19 de fevereiro. Com a detenção dela, veio a público a investigação policial de quase um ano sobre possíveis homicídios na UTI do Evangélico.

"Investigamos a antecipação de mortes dentro da UTI geral. Não falamos em eutanásia. Para nós, trata-se de homicídios", afirmou, no dia seguinte, a delegada Paula Brisola. Segundo ela, Virginia, que dirigia a UTI geral desde 2006, seria indiciada por homicídio qualificado.

Em 11 de março, ao oferecer denúncia contra quatro médicos, três enfermeiros e um fisioterapeuta, o MPE disse que eles "prescreviam medicamentos bloqueadores neuromusculares normalmente empregados em medicina intensiva para otimização de ventilação artificial, conjugados com fármacos anestésicos, sedativos e analgésicos, procedendo-se [a seguir] ao rebaixamento nos parâmetros respiratórios dos pacientes-vítimas então dependentes de ventilação mecânica, fazendo-os morrer por asfixia".

São denunciados Virginia, diretora da UTI geral do Evangélico entre 2006 e janeiro de 2013 (por sete homicídios), os médicos Anderson de Freitas (dois homicídios), Edison Anselmo da Silva Junior e Maria Israela Cortez Boccato e as enfermeiras Laís da Rosa Groff e Patrícia Cristina de Gouveia Ribeiro (um homicídio cada).

Todos eles, além do enfermeiro Claudinei Machado Nunes e da fisioterapeuta Carmencita Emília Minozzo, também deverão responder por formação de quadrilha. No dia 15, a Justiça acatou a denúncia, transformando os denunciados em réus, mas determinou a soltura de todos os suspeitos presos, à exceção de Virginia.

Ela teve a liberdade decretada apenas no dia 20, a pedido da defesa, após passar 30 dias detida. No dia 25, o MPE recorreu, mas o juiz Daniel Surdi de Avelar, da 2.ª Vara do Tribunal do Júri de Curitiba, manteve a médica em liberdade. Agora, aguarda-se pronunciamento do TJ (Tribunal de Justiça do Paraná) a respeito.

Ao anunciar a denúncia contra o grupo, o MPE informou que pediu à polícia para investigar mais 21 mortes de pacientes do Evangélico. Segundo o MPE, os procedimentos adotados pela equipe médica "levantam muita suspeita" de que houve "antecipação de óbitos".

"Em todos, há registro da aplicação de Pavulon [um medicamento que age como bloqueador neuromuscular], sem justificativa médica, seguido de morte. Mediante um pedido de autorização penal de retirada da ação, esses prontuários darão origem a um novo inquérito", informou o promotor Marco Antonio Teixeira, coordenador do Centro Operacional das Promotorias de Justiça da Saúde Pública do MPE.

Fonte: UOL